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Crédito: Arnaldo Sete/MZ Conteúdo
A Lagoa do Araçá era para ser um dos cartões-postais do Recife. Tem uma beleza exuberante, com um mangue margeando a única lagoa natural da capital pernambucana. Há uma quantidade enorme de patos na água e saguis são vistos com frequência. Vez ou outra, capivaras e até jacaré aparecem por lá. Tem parque para crianças, quadra de esportes e uma boa oferta de lanchonetes e restaurantes. Há deques que adentram a lagoa, para melhor apreciação da natureza.
Mas nada é como parece. O parquinho é o mesmíssimo de quando foi inaugurado em 1994, feito de cimento e quase sem sombra, sob o forte sol que marca mais de 30 graus. Tem até um chuveirão bem ao lado da quadra, mas ele nunca funcionou. O mangue frondoso e alto é resultado da grande quantidade de matéria orgânica – dejetos, esgoto – da lagoa. Moradores da área também reclamam da segurança, não exatamente na lagoa, onde há um posto policial, mas nas ruas ao redor, no bairro da Imbiribeira.
O problema mais urgente, porém, é ambiental. Sem chuvas, a lagoa fica mais seca e o mau cheiro invade o espaço. É cheiro forte de esgoto, ainda que, oficialmente, a Compesa não lance esgoto na lagoa desde que o saneamento foi feito ali, na década de 2010. “O esgoto daqui da localidade é levado para uma estação de tratamento. Mas também não sabemos se há alguma ligação clandestina”, explica Patrícia Fradique, do Grupo Ação e Proteção da Lagoa do Araçá.
A mãe de Patrícia, Lourdes Tenório, foi quem mobilizou a comunidade, ainda no começo dos anos 1980, para a proteção do local. Na época, havia projetos para aterrar toda a lagoa e construir conjuntos habitacionais. Foi graças à luta dos moradores pela conservação ambiental que a lagoa conseguiu ser salva e recebeu, na década seguinte, equipamentos de lazer em seu entorno.
Mas a lagoa, que recebe água de um canal do rio Tejipió, não tem sido cuidada com o cuidado que necessita, denunciam moradores. “Eu ia até alugar um apartamento por aqui (do lado da quadra), mas desisti por conta do mau cheiro, que deste lado da lagoa é constante”, disse Heitor Stanislaw, de 30 anos. “A poluição daqui é muito marcada pela questão do assoreamento. A gente fica desmotivado, porque às vezes parece que vai ter uma dragagem, mas nada acontece. Tinha muito caranguejo por aqui, mas por conta da poluição a gente não vê mais”.
Moradora da Lagoa do Araçá desde que nasceu, Thamires Freitas , de 28 anos, nunca viu uma limpeza mais profunda por lá. “Às vezes o cheiro ruim é tão forte que da rua atrás da lagoa dá para se sentir. Tem alguns animais por aqui, mas se o ambiente deles não está bem, acredito que eles também não estão”, diz.
Há um clamor por uma grande reforma na praça, com novo parque infantil, novos banheiros, novos quiosques e pista de cooper. Moradora da Imbiribeira, Luciene Maria dos Santos, de 43 anos, diz que nada disso pode acontecer antes da poluição da lagoa ser resolvida. “Porque a gente fica incomodada quando está caminhando na pista ou no parque e vem aquele cheiro ruim muito forte”, reclama.
A única dragagem feita na lagoa aconteceu em 1998. “Hoje, restam apenas de 40 a 50 centímetros de espelho d’água. O resto é lama. A dragagem é importante para garantir a vida da lagoa. E precisa ser feita logo ou em pouco tempo teremos apenas um grande esgoto a céu aberto”, lamenta Patrícia. “E teria um duplo benefício, já que também serviria para desaguar as enchentes que são cada vez mais comuns por aqui. Com tanta lama, a lagoa não consegue mais absorver essa água”, diz.
A esperança dos moradores é de que o empréstimo de mais de R$ 2 bilhões que a Prefeitura do Recife pegou com o Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID) para o Programa de Requalificação e Resiliência Urbana em Áreas de Vulnerabilidade Socioambiental – ProMorar Recife seja alocado também para a lagoa, já que incluiu a macrodrenagem do rio Tejipió.
Em dezembro, o prefeito João Campos (PSB) foi à lagoa e ouviu os moradores, que falaram sobre esse duplo benefício. “Ele escutou, disse que era importante, mas não prometeu nada. Disse que a prefeitura ia estudar o assunto. Não sei se é um sonho, mas acho que agora poderá ser resolvido”, conta Patrícia.
À Marco Zero, a Prefeitura do Recife informou que a macrodrenagem da bacia do rio Tejipió está em fase de estudo no âmbito do ProMorar, inclusive com possíveis intervenções na Lagoa do Araçá. A prefeitura também está realizado nesta semana o evento Hackathon Recife – Modelando uma cidade resiliente, com a participação de especialistas holandeses e brasileiros nas áreas de recursos hídricos, mudanças climáticas, drenagem e planejamento urbano.
A ideia do evento é debater e analisar estudos sobre a bacia do rio Tejipió e a viabilidade técnica de algumas soluções e medidas de adaptação. “Os estudiosos vão apontar soluções no estudo, que, futuramente, deverão ser garantidas pelo ProMorar Recife”, diz a nota da prefeitura.
Entre os resultados esperados pelo ProMar, segundo a prefeitura, estão a retirada de 3 mil famílias de áreas com riscos de alagamentos ou deslizamentos; a redução de 40% dos pontos com classificação com alto risco na cidade do Recife; a macrodrenagem nas bacias dos rios Tejipió, Jiquiá e Moxotó; a redução de 50% no volume de alagamento promovido pela bacia do Rio Tejipió e a urbanização de, pelo menos, 40 Comunidades de Interesse Social.
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Jornalista pela UFPE. Fez carreira no Diario de Pernambuco, onde foi de estagiária a editora do site, com passagem pelo caderno de cultura. Contribuiu para veículos como Correio Braziliense, O Globo e Revista Continente. Contato: carolsantos@marcozero.org