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Atingidos por Renováveis querem intervir no modelo energético nacional

Marco Zero Conteúdo / 26/05/2025
Placa de advertência vista de baixo para cima, inclinada contra um céu nublado. A placa está presa a um poste e traz os dizeres em letras maiúsculas: “CUIDADO – ÁREA RESTRITA – NÃO ENTRE”, acompanhados do ícone de uma pessoa com um traço diagonal cruzando, indicando proibição. Acima da placa, é possível ver parte de uma hélice de turbina eólica, sugerindo que a área é uma zona de geração de energia. Um pedaço de arame farpado atravessa horizontalmente o topo da imagem, reforçando a ideia de área protegida. A iluminação é suave e dourada.

Crédito: Inês Campelo/Marco Zero

O Planejamento Espacial Marinho (PEM) do Nordeste foi lançado hoje (26), no Rio Grande do Norte, mas comunidades de pesca artesanal não foram convidadas. Mesmo assim, o Movimento dos Atingidos/as por Renováveis (MAR) estava lá, logo depois de realizar, no final de semana, seu primeiro encontro nacional, realizado de 23 a 25 de maio, em Lagoa Seca, na Paraíba.

O movimento reúne 79 organizações da sociedade civil, entre as quais comunidades pesqueiras, indígenas, camponesas e quilombolas, afetadas pelos grandes empreendimentos eólicos e solares. No 1º Encontro do MAR, todas as falas demonstrou a disposição para articular e reforçar, nacionalmente, as lutas de resistência que já são travadas em cada território.

A participação nos debates do Planejamento Marinho, que acontecerão em toda costa brasileira, foi uma das ações planejadas durante encontro. Para os representantes do Movimento, o projeto das eólicas offshore, que autoriza a construção destes empreendimentos em alto-mar, sequer poderia ter sido discutido sem a participação das populações que serão impactadas. E nenhuma concessão para funcionamento pode ser emitida sem a realização deste estudo, que deve contar com ampla participação social.

O cenário não traz boas perspectivas. Essa foi uma das conclusões dos integrantes do MAR, afinal o plano de expansão energética brasileiro prevê a construção de centenas de empreendimentos eólicos e solares, sobretudo no Nordeste.

“Não existe transição energética, nem desenvolvimento. O que existe é o mesmo colonialismo extrativista de sempre com um discurso falacioso”, afirma Nevinha Valentim, que faz parte do Movimento, contestando o discurso utilizado pelo governo e empresas para justificar esta expansão.

A resistência inclui comunidades que já sofrem o impacto de usinas eólicas e solares instaladas em seus territórios. São pessoas que perdem a saúde física e mental; que veem sua produção de alimentos ser reduzida drasticamente; que são forçadas a abandonar seus territórios, modos de vida e laços afetivos.

Celeste de Souza, pescadora do delta do Parnaíba, no Piauí, relata que, além de terem suas casas destruídas e a saúde abalada, os pescadores afetados têm a própria sobrevivência ameaçada pelas alterações provocadas no ecossistema e, por isso, lutam em sua defesa. “Elas causam problemas pra toda biodiversidade. As tartarugas desviam sua rota de reprodução; e algumas espécies de peixes que são fundamentais para toda a cadeia alimentar pesqueira, como a saúna e a tainha, estão ameaçadas”, diz Celeste.

Os problemas não estão restritos às eólicas. Zuíla Santos, da Associação Quilombola de Pitombeira, na Paraíba, é uma das que sentem os impactos das usinas fotovoltaicas.

“Durante a implantação, devido ao uso de dinamite para nivelamento do solo, nossas casas e nossas cisternas ficaram todas rachadas e até agora não conseguimos reparação. Sofremos com o calor por conta da destruição da vegetação que existia antes. Os animais, expulsos de seu ambiente e sem ter mais seu alimento, estão invadindo nossas casas. Raposas e gatos do mato, que têm hábito noturno, estão comendo nossas galinhas à luz do dia. Animais peçonhentos, como cobras, estão constantemente nos visitando porque não têm mais seu ambiente natural”, relata.

Para Sara Payayá, da comunidade indígena Payayá, na Chapada Diamantina (BA), outros dois problemas se sobrepõem a esses. “Eu vejo a história da colonização se repetir, com nossas mulheres sendo ludibriadas pelos homens que chegam com estes empreendimentos e novas formas de estupro. E estou em defesa também das pinturas rupestres que estão nas nossas serras. Cada torre instalada sobre estas inscrições destroem um pedaço de nossa história”, diz.

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Marco Zero Conteúdo

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