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Movimentos sociais e candidaturas progressistas disputam 7 de Setembro no Grito dos Excluídos

Maria Carolina Santos / 07/09/2022

Crédito: Arnaldo Sete/MZ Conteúdo

Há 28 anos o Grito dos Excluídos é um questionamento e um contraponto ao ufanismo dos desfiles militares do Dia da Independência. Neste 7 de setembro, a 25 dias para as eleições, se tornou também uma passarela para políticos de vários espectros da esquerda, assim como acontece em anos eleitorais. A diferença dessa vez talvez tenha sido uma presença ainda mais forte de militâncias de candidatos e candidatas. E um receio da esquerda de disputar a data, que vem se consolidando no governo Bolsonaro como uma parada de orgulho da extrema direita.

Nacionalmente, o Partido dos Trabalhadores (PT), o maior partido de esquerda do Brasil, preferiu se afastar da data da Independência. Lula não teve agenda pública. Nas redes sociais, afirmou que “tenho fé que o Brasil irá reconquistar sua bandeira, soberania e democracia”. Fernando Haddad, ex-candidato a presidente e hoje candidato ao governo paulista, cancelou agenda no interior de São Paulo por conta de ameaças consideradas graves por sua equipe de segurança.

No Recife, uma multidão foi para Boa Viagem com a bandeira nacional como se fosse a bandeira de Jair Bolsonaro e da extrema direita. No centro do Recife, não dá para dizer que o Grito dos Excluídos teve pouca gente ou não deu um bom público. Foi uma passeata cheia e vibrante do Parque 13 de Maio até a Praça da Independência, conhecida como Pracinha do Diário. Mas sem as militâncias partidárias talvez não tivesse o mesmo vigor.

Primeira colocada em todas as pesquisas de intenção de voto, Marília Arraes, do Solidariedade, fez uma rápida passagem pelo Grito, acompanhada da irmã Maria Arraes, candidata à deputada federal. Há anos ela participa da manifestação e dessa vez levou a maior militância ao Grito dos Excluídos, com direito a muitas bandeiras e um mini maracatu. Tinha até uma “animadora de bandeiras”, para deixar sempre as dezenas de bandeiras de Marília vibrando no ar. Tanto as bandeiras quanto as camisas da militância eram em vermelho, e destacavam o nome de Lula.

Candidato oficial de Lula em Pernambuco, Danilo Cabral (PSB) não foi visto nem se fez ver no Grito dos Excluídos. Pela manhã, cumpriu agenda no Complexo Esportivo Santos Dumont, em Boa Viagem. Não havia militância, nem bandeiras da sua candidatura na manifestação. Nem mesmo candidatos da sua coligação exibiam o rosto de Danilo em panfletos ou adesivos.

Da chapa majoritária da Frente Popular, a Marco Zero encontrou apenas Teresa Leitão (PT), que concorre ao Senado. Professora e sindicalista, ela falou sobre a importância de estar ali. “Das 28 edições, foram poucas as que eu não vim. Esse ano fiz questão de comparecer porque nunca a resistência dos excluídos foi tão necessária no Brasil”, disse à Marco Zero.

Sobre a falta de bandeiras de Danilo Cabral na manifestação, ela afirmou que “o Grito nos recebe, mas o Grito sempre separa (as bandeiras das candidaturas e partidos das dos movimentos sociais e sindicais). Por isso que nossa campanha veio, estamos aqui, com adesivos, mas a gente acha que hoje as bandeiras principais são as do Grito, que estão contidas nas nossas campanhas e isso é suficiente, para não confundir a visibilidade do povo, por isso que não trouxemos as nossas”, disse Teresa, que levou pelo menos três bandeiras à manifestação. Todas com foto ao lado de Lula, e sem menção a Danilo Cabral (PSB), cuja imagem aparecia no adesivo que ela usava.

Este ano, a sindicalista Teresa Leitão participou do Grito como candidata ao senado. Crédito: Arnaldo Sete/MZ Conteúdo

Desfile de candidaturas

Ao iniciar a caminhada do Parque 13 de Maio até a Praça da Independência, uma voz no microfone avisou: bandeiras de candidaturas e partidos ficam atrás. Mas eram tão numerosas que, tirando aquelas que abriam a passeata, quase todas eram bandeiras de candidaturas ou partidos. Havia bandeiras e grupos da Unidade Popular, do Partido Comunista Brasileiro (PCB), do PSOL e de muitas candidaturas do espectro de esquerda. Houve até a presença de um representante do MDB.

Marília Arraes era, disparado, a candidatura mais organizada da manifestação. Mas candidatos como Vini Castello (PT) e Rosa Amorim (PT) também eram numerosas, ao lado de bandeiras de sindicatos, organizações estudantis e do MST.

No discurso, muitas das mais de 15 candidatas e candidatos que a Marco Zero entrevistou defenderam a retomada das cores e da bandeira nacional, discurso usado também pelos representantes de movimentos sociais que foram ao Grito dos Excluídos. O tema desse ano, que homenageou também o padre Reginaldo Velozo, foi “Brasil, 200 anos de (in)dependência para quem?”. A passeata trouxe na frente uma enorme bandeira do Brasil manchada de sangue. Logo atrás, uma mulher caminhou vestida com uma enorme bandeira do Brasil, e usando um boné do MST. “Essa bandeira não é de partido, é do povo brasileiro, que hoje grita pela volta de um presidente que ame o seu povo”, disse Hélida Nogueira, a mulher vestida de verde e amarelo.

Para o ex-deputado federal e candidato Fernando Ferro (PT) o uso dos símbolos nacionais pela extrema direita é “uma técnica fascista que funcionou com Hitler, com Mussolini, mas o povo brasileiro vai derrotar Bolsonaro. Não podemos permitir que os símbolos da nossa pátria sejam partidarizados”. Também ex-deputado e candidato, Paulo Rubem Santiago (Rede) defendeu que a população que vota nas esquerdas deve ir às ruas “para consolidar uma independência não só política, mas econômica e social. Esse é o espírito da manifestação do Grito dos Excluídos”.

Tentando a reeleição, o deputado federal Túlio Gadelha (Rede) foi uma surpresa para quem acompanha o Grito dos Excluídos, já que não é um participante frequente da manifestação. Ao lado da Bancada Indígena, candidatura coletiva para a Assembleia Estadual de Pernambuco que tem o apoio de dez etnias, Túlio falou que há o receio de parte da população de participar de manifestações porque a violência se tornou algo comum no ambiente político. “O bolsonarismo tem uma parcela significativa de culpa nisso, com uma política autoritária e armamentista. A gente precisa enfrentar isso com debate político”, disse.

Também candidata pela Rede, a ativista Sylvia Siqueira Campos disse que não tinha como comparar as duas manifestações do Sete de Setembro. “Hoje parte da esquerda está aqui, mas tem muito mais gente da esquerda conquistando nos territórios. Hoje a gente sabe que o poder de mobilização é tão grande quanto antes, mas temos contra a gente uma narrativa que está pesando há anos. E as forças econômicas que elegeram Bolsonaro não desapareceram”, disse.

Vereadora pelo PT no Recife e também candidata, Liana Cirne Lins defende a escolha de Haddad e de Lula de não participar de manifestações hoje. “Nós temos que preservar quem carrega o futuro da democracia do país. Mas a vida é feita de coragem e estamos aqui defendendo os valores da democracia. Todo mundo que está aqui foi alertado sobre o risco de sofrer atos terroristas por parte de fundamentalistas da extrema-direita e fizemos uma escolha política de não nos curvar e não deixar o medo vencer a esperança”.

Luta de massas mais urnas

As esquerdas estão convocando também para outra manifestação no próximo sábado, dia 10. O PSOL divulgou uma nota colocando como prioridade uma “mobilização democrática massiva” no sábado, que seria uma resposta ao 7 de Setembro da extrema-direita. Danilo Cabral (PSB) postou uma convocação para a passeata do sábado nas suas redes sociais.

Talvez o único candidato ao governo de Pernambuco a fazer todo o percurso da caminhada – além de Marília, João Arnaldo (PSOL) também passou pelo Grito -, Jones Manoel (PCB) considera essa estratégia pulverizada de manifestações um risco.

“É um erro histórico de parte da esquerda o esvaziamento do Sete de Setembro e do Grito dos Excluídos, que é um dos protestos mais tradicionais da esquerda brasileira. E é um erro porque o 10 de setembro também não está muito mobilizado e talvez seja até menor que o Grito, particularmente aqui em Pernambuco. Há uma parte da esquerda que faz uma opção equivocada de esvaziar as ruas achando que o voto na urna vai resolver tudo. Mas precisamos combinar a luta de massas com o voto contra Bolsonaro. Agora e após a eleição, porque Bolsonaro perdendo no primeiro ou no segundo turno vai ser presidente do Brasil até 31 de dezembro, e vamos ter muita luta para fazer para impedir uma manobra golpista”, afirmou.

Jones Manoel acredita que esquerda erra ao pulverizar manifestações de rua. Crédito: Arnaldo Sete/MZ Conteúdo

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AUTOR
Foto Maria Carolina Santos
Maria Carolina Santos

Jornalista pela UFPE. Fez carreira no Diario de Pernambuco, onde foi de estagiária a editora do site, com passagem pelo caderno de cultura. Contribuiu para veículos como Correio Braziliense, O Globo e Revista Continente. Ávida leitora de romances, gosta de escrever sobre tecnologia, política e cultura. Contato: carolsantos@gmail.com