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Helena Dias e Laércio Portela
Os cortes de recursos para a Universidade Federal de Pernambuco, que podem paralisar as atividades da instituição no segundo semestre, e as reiteradas ameaças à autonomia universitária feitas pelo ministro da Educação, Abraham Weintraub, uniram as cinco chapas que concorrem às vagas de reitor e vice-reitor da UFPE. Todas confirmaram presença e convocaram seus eleitores e simpatizantes ao ato desta quarta-feira (15) à tarde, na Rua da Aurora, em defesa da educação pública.
A convocação foi feita no auditório lotado do Centro de Tecnologia e Geociências do campus Recife, onde os candidatos e candidatas se enfrentaram em debate de quase três horas promovido pela Associação dos Docentes da UFPE (Adufepe), na tarde desta terça (14). Com capacidade para 270 pessoas, o espaço ficou pequeno para as claques dos candidatos, vestidas com camisas com as cores e os números oficiais de cada chapa.
“O ato da quarta não é um ato de campanha, mas de união de todos contra os cortes e pela universidade pública”, defendeu Jeronymo Libonati, diretor do Centro de Ciências Sociais Aplicadas (CCSA) e que tem o apoio do atual reitor Anísio Brasileiro, segundo várias fontes ouvidas pela Marco Zero Conteúdo. “A pauta é única em defesa da universidade pública, temos que unificar a defesa do patrimônio estratégico da sociedade brasileira, uma universidade viva, criativa e comprometida com a mudança social”, afirmou Alfredo Gomes, diretor do Centro de Educação.
Horas após a publicação desse texto, a assessoria da chapa encabeçada por Libonati encaminhou nota sobre a informação de que o reitor Anísio Brasileiro apoia a chapa do atual diretor do CCSA. Leia a íntegra:
“A chapa 59, “UFPE: Gestão Integrada com Inovação”, é independente e autônoma. Foi criada a partir de um grupo de docentes, técnico-administrativos e estudantes que oferecem uma opção de gestão baseada nos eixos de infraestrutura, integração, internacionalização e pessoal. Ambos os candidatos são diretores de seus respectivos Centros – Libonati no CCSA e José Luiz no Lika – há várias gestões e reafirmam suas candidaturas têm compromisso, apenas, com uma UFPE inclusiva e de excelência em todas as suas atividades”.
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[accordion title=”Acolher e Inovar” load=”hide”]
Candidata a reitora: Florisbela de Arruda Câmara e Siqueira Campos é atualmente vice-reitora da universidade. Tem graduação em Nutrição pela UFPE (1978). Mestrado (1983) e doutorado (1999) em Nutrição, ambos pela UFPE. Foi diretora do Centro Acadêmico de Vitória (CAV) da UFPE, de 2006 a 2015.
Candidato a vice-reitor: André Luís de Medeiros Santos é formado em Ciência da Computação pela UFPE (1989), possui mestrado em Ciência da Computação pela universidade (1991) e doutorado em Computing Science pela University of Glasgow (1995), na Escócia. É diretor do Centro de Informática (CIn).
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[accordion title=”Gestão Integrada com Inovação” load=”hide”]
Candidato a reitor: Jeronymo José Libonati é graduado em Ciências Econômicas (1986) e em Ciências Contábeis (1991), ambos pela Faculdade de Ciências Humanas Esuda. Possui mestrado (1996) e doutorado (2002), ambos em Controladoria e Contabilidade, pela USP. Tem pós-doutorado (2018) pela Business School of University of East Anglia em Norwich, no Reino Unido. É diretor do Centro de Ciências Sociais Aplicadas (CCSA).
Candidato à vice-reitor: José Luiz de Lima Filho é formado em Medicina pela UFPE (1983), tem doutorado em Bioquímica e Microbiologia, pela University of St Andrews (1987), na Escócia. Tem pós-doutorado na Alemanha (GBF), no Japão (Instituto de Tecnologia de Tóquio) e nos Estados Unidos (NIST). É professor do Departamento de Bioquímica e Biofísica e diretor do Laboratório de Imunopatologia Keizo Asami (Lika) da UFPE.
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[accordion title=”Movimenta UFPE” load=”hide”]
Candidato a reitor: Daniel Álvares Rodrigues é graduado em Direito pela Unicap (1988), possui mestrado em Educação pela UFPE (1996) e doutorado em Educação pela Universidade Federal de São Carlos (2007). Foi diretor do Centro de Educação da UFPE, no período de 2012 a 2016, e coordena o grupo de pesquisa GepMarx (antigo Gema).
Candidata a vice-reitora: Roberta Ramos Marques possui graduação em Letras pela UFPE (1996), mestrado (2000) e doutorado (2008) em Teoria da Literatura pelo Programa de Pós-Graduação em Letras da UFPE. A docente participa da coordenação e das pesquisas do Acervo Recordança, desde 2003.
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[accordion title=”Mude UFPE” load=”hide”]
Candidato a reitor: Alfredo Macedo Gomes é graduado em Psicologia (1990) e mestre em Sociologia pela UFPE (1995). Possui doutorado em Educação (PhD) pela University of Bristol (2000), no Reino Unido, e realizou estágio pós-doutoral junto ao Centre for Globalization, Societies and Education, também pela University of Bristol (2010-2011). É diretor do Centro de Educação (CE).
Candidato a vice-reitor: Moacyr Cunha de Araújo Filho é formado em Engenharia Civil pela UFPE (1985), tem mestrado em Hidráulica e Saneamento pela USP (1991) e doutorado (1996) em Physique et Chimie de l´Environnement pelo Institut National Polytechnique de Toulouse, na França. É professor do Departamento de Oceanografia.
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[accordion title=”Somos Tod@s UFPE” load=”hide”]
Candidato a reitor: Edilson Fernandes de Souza é graduado em Educação Física pela Universidade Castelo Branco (1991), possui mestrado em Educação Física e Cultura pela Universidade Gama Filho (1995), doutorado em Educação Física pela Universidade Estadual de Campinas (1998) e pós-doutorado em Sociologia pela Universidade do Porto, em Portugal. Foi pró-reitor de Extensão.
Candidato a vice-reitor: Sandro Cozza Sayão é formado em Ciências pela Universidade Federal do Rio Grande (Furg) (1996), tem mestrado em Educação Ambiental pela FURG (1999) e em Filosofia pela Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul (PUC-RS) (2001), doutorado em Filosofia pela PUC-RS (2006) e pós-doutorado pela Université Paris X, na França.
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A união dos candidatos à reitoria contra os cortes anunciados pelo governo federal foi também o mote da primeira intervenção de Edilson de Souza, ex-pró-reitor de Extensão. “Todos nós candidatos saímos em defesa da universidade pública. Independentemente do resultado da eleição, todos continuaremos sendo UFPE”. Para Daniel Álvares, ex-diretor do Centro de Educação, os cortes não são ocasionais, mas indicam um projeto político mais profundo. “Estamos diante de um ataque para acabar com a universidade pública brasileira. Não é simplesmente um corte, um bloqueio, é uma mudança de rumo”.
Mais discreta nas intervenções contra o governo federal, Florisbela de Arruda Câmara, atual vice-reitora, em sua fala final fez o chamamento para que as pessoas presentes no debate participassem do ato do dia 15. “Vamos chamar a atenção do governo para o que está acontecendo dentro das universidades. Não há a menor possibilidade de manter o bloqueio. Se assim for, todas as 63 universidades do sistema público e os institutos federais vão parar”, alertou.
Só em Pernambuco foram cortados R$ 117,94 milhões, incluindo universidades e institutos federais. A maior parte dos recursos vinculados à UFPE, R$ 55,8 milhões. As verbas seriam destinadas para despesas de manutenção e capital para investimentos. Por exemplo, gastos com contas de energia, de água, bolsas para monitoria, salários de terceirizados (segurança e limpeza) e reposição de computadores quebrados, entre muitas outras despesas. A UFPE já recebeu 40% dos R$ 172 milhões previstos para o ano. É nos 60% restantes que o MEC quer mexer.
Saiba mais: Federais em Pernambuco têm cortes de R$ 117,94 milhões e podem paralisar no segundo semestre
Apesar do clima de união contra os cortes do governo federal na educação, quando começaram as rodadas de perguntas de candidato para candidato ficou evidente as discordâncias sobre a captação de recursos junto ao setor privado. Neste ponto, as chapas encabeçadas por Libonati, Alfredo e Florisbela defenderam as parcerias público-privadas entre universidade e empresas, enquanto as chapas de Daniel e Edilson fizeram críticas a esta forma de financiamento por considerar que ela pode comprometer a autonomia e a independência na produção de conhecimento.
Daniel compõe uma chapa coletiva para a reitoria da UFPE, a única que tem a participação de estudantes e técnicos. Além dele, participam a professora Roberta Ramos; os estudantes Adriel Rodrigues, Fernando de Lima, Luciana Cavalcanti e Millena Alexandre; e os técnicos Helder Caran dos Santos e Ymira da Silva. “A gente ouve todo dia que estudante não tem direito de estar no local de poder político. Mas somos a maioria. Por isso nos estruturamos de uma forma coletiva, diferente de tudo que vem sendo estruturado nessa universidade”, explica Milena.
Para a chapa coletiva, buscar recursos privados para reduzir o impacto dos cortes de recursos públicos é um erro grave. “Não dá para pensar que vamos captar recursos na iniciativa privada porque perderemos a independência científica. A universidade é pública, a pesquisa precisa ser pública”, defendeu Daniel. “Me preocupa o processo de empresarização da universidade. Assim, ficamos voltados a servir ao capital. Quem vai financiar a licenciatura em filosofia?”, questionou Sandro Cozza Sayão, candidato a vice-reitor na chapa de Edilson de Souza. Sandro é professor de filosofia. Para tornar transparente o gasto de recursos na UFPE, Edilson propõe a criação do Gastômetro.
Qual o significado da sua candidatura para a reitoria da UFPE diante do contexto político atual do Brasil?
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[accordion title=”Moacyr Cunha de Araújo Filho” load=”hide”]
“Significa que primeiro temos que fazer algumas mudanças no rumo da UFPE para ajustar a universidade às novas realidades. Do ponto de vista da gestão, do ponto de vista da fala para a sociedade e do protagonismo. Significa também que o nosso movimento que se chama MUDE, que são as iniciais do “Movimento de União, Democracia e Excelência”, é para nos unirmos contra este ataque às universidades públicas brasileiras. Falo de estudantes, docentes e técnicos administrativos. A gente precisa primar pela democracia, isso é fundamental. Precisamos mostrar a universidade para a sociedade e precisamos continuar a nossa busca pela excelência porque é a missão de toda instituição pública.”
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[accordion title=”Roberta Ramos Marques” load=”hide”]“Nossa chapa é uma chapa coletiva. Formada por oito pessoas entre quatro estudantes, um técnico e uma técnica, um docente e uma docente. Essa chapa significa uma experiência nova dentro da universidade, que indica uma crítica radical ao modelo que nós temos. Um modelo representativo concentrado na figura de um sujeito. E por que que a gente entende que essa é a resposta mais forte que a gente pode dar? A gente entende que esse modelo vem falindo e não traz os desejos e interesses das coletividades. Na nossa composição e no nosso método de construção de candidatura estão escritas as experiências que vêm desses diversos sujeitos formados por categorias diferentes.”
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[accordion title=”Edilson Fernandes de Souza” load=”hide”]“Tem dois significados importantes. Primeiro, é que a nossa candidatura se coloca no debate nacional, sobretudo nesse enfrentamento do governo federal. Nós não podemos aceitar de forma alguma os cortes de verbas para a universidade, na perspectiva de uma retaliação à sociologia e à filosofia. Nosso candidato a vice-reitor, o professor Santos Sayão, é do departamento de Filosofia. Nós nos colocamos nesse debate de uma forma intransigente porque é importante colocar a autonomia universitária do ponto de vista histórico. Depois, internamente, somos todos UFPE porque reconhecemos que há uma dificuldade (de integração) entre os campus de Caruaru, Vitória de Santo Antão e Recife. Muitos dos integrantes da comunidade universitária não se sentem partícipes da UFPE”
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[accordion title=”Florisbela de Arruda Câmara” load=”hide”]“A minha chapa vem sendo trabalhada com os diretores, foi assim que eu entrei como vice-reitora do professor Anísio Brasileiro. Agora, queremos continuar avançando porque a universidade avançou bastante. Queremos os fluxos de processos, desburocratizar a universidade, porque a UFPE está financeiramente equilibrada. Não é terra arrasada, nós temos coisas boas. Mas, com estes bloqueios agora, não tem quem se sustente. Precisamos estar todos juntos e isso é um discurso de todas as chapas. O importante da nossa chapa é que queremos avançar com tecnologias de informação de ponta para facilitar o trabalho do docente e sair da burocracia.”
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[accordion title=”Jeronymo José Libonati” load=”hide”]“Nossa candidatura traz uma discussão rica, um debate propositivo de ideias. Cada um tem a sua diferença e sua particularidade, uns têm uma visão de mundo e outros têm outra. O que é comum entre nós é que estamos pensando na defesa da universidade. A nossa candidatura traz a experiência como gestor público há mais de 15 anos e a do professor José Luiz que é meu vice. De uma defesa forte da universidade pública. Esta é a diferença que a gente expõe. Toda a nossa experiência na gestão administrativa e na pesquisa acadêmica. Nossa proposta está baseada nisso. Vamos enfrentar esses momentos difíceis que o Brasil está vivendo, em particular a UFPE.”
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Com discurso mais voltados para a ideia de gestão eficiente e competência, Florisbela defende a desburocratização da universidade. “Precisamos fazer uma gestão centrada na competência. Tivemos 600 cortes de cargos no ano passado. Precisamos instituir editais de remoção para que as pessoas possam trabalhar nas áreas para as quais realmente estejam habilitadas. Temos que ter o pé no chão. Não dá para prometer obras. Dinheiro está reduzido. Temos que buscar parcerias público-privadas. Reduzir e eliminar a burocracia que atrapalha estudantes, professores e técnicos”.
Alfredo lembrou aos presentes que o auditório Newton Maia, do CTG, onde se realizava o debate tinha sido construído com recursos de uma parceria da UFPE com a Petrobras, totalizando R$ 80 milhões. “A parceria teve impacto fenomenal na pesquisa de petróleo aqui no estado, não podemos ver a questão de forma sectária. Mas não nos interessa a privatização e, sim, estarmos associados ao mercado de trabalho e a instituições que têm investimentos em pesquisa científica”, argumentou.
Todos os candidatos e candidatas defenderam o diálogo com as bancadas no Congresso Nacional para pressionar o governo federal a garantir a reposição dos recursos cortados, entendendo como bem-vindas as emendas parlamentares para a universidade, enquanto recursos complementares.
A aprovação da construção do campus de Goiana foi debatida por Alfredo e Daniel, que tiveram posições antagônicas quando o tema foi discutido no Conselho Universitário em março de 2018. Alfredo votou a favor do campus e Daniel, contra. Pela proposta aprovada serão oferecidas, no primeiro ciclo, o Bacharelado Interdisciplinar em Ciência e Tecnologia (BICT) e a Licenciatura Interdisciplinar em Ciências Naturais e Exatas. No segundo ciclo, haverá quatro cursos: Engenharia Urbana e Ambiental, Engenharia da Computação, Engenharia Elétrica e Eletrônica e Ciências Farmacêuticas.
Daniel justificou o voto contrário por discordar da priorização da relação da universidade com as empresas privadas. “O campus prioriza um dado da universidade e não o seu conjunto. Nós queremos uma universidade completa. Nesse sentido é que vamos construir uma universidade efetivamente pública”. Foi rebatido por Alfredo que disse que o campus vai abrir possibilitar o acesso de estudantes de escolas públicas a 50% das suas vagas. “Não fomos contra a entrada de estudantes em Goiana, mas de se construir uma universidade só para o mercado ou candidatos a senadores”, argumentou Daniel.
Um dos momentos mais tensos aconteceu quando Milena, da chapa coletiva, questionou a vice-reitora Florisbela sobre o processo que classificou de “criminalização” dos estudantes que participaram das ocupações da UFPE em 2016 contra a PEC 55, que impôs um teto de gastos à União, afetando recursos para a educação e a saúde. Florisbela negou a criminalização, defendeu as ocupações, e disse que foram punidos com seis meses de suspensão apenas os alunos que estavam nos centros onde houve, segundo ela, “depredação de patrimônio público”. A chapa coletiva defende a revisão do processo por considerar que a rcomeitoria “escolheu” lideranças estudantis para punir e não aqueles de fato implicados nos atos.
A eleição para reitor acontece no próximo dia 29. Trata-se, na verdade, de uma consulta à comunidade acadêmica. Por acordo firmado entre as chapas, os votos serão contabilizados de forma paritária entre os três segmentos, com o mesmo peso eleitoral. Apesar de nota técnica emitida pelo Ministério da Educação nos últimos dias do governo Michel Temer informando que não serão validadas consultas em que os votos dos professores tenham peso inferior a 70%.
Os dois primeiros colocados (se não alcançarem 50% mais 1 dos votos) disputarão um segundo turno. O nome da chapa vencedora será encaminhado ao Conselho Universitário, que é quem de fato define a lista tríplice que será encaminhada para a escolha do futuro reitor ou reitora pelo Ministério da Educação. Pela tradição, os demais nomes da lista tríplice são definidos dentro do mesmo campo político da chapa vencedora para garantir que o projeto mais votado nas urnas seja de fato contemplado na escolha final do MEC. Assim, a segunda e a terceira chapas mais votadas na consulta não devem entrar na lista.
O Conselho Universitário atualmente é formado por cinco professores de cada um dos 14 centros acadêmicos, mais oito pró-reitores, o reitor e o vice e mais um estudante e um técnico. Os estudantes estão sem representante porque não há eleição para o DCE há alguns anos e os técnicos não elegeram um nome para integrar o órgão interno.
O debate desta terça-feira (14) no Centro de Tecnologia e Geociências do campus Recife foi o segundo entre as cinco chapas concorrentes à Reitoria. O primeiro aconteceu no dia 7 no Centro Acadêmico do Agreste, em Caruaru. O último está previsto para o dia 22 no Centro Acadêmico de Vitória.
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