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ENTREVISTA // Taísa Machado: O AfroFunk Rio e a reinvenção da ideia de cultura periférica

Débora Britto / 10/07/2018

Uma oficina de dança com potencial para debater o local da mulher na sociedade, sua relações com o corpo, a sensualidade e a cultura nasce da população negra na periferia do Rio de Janeiro e começa a se espalhar pelo Brasil. O AfroFunk Rio, criado peladançarina, atriz e pesquisadora Taísa Machado, avançou também para uma investigação de danças que têm o rebolado como base e as mulheres comoprotagonistas. O AfroFunk Rio se define como “um mergulho no universo das danças contemporâneas produzidas pelas periferias cariocas e suas essências ancestrais”, mas vai além.

A “ciência do rebolado”, ideia que surge das oficinas, constrói propostas concretas para lidar com temas como a libertação dos corpos femininos, o enfrentamento ao racismo e a circulação por territórios periféricos. Além disso, a oficina enxerga a dança como possibilidade de reinventar a percepção que se tem sobre a produção cultural das periferias, especialmente as favelas cariocas, local onde nasce o funk.

Em 2014, quando começou o Afrofunk Rio, Taísa mergulhou nouniverso deritmos brasileiros, afrolatinos e diaspóricos (de populações africanas que foram deslocadas de seus territórios de origem devido à escravidão). A partir dos estudos e depois da primeira experiência de aula, em que a turma lotou de mulheres inscritas, adançarina começou a observar e buscar referências do papel das mulheres em diferentes danças. Taísa pesquisou desde asculturasem que as mulheres são consideradas sagradas até o funk carioca, que, nas palavras dela, “não tem nada de sagrado”.

Desde então, o viés educativo se conectou com o prazer de estar entremulheres, homens e crianças para pensar a dançar como instrumento de libertação, de empoderamentopara transitar em espaços não seguros equestionar a ideia que se tem do funk como uma cultura menor.

As duas modalidades de oficinasdesenvolvidaspeloprojeto – “Ancestralidade do Tamborzão” e a “UniverCidade da Ousadia” – abordam diferentes aspectos da história das danças que Taísa traz para as aulas e conecta com os movimentoscompartilhados pelo funk. Pensar o espaço urbano como produtor dessa cultura periférica é o objetivo. As oficinas abordam, ainda, elementos da ancestralidade africana que, ao longo do tempo, por meio das resistências da população afrobrasileira, foram se adaptando, tomando novas formas.

Para além dos movimentos técnicos da dança, do rebolado, as oficinas são permeadas por rodas de conversa sobreoContinente Africano, a história do Brasil e dos Orixás. Todos esses temasdialogam com ofunk carioca, o balé, kuduro, o samba e outras referências de danças africanas. É assim que discussõessobre igualdade de gênero, racismo e machismo são trabalhadas nas oficinas.

Para Taísa, a possibilidade de utilizar as aulas da dança parainiciar processos de libertação de padrões sobre os corpos das mulheresé também fundamental. A retomada do próprio corpo e o exercício da sensualidade como fator de empoderamento das mulheres é algo que ela destaca. Além disso, as aulas, quase sempre, acabam em diversão, conta Taísa. “A ideia é explorar as diversas possibilidades da expressão corporal, da herança ancestral, da musculação do órgão de expansão e fertilidade, a manutenção de afeto entre as mulheres e o poder do ventre”, explica.

O AfronFunk Rio esteve no Recife e realizou um ciclo de oficinas gratuitas em comunidades periféricas e também aulas remuneradas para quem desejasse aprender sobre o tema.A reportagem da Marco Zero Conteúdoconversou com a idealizadora do AfroFunk Rio, Taísa Machado, sobre esses temas e outros, na videoreportagem abaixo:

Agradecimento pelas imagens do vídeo ao Grupo Revelar.Si – Coletivo de Fotógrafas do Coque

AUTOR
Foto Débora Britto
Débora Britto

Mulher negra e jornalista antirracista. Formada pela Universidade Federal de Pernambuco (UFPE), também tem formação em Direitos Humanos pelo Instituto de Direitos Humanos da Catalunha. Trabalhou no Centro de Cultura Luiz Freire - ONG de defesa dos direitos humanos - e é integrante do Terral Coletivo de Comunicação Popular, grupo que atua na formação de comunicadoras/es populares e na defesa do Direito à Comunicação.