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Acuados, bolsonaristas estão mais insanos e ameaçadores nos grupos de WhatsApp

Inácio França / 27/04/2021

Crédito: Reprodução WhatsApp

Dizer que as redes bolsonaristas estão em pé de guerra seria mais do mesmo. É assim que elas sempre estão, porém, agora, às vésperas do início das investigações da CPI da Covid, percebe-se uma tensão crescente.

Impulsionados perpetuamente pela retórica agressiva de Jair Bolsonaro, os perfis, comunidades e os integrantes dos grupos de WhatsApp e Telegram de extrema-direita acostumaram-se a permanecer na ofensiva. Aos poucos, o tom triunfalista das postagens foi arrefecendo.

A queda nos índices de aprovação do presidente ao longo de 2021 foi acompanhada de queixas contra aqueles que não o deixam governar: STF, Tribunal de Contas, deputados, senadores, governadores, prefeitos, cientistas, universidades, OMS, ONU, a China, Joe Biden, Lula, Rede Globo, mídia. Ou seja, todos os atores políticos e institucionais que não sejam bolsonaristas de carteirinha se transformam em alvo tanto de ameaças quanto reclamações.

Diante da possibilidade do Governo Federal enfrentar uma reação concreta e articulada no Congresso, a fúria parece ter cedido terreno para a preocupação. Enquanto a CPI não começa, os bolsonaristas evitam comentar abertamente ou postar conteúdos explícitos sobre a Comissão – com exceção para a possibilidade efêmera de Renan Calheiros não ser o relator.

Aqui na Marco Zero acompanhamos pelo menos cinco desses grupos bolsonaristas – eram seis, mas um deles se dissolveu devido ao grande número de esquerdistas infiltrados que acabaram esculhambando demais as coisas por lá. Não é difícil perceber que eles estão na defensiva, parecem esperar por um comando mais claro do “mito”, que, acuado, tenta fingir que não teme ser jogado para as cordas.

Num desses grupos, um homem com telefone de prefixo de Pernambuco e que usa o nome de “Coronel Fernando” postou, pouco antes das 13h de segunda-feira, 26 de abril, um link do Jornal da Cidade Online alertando para o fato de “Bolsonaro rompe o silêncio: está chegando a hora, nossa bandeira jamais será vermelha”. O Jornal da Cidade é um dos sites propagadores de conteúdos falsos que está sendo investigado pelo Supremo Tribunal Federal no chamado inquérito das Fake news.

Depois da postagem do coronel, no entanto, nenhum dos outros integrantes teve ânimo para postar mais nada, nem mesmo para se questionar qual silêncio Bolsonaro teria rompido, já que o presidente não cansa de fazer lives e de dar entrevista para jornalistas amigos.

Mais insanidade (por incrível que pareça)

Sim, é difícil de acreditar, mas quando estão na defensiva, os apoiadores de Bolsonaro são capazes de elevar mais alguns graus na escala da maluquice. As teses bizarras, novas ou recicladas, não param de circular. Em outro grupo, com integrantes de vários estados, um cearense chamado França da Silva (nenhum parentesco com o autor dessas linhas, juro) postou repetidas vezes, sem nenhum link ou comprovação, que “estava entrando muito dinheiro em Fortaleza. Desse jeito o lockdown não vai acabar nunca”. Nenhuma teoria sobre a origem dessa fortuna que a capital do Ceará estaria arrecadando com o fechamento do comércio.

Em outro grupo, o administrador de um perfil do instagram de nome enigmático – “Derrubando as Pedras Guias da Geórgia”, numa referência a um monumento erguido no estado da Geórgia, nos Estados Unidos – postou um alerta bizarro: “Já estão proibidas as colheitas agrícolas em algumas cidades do Brasil e em pouco tempo assim estará no país inteiro (…) Já estamos em redução populacional. Esta é a nova ordem mundial”.

Nem tentamos entender de onde teria vindo a ideia de que alguém estaria proibindo agricultores de fazerem seu trabalho, mas é comum relacionarem a pandemia com a tal Nova Ordem Mundial, que os mais íntimos chamam de NOM. Para os adeptos das teorias da conspiração do estilo, a NOM seria uma espécie de governo mundial totalitário, mas um bom entendedor percebe fácil que é um dos nomes que a extrema-direita dá à repulsa que sentem diante da perspectiva de um mundo sem racismo, menos machista, mais igualitário.

O uso de máscaras é assunto que, volta e meia, faz sucesso entre os fanáticos. Um bolsonarista chamado Marcos Nogueira, que em seu perfil de instagram se autointitula “Representante do Governo” e tem mais de 30 mil seguidores, defende uma tese exótica sobre as máscaras: “Se começarmos a usar máscaras escrito ‘Bolsonaro 2022’, quanto tempo você acha que vai levar até os especialistas informarem que não precisaremos mais usar e quem sabe até proibir?”. Sua postagem com a frase lapidar foi compartilhada em vários grupos nas últimas semanas.

A obsessão por 2022 e o medo de Lula

A retomada dos direitos políticos do ex-presidente Lula foi outro ponto de inflexão nos grupos bolsonaristas. As postagens sucessivas mal escondem o temor diante da possibilidade do confronto direto Lula x Bolsonaro em 2022, porém antes mesmo do ministro Edson Fachin ter decidido pela incompetência de Sérgio Moro em julgar o petista, a reeleição do atual presidente sempre já dava o tom de boa parte das mensagens trocadas nos grupos e comunidades.

Para os apoiadores de Bolsonaro, toda iniciativa de qualquer ator político que não faça parte do entorno do presidente, teria como objetivo prejudicá-lo em 2022. Esse “raciocínio” vale para as medidas restritivas de contenção do coronavírus, a recomendação para uso de máscaras, decisões do STF, defesa do uso da vacina, apelos por auxílio-emergencial, aulas online. A lista é imensa. Em compensação, todas as iniciativas e palavras de Bolsonaro são percebidas como uma tentativa de fazer o bem do Brasil, incluindo as tentativas de impedir que seus filhos sejam investigados, os ataques a parceiros comerciais e a recusa em comprar vacinas.

Se Lula voltou a ser protagonista também no bolsonarismo, não há nada que os irrite mais do que as notícias de pesquisas de opinião que apontam o ex-presidente à frente do “mito” da extrema-direita. Os argumentos contra os números das sondagens de voto podem até ser ridículos para quem está de fora desse ambiente, mas rendem debate, são passados adiante como válidos e consistentes.

Um exemplo postado por um cearense que usa como nome de contato Diga n ao comunismo: “Em pesquisa feita no Twitter por um digital influencer, sobre o resultado do levantamento XP/Ipespe, o presidente Jair Bolsonaro lidera com 77,6% das intenções de voto para 2022, contra 22,4% de Lula”. Isso mesmo, você não leu errado, uma enquete no twitter feita por um influenciador digital numa rede social teria mais peso do que um levantamento de um instituto de pesquisa.

AUTOR
Foto Inácio França
Inácio França

Jornalista e escritor. É o diretor de Conteúdo da MZ.