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Europa impõe castigo a refugiados

Marco Zero Conteúdo / 06/09/2015

Fotos e texto por Márcio-André de Sousa Haz (Budapeste)

Não é sempre que vemos a história acontecendo na porta de nossa casa. Tenho passado meus últimos dias aqui na estação de Keleti, com minha câmera de filmar, acompanhando o estado de purgação em que os refugiados vindos da Síria e Afeganistão em direção a Alemanha foram submetidos pela desUnião Europeia. Há gente que já está aqui há mais de quinze dias e, a cada dia, chegam pelo menos 400 refugiados. Nenhuma informação é dada a eles sobre as partidas dos trens, quando já se sabe que nenhum trem está cruzando a fronteira em direção à Europa.

Aos poucos, foram se juntando em grupo. Hoje beiram os cinco mil acampados só diante dessa estação entre os quais muitíssimas crianças –, que dispõem de apenas um banheiro e uma torneira de água potável. A desolação, tristeza e apatia são gerais. O marasmo dos pequenos correndo sob o sol forte só é quebrado pelas manifestações regulares, nas quais os refugiados vão para os portões da estação apelar por uma quase inalcançável ajuda por parte da Alemanha (que já disse aceitar os sírios, ainda que estes misteriosamente não consigam pegar os trens referentes aos tíquetes que compraram, uma vez que Áustria não deixa entrar ninguém.

[Best_Wordpress_Gallery id=”1″ gal_title=”Refugiados da Siria”]

Para piorar a situação, ontem apareceu por aqui, um grupo neonazi cantando a glória húngara (que foi prontamente combatida por uma húngara com a cabeça no lugar). Por outro lado, há centenas de voluntários. Húngaros e não-húngaros que estão aqui ajudando, trazendo comida, água, cobertores, fazendo atividades com as crianças e concertos de música para os adultos. Ontem, trouxeram até um projetor e exibiram desenhos animados. O mundo todo está com os olhos na estação de Keleti e há jornalistas do mundo inteiro, até da Argentina e Austrália. Procurei alguma equipe de TV brasileira, mas não vi nenhum.

Acrescento por fim, um relato pessoal para explicar como descobri que os trens internacionais não estavam saindo nem entrando. Por pura coincidência, eu estava esperando hoje a chegada do meu amigo e ex-orientador Manuel Antônio de Castro, professor emérito da UFRJ, que se hospedaria em minha casa. Ele chegaria de Áustria às 12h49 justamente por Keleti. Como eu já estava ali na estação desde as oito da manhã, tudo seria supostamente fácil. Acontece que na hora da chegada, apareceu no painel que o trem havia sido cancelado. Fui ao guichê de informações e perguntei como um trem que está chegando pode ser cancelado. Para onde ele havia ido?

Eles não quiseram me dar a informação. Só depois de muita insistência, dizendo que o Manuel era convidado de um congresso importante da Universidade, eles me confessaram que todos os passageiros vindos de fora do país estavam, na fronteira, sendo alocados em trens regionais e chegariam pela estação de Deli. O Manuel, afinal, acabou não vindo. Voltou para Viena ainda na fronteira por não saber pelo que poderia passar. Essa tem sido a postura dos governos democráticos do mundo dito civilizado: foder a vida de meia dúzia para garantir que uma grande quantidade de gente continue fodida.

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