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Aos 86 anos, funcionário mais antigo da Cepe recicla fragmentos de papel fazendo arte

Jeniffer Oliveira / 26/07/2025
Foto de Júlio Gonçalves, um homem idoso de pele clara e cabelos brancos posa sorridente ao lado de uma grande escultura de arte em um ambiente interno, que parece ser uma galeria ou museu. Ele usa camisa polo roxa e calça clara, com uma das mãos apoiada na escultura, que tem formas geométricas e traços abstratos, lembrando um rosto estilizado. Ao redor, há outras esculturas de aparência similar, todas em tons terrosos e com aspecto robusto. A parede ao fundo exibe obras decorativas penduradas, incluindo um peixe colorido com aparência artesanal. O local é bem iluminado, com piso claro e teto de placas.

Crédito: Arnaldo Sete/Marco Zero

“Eu não sei exatamente, porque isso sempre me acompanhou”, respondeu Júlio Gonçalves, o funcionário mais antigo da Companhia Editora de Pernambuco (Cepe) ao ser questionado quando começou a se interessar por arte. Aos 86 anos completados neste domingo, 27 de julho, o artista autodidata iniciou sua trajetória profissional como gráfico e, hoje, assumiu a missão de reduzir o impacto ambiental gerado pelos fragmentos de papel. Ele faz isso dando vida a obras de arte usando os resíduos gerado pelas máquinas encadernadoras da empresa gráfica do estado.

Ao longo de 50 anos de trabalho, foi responsável por desenvolver a capa de mais de 300 livros, a criação das páginas editoriais do Diário Oficial do Estado (DOE), do arquivo documental da empresa e do Calendário Cepe, entre outros projetos marcantes, mas quando assumiu a gerência do parque gráfico, Gonçalves enxergou o potencial para que os fragmentos tivessem um destino diferente. Em vez de ser jogado no lixo, ele percebeu que o material poderia render se fosse reaproveitado em um processo muito parecido com o papel machê.

“Eu já conhecia o processo do papel machê. Então, quando tomei contato com esses fragmentos de papel, percebi que tudo estava pronto aqui. Eu percebi que metade do caminho já estava feito. Era só hidratar um pouquinho aquele papel fragmentado e botar uma cola”, afirma Gonçalves. De fato, o fragmento de papel que já vem triturado, exigindo apenas que os artesãos hidratem e coloquem a cola para formar uma base. A partir daí, se abre um universo de possibilidades, desencadeado pela imaginação e criatividade do veterano.

Sua ideia deu início a um projeto de sustentabilidade e economia criativa chamado Galeria Reciclada. Criado em 2016, o projeto oferece uma reflexão sobre o descarte consciente de resíduos que impactam o meio ambiente e mostra como eles podem ser ressignificados. Além dos fragmentos de papel também são utilizadas embalagens plásticas e outros produtos nocivos à natureza.

Quem visita a Cepe para comprar livros ou por motivos profissionais, é impactado nos corredores por obras de arte ricas em detalhes, texturas, cores diversas. Há quem imagine se tratar de esculturas medievais feitas de ferro ou murais armoriais, por exemplo. Raros não se espantam quando são informados que é tudo feito com sobras de papel.

Seu Júlio explica que a inspiração está sempre presente, a todo momento, ela chega com força. Quando ele fala do assunto, parece estar se referindo a uma revelação espiritual que o leva a construir uma nova peça.

Seu Júlio explica que a inspiração está sempre presente, a todo momento, ela chega com força. Quando ele fala do assunto, parece estar se referindo a uma revelação espiritual que o leva a construir uma nova peça.

“A inspiração vem por vários caminhos. De repente, uma forma qualquer pode dar a partida e eu começo a desenhar, o primeiro desenho já inspira outros, até chegar o que eu quero. Pelo meu desejo, pelo meu estilo, ele sempre tem uma base geométrica muito forte”, afirma Júlio Gonçalves.

O projeto ganhou força e corpo com o passar dos anos e, em 2023, se tornou um setor dentro do organograma da Cepe. O ateliê da Galeria Reciclada fica ao lado do parque gráfico e conta com mais quatro funcionários que, no dia a dia, têm a tarefa de executar as obras concebidas por Júlio Gonçalves.

“A gente vê a transformação do papel em tantas coisas bacanas”, conta a historiadora Ana Guimarães que trabalhava no setor de digitalização da Cepe e foi transferida para a Galeria. Lá, ela se encantou com todas as possibilidades que o papel possibilita e se apaixonou pela nova função.

Jorge Felipe, passou pouco tempo como técnico gráfico. Logo foi convidado por seu Júlio para integrar a equipe. Júlio percebeu a delicadeza em que o rapaz trabalhava. Desde então, ele atua na maior parte do tempo montando os moldes das peças e na preparação das cores. “É muito importante estar aqui, porque nós trabalhamos e relaxamos, trabalhamos também nosso psicológico”, afirma.

A equipe também é integrada pela artista visual Ligia Régis e o técnico gráfico David Cardoso. Juntos, todos eles também ministram oficinas em eventos, projetos parceiros e órgãos públicos. Levando as diferentes possibilidades de criar e explorar todos os materiais à disposição da criatividade.

Quatro pessoas estão em pé, sorrindo para a câmera dentro de um ateliê. À esquerda, um homem idoso de camisa roxa; ao lado dele, uma mulher de avental preto, óculos e cabelos castanhos; depois, um homem jovem com camiseta preta da Reebok; e, à direita, um homem de cabelos grisalhos e camiseta cinza. Atrás deles, há mesas com materiais e enfeites coloridos em forma de mandalas na parede. O ambiente é bem iluminado, com piso branco e aparência de oficina criativa.

Crédito: Arnaldo Sete/Marco Zero
A foto mostra um corredor interno com parede verde, onde está fixada uma grande obra de arte colorida. A peça é simétrica, composta por formas curvas e circulares nas cores azul, roxo, amarelo, laranja e verde, com duas flores vermelhas ao centro. A obra lembra um par de asas estilizadas ou uma borboleta abstrata. À esquerda da imagem, um homem vestindo uniforme azul e colete preto caminha rapidamente, aparecendo em movimento borrado. Atrás dele, há portas brancas com venezianas e janelas de vidro, indicando que o local pode ser um prédio público ou escolar. O piso é escuro e brilhante, e o ambiente está bem iluminado.

Crédito: Arnaldo Sete/Marco Zero
A imagem mostra uma exposição de esculturas abstratas feitas de metal ou material semelhante, com formas robustas e angulares. Em destaque, no lado direito da foto, há uma escultura que lembra um rosto estilizado com elementos que se assemelham a engrenagens ou peças industriais, como uma coroa de parafusos e orelhas em forma de discos. Ao fundo, outras esculturas com estilos similares aparecem desfocadas, alinhadas ao longo de uma parede branca. As obras têm cores escuras, com tons de ferrugem e bronze envelhecido. O ambiente tem aspecto de galeria ou museu, com iluminação clara e foco nas peças expostas.

Crédito: Arnaldo Sete/Marco Zero

AUTOR
Foto Jeniffer Oliveira
Jeniffer Oliveira

Jornalista formada pelo Centro Universitário Aeso Barros Melo – UNIAESO. Contato: jeniffer@marcozero.org.