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Porque vale a pena sair de casa no domingo para votar na eleição do Conselho Tutelar

Marco Zero Conteúdo / 29/09/2023
Quatro meninas negras, vestidas com roupas simples, sorriem para a câmera mostrando dedos sujos de tinta, sentadas ao pé de uma estreita escada de madeira.

Crédito: UNICEF/UN0596447/FAHDL

por Jeniffer Oliveira

As eleições para conselheiros e conselheiras tutelares acontecerão neste domingo, 1º de outubro, das 8h às 17h, e todos os eleitores em dia com a Justiça Eleitoral poderão participar da escolha de quem irá atuar, nos próximos quatro anos, na garantia dos direitos das crianças e adolescentes à saúde, educação, lazer, liberdade, cultura, convivência familiar e à vida. O debate para a escolha dos conselheiros tutelares se tornou mais acirrado desde o pleito de 2019, após a vitória de Bolsonaro no ano anterior e em meio à crescente onda reacionária e fundamentalista que espalhou-se pelo país.

Não é para menos, afinal os Conselhos Tutelares existem para combater situações de risco, abuso e violência sexual, trabalho infantil, casos de abandono, trabalhando para viabilizar o acesso a serviços de direitos essenciais.

No Recife, 88 candidatos concorrem a 40 vagas distribuídas entre as seis regiões político administrativas, conhecidas como RPAs – são cinco vagas por cada região, pois duas RPAs (a 3 e a 6) têm dois conselhos tutelares em razão do número de habitantes. As escolhas são realizadas a partir de cinco etapas de seleção, envolvendo prova de conhecimentos, análise de perfil, exame psicotécnico, voto popular e formação. Para chegar às eleições, o candidato precisa passar por três etapas anteriores, garantindo a aptidão para o cargo.

Embora o envolvimento com o público infanto-juvenil esteja, em tese, comprovado, os valores e posicionamentos pessoais dos candidatos a conselheiros está no centro da disputa.

Candidatos comprometidos com o ECA

Apesar de ser uma eleição facultativa é importante que a sociedade se movimente para escolher candidatos que se comprometem com o Estatuto da Criança e do Adolescente e com a garantia de direitos independente do posicionamento político-religioso. É possível conhecer os candidatos por área e os locais de votação no site do COMDICA. Lembrando que para votar é necessário estar portando documento de identidade e título de eleitor. As eleições vão ocorrer através de urnas eletrônicas e cerca de 2.500 servidores vão atuar neste processo eleitoral. 

O trabalho desses profissionais é remunerado e eles reportam à gestão municipal, com a atuação acompanhada pelo Conselho Municipal de Defesa e Promoção dos Direitos da Criança e do Adolescente (Comdica), responsável por identificar possíveis irregularidades. “Eles são fiscalizados diariamente pelo Ministério Público,  pelos órgão de controle e pelo conselho de direitos também faz o acompanhamento de perto da atuação desses conselheiros. Inclusive é o Comdica que promove anualmente, sempre que necessário, processo de formação, treinamentos, construção de fluxo e estabelecimento de rede para que o equipamento realmente funcione e da melhor maneira”, reitera o presidente da entidade, Wellington Pastor. 

A plataforma Eleições do Ano, uma iniciativa da organização Nossas, foi criada para conectar eleitores a candidatos comprometidos com o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA). No Recife, apenas 11 candidatos se cadastraram na plataforma, é possível acessá-la e verificar quem são aqui – no estado de Pernambuco foram 70 que se comprometeram. O compromisso com ECA é essencial para que cada jovem consiga, de fato, ter seus direitos garantidos, assim como pensar em profissionais progressistas, apartidários e imparciais também. 

“Criança é prioridade absoluta pela nossa legislação, mas as eleições para os Conselhos Tutelares ainda passam despercebidas para grande parte das pessoas. A sociedade precisa tomar para si essa responsabilidade. A Eleição do Ano é uma campanha que busca mobilizar todas as pessoas por essa causa fundamental. Criamos a plataforma como um meio de encontrar as candidaturas que de fato se comprometem com os direitos da infância e também de fortalecer essa rede em defesa do ECA”, afirma a ex-deputada federal Áurea Carolina, diretora-executiva do Nossas, organização não-governamental fundada em 2011 que atua por justiça social e igualdade.

Das 11 candidaturas aos Conselhos Tutelares do Recife, seis aparecem nas listas elaboradas por partidos de esquerda e de centro-esquerda como nomes “progressistas” que disputam as vagas.

Padre Kelmon em cena

Entre os candidatos do Recife, ao menos 12% se denominam cristãos, entre evangélicos e católicos. O candidato Pedro Leão, da RPA 5, por exemplo, se posiciona contra as discussões sobre a descriminalização do aborto, em seu perfil nas redes sociais diz: “não entrei na vida pública para me esconder. Sou convictamente contra o assassinato de seres humanos no ventre materno. E não me queiram justificar a regra pelas exceções. O Brasil já tem legislação que autoriza casos de aborto e devemos seguir o que a LEI diz”. 

Já o candidato Jean Willian, da RPA 6, recebeu apoio do ex-candidato a presidência Padre Kelmon, ao lado de outros quatro candidatos conservadores ao conselho entre os municípios de Pernambuco – o “padre” também publicou postagem com apoio a nove candidatos no estado do Amazonas. Chama atenção que a primeira imagem com as indicações está uma candidata de Camaragibe, que em sua apresentação se diz combater a ideologia de gênero, o aborto, as drogas e a exploração sexual infantil.

Os apadrinhados por Kelmon – candidato a presidente pelo PTB que substituiu Roberto Jefferson e atuou como “laranja” do bolsonarismo em 2022 – não são os únicos a usarem as manifestações de fé, sobretudo numa perspectiva cristã. Esta é a uma característica da disputa pelas vagas nos Conselhos.

Manoel Moraes, presidente do Conselho Diretor do Centro Dom Helder Câmara, afirma que “o conselheiro tutelar não é um missionário da fé. Ele é um agente constitucional, ele tem que atuar na defesa da dignidade humana e isso independe se ele vai atuar com pessoas que são de orientação de matriz africana, se é católico, protestante. Todas as instituições da sociedade, todo mundo é chamado para colaborar no Estatuto em uma verdadeira ciranda da democracia. O estatuto cria um sistema de proteção e garantias e nessa perspectiva todos são chamados a dar as mãos com as crianças que são sujeitos de direito”.  

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