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Estudo confirma ociosidade de imóveis no bairro de Santo Antônio

Luiz Carlos Pinto / 06/04/2018

Foto: Inês Campelo/Marco Zero

Um estudo inédito revela que há 42 imóveis desocupados ou menos da metade ocupados no bairro de Santo Antônio. O espaço disponível é correspondente a 2.106 unidades habitacionais. Para isso, seria necessário um investimento estimado de R$ 252.781.694,85. A área ociosa significa pouco mais de 14% do total de área construída em todo o bairro – incluindo igrejas, conventos, palácios e sobrado.

O levantamento foi feito pela Organização não-governamental Habitat para a Humanidade Brasil, em parceria com a ONG FASE, o coletivo A Cidade Somos Nós, o MTST Brasil e o Coletivo Arquitetura, Urbanismo e Sociedade (CAUS). O objetivo do trabalho foi identificar imóveis ociosos e vazios no centro do Recife.

O trabalho será divulgado hoje pela manhã, na sede da Habitat, e em seguida haverá um debate com a participação de Betina Guedes, Promotora de Habitação e Urbanismo; Antônio Alexandre, Secretário de Planejamento Urbano da Prefeitura de Recife, e o vereador Ivan Moraes, Vice-Presidente da Comissão de Direitos Humanos da Câmara Municipal do Recife.

“Nosso objetivo com esse levantamento é provocar o debate para promoção de habitação de interesse social em áreas centrais da cidade. Estamos em um momento essencial para essa discussão uma vez que o Plano Diretor da cidade está em processo de revisão e é justamente nele que estes mecanismos devem estar contemplados”, explica Mohema Rolim, Gerente de Programas da Habitat para a Humanidade Brasil e responsável pela coordenação do estudo.

Estudo

Desde 2016 o coletivo A Cidade Somos Nós vem realizando o que chamamos de Rolês da Função Social, um evento para observar e mapear de forma colaborativa a ociosidade de imóveis dos bairros do Centro do Recife”, afirma Leonardo Cisneiros, professor da UFRPE e integrante do coletivo A Cidade Somos Nós. “O objetivo, além de fazer esse levantamento, era o de realizar um debate ao vivo sobre soluções e sensibilizar as pessoas para o potencial de transformação da cidade que poderia vir de um aproveitamento desses imóveis para a moradia popular”, explica

Para o levantamento que será apresentado hoje, apenas edificações com 5 pavimentos ou mais foram analisadas. Essa estratégia foi usada para filtrar as edificações com maior potencial de reabilitação para habitação. Dos 1.002 lotes do bairro de Santo Antônio, cadastrados na base do Sistema de Informações Geográficas (ESIG), 155 possuem edificações com 5 ou mais pavimentos.

Esta base inicial de 155 lotes foi atualizada após as idas a campo, essenciais para confirmar a informação e identificar distorções. A partir da análise de campo, um lote foi acrescido e outros 44 excluídos. Os edifícios foram excluídos pela diferença entre as informações contidas no cadastro da prefeitura e a observação em campo. Em alguns casos, o número de pavimentos do cadastro não correspondia com a realidade, ou eram imóveis históricos/institucionais em que não seria possível a produção de habitação, como no Teatro de Santa Isabel ou no Palácio da Justiça. Isso totalizou um número final de 112 lotes analisados.

Resultado

Dos 112 lotes, 42 estão totalmente desocupados ou com menos da metade de sua área ocupada. Isso quer dizer que 37,5% dos imóveis analisados estão ociosos. Dos 30 imóveis identificados como menos da metade da área ocupada, 26 concentravam a maioria da ocupação no térreo e/ou na sobreloja.

“É um número muito alto e pode ser ainda maior. A maior parte tem uma boa conservação”, afirma Mohema Rolim. Os imóveis foram classificados como Bom (74) e Regular (33), com apenas 4 apresentando conservação Ruim e 1 sem opção assinalada.

O nível de ociosidade no bairro pode ser ainda maior. Dos 243 domicílios particulares permanentes recenseados pelo IBGE em 2010, 100 aparecem como não ocupados, totalizando 41,15% do total de domicílios do bairro. O número apresenta um crescimento considerável em relação aos 7,49% no censo anterior (2000), onde 20 dos 267 domicílios particulares permanentes recenseados estavam vagos.

Os dados do estudo confirmam informações da reportagem Dívidas de R$ 346 milhões de IPTU expõem abandono e cobiça no Centro do Recife, que publicamos recentemente. Em particular, a mancha da inadimplência em IPTU no bairro de Santo Antônio é mais densa, revelando por sua vez a relação entre abandono de imóveis, falta de politicas habitacionais e déficit habitacional.

Para a professora de arquitetura e urbanismo da Unicap, Clarissa Duarte, as políticas públicas precisam destinar recursos tanto  para o fomento do uso habitacional quanto para a reabilitação das ruas de acesso às habitações. “Esse é um caminho para intensificar a densidade habitacional, que hoje no centro é insustentável”, afirma. “O ideal se aproxima de uma densidade entre 300 a 350 habitantes por hectare  e temos na área trechos com menos de 20 habitantes por hectare ”, completa Clarissa.

“Nenhum lugar do mundo se sustenta sem ser habitada, nem economicamente, nem culturalmente, muito menos do ponto de vista da segurança e da cidadania”, afirma a professora. “Serviços complementares à habitação, como creches, supermercados, farmácias e mercadinhos precisam ser simultaneamente oferecidos. Habitar é muito mais do que ter uma habitação”, afirma.

Espera-se com ansiedade saber como o poder público em geral e a administração municipal atual podem sinalizar melhoras nesse sentido. O debate que ocorre na sede da Habitat, depois da apresentação do estudo, uma boa oportunidade para o representante da gestão atual indicar possíveis ações que beneficiem o bem público. A ver.

Veja o mapa com os 142 imóveis apontados no estudo. Clique sobre os pontos para informações detalhadas sobre as edificações

Veja o mapa de calor com os resultados do mapa acima

Raio X da ociosidade dos espaços no Recife

62 mil unidades é o déficit habitacional do Recife

Universo da pesquisa: Bairro de Santo Antônio/1.002 lotes/

Edificações com 5 pavimentos ou mais: 112 lotes

Resultados:
42 completamente desocupados
30 com menos da metade da área ocupado

(37,5% dos imóveis analisados estão ociosos)

16 com mais da metade da área ocupada
52 com a maioria ou totalmente ocupado
2 imóveis que não tiveram situação de ocupação assinalada
105.325,71 m² de área construída desocupada
14,37% do total de área construída em todo o bairro
2.106 unidades habitacionais

Para isso, seria necessário um investimento estimado de R$252.781.694,85

AUTOR
Foto Luiz Carlos Pinto
Luiz Carlos Pinto

Luiz Carlos Pinto é jornalista formado em 1999, é também doutor em Sociologia pela UFPE e professor da Universidade Católica de Pernambuco. Pesquisa formas abertas de aprendizado com tecnologias e se interessa por sociologia da técnica. Como tal, procura transpor para o jornalismo tais interesses, em especial para tratar de questões relacionadas a disputas urbanas, desigualdade e exclusão social.