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Denúncia de descarte de livros e documentos históricos no Dnocs. Coordenação nega

Laércio Portela / 05/02/2021

Livros amontoados na carroceria de um caminhão no pátio do Dnocs chamaram a atenção dos servidores.

Uma série de fotos tirada nesta quinta (4) de um caminhão com a carroceria cheia de livros e documentos antigos estacionado no pátio do Dnocs (Departamento Nacional de Obras Contra as Secas), na Tamarineira, Zona Norte do Recife, chamou a atenção de servidores do órgão e começou a circular em grupos de Whatsapp. A denúncia é de que o volume seria encaminhado como material reciclável para o Hospital do Câncer.

As fotos mostram livros técnicos em italiano, francês, inglês, espanhol e português publicados nos anos 1930 e 1940. Eles estão jogados uns sobre os outros sem cuidado com a sua preservação. Boa parte deles tem o selo de identificação de propriedade do DNOS, o antigo Departamento Nacional de Obras e Saneamento, extinto em 1990 no governo de Fernando Collor.

Com o fim do DNOS, os livros foram transferidos para a Sudene e de lá para uma sala no Dnocs. Entre o material exposto no pátio constam também placas de inauguração de obras, como a da Primeira Etapa do Projeto de Irrigação do Moxotó, em Salgueiro, ainda sob o governo do general João Figueiredo; e do Açude Público do Rosário, na gestão do ex-presidente José Sarney.

A servidora aposentada do Dnocs Kátia Maia, que trabalhou por 36 anos na instituição como engenheira agrônoma e se aposentou em outubro de 2020, se disse chocada com as imagens. “A primeira sensação que tive foi de profunda tristeza. Geralmente esses livros são tombados, considerados bens patrimoniais. Para serem descartados é preciso um processo de baixa com justificativa muito bem embasada”, explica.

Kátia alerta que entre os livros amontoados no caminhão devem existir mapas, plantas, relatórios, projetos e estudos técnicos, já que o DNOS atuava na área de drenagem e de açudagem. As barragens de Carpina e de Tapacurá são obras realizadas pelo extinto Departamento Nacional de Obras e Saneamento. “Ali está a memória disso tudo, projetos implantados e outros que não saíram do papel”, alega.

A servidora aposentada defende que o material seja encaminhado para bibliotecas públicas para que possa ser devidamente preservado e acessado pelo público em geral e por pesquisadores. Ela chama a atenção também para a fato de que o próprio acervo técnico do Dnocs funcionaria num espaço passível de inundação e sem as condições necessárias de cuidado e proteção.

Promessa de recuperação

A denúncia de que o material exposto no pátio do Dnocs seria transferido para o Hospital do Câncer foi negada pelo coordenador do órgão em Pernambuco, José Edilson Monteiro. Em entrevista para a Marco Zero Conteúdo, ele afirmou que as fotos circularam “fora do contexto”. “As pessoas veem a imagem do caminhão cheio de livros e acham que eles vão ser jogados no canal do Arruda. Não é nada disso. A história é completamente diferente. Vamos selecionar, recuperar e colocar na biblioteca”, informou Edilson, que é coronel da PM .

Ele disse que os livros e materiais foram colocados no caminhão para serem transportados para uma área que fica na parte de trás do prédio sede do Dnocs. “Seria bem complicado transferir tudo em carro de mão. Os livros que prestam, que têm condições, serão recuperados. Os imprestáveis, que o cupim comeu e não tem mais jeito, é que serão enviados para o Hospital do Câncer, eles têm um jeito de ganhar dinheiro lá com isso”.

O material está sendo retirado porque a sala que ocupava será disponibilizada para a Polícia Federal. “Em contrapartida, eles vão ajeitar a sala que estava em desuso. A gente jamais vai tirar um patrimônio sem processo legal. Jamais faremos isso irresponsavelmente. Eu fui inclusive lá e vi que tem livro do meu interesse, na minha área de Direito, que eu quero ler. A foto está fora do contexto”, garantiu o coordenador, que está à frente do órgão federal em Pernambuco desde junho de 2020.

Nos bastidores, pessoas ouvidas pela reportagem disseram que a decisão de não encaminhar todo o material direto para o Hospital do Câncer só teria sido tomada por conta da má repercussão da divulgação das imagens nas redes sociais. Logo após conversar com a reportagem, o coordenador do Dnocs em Penambuco divulgou uma nota pública sobre o assunto.

ÍNTEGRA DA NOTA DO DNOCS PERNAMBUCO

Foram publicadas fotos de um caminhão cheio de livros nas dependências do DNOCS, em Pernambuco (CEST-PE).

Portanto, gostaríamos de esclarecer que nosso patrimônio histórico e cultural está sendo e será sempre preservado, pois o que está ocorrendo é que estamos retirando todo o entulho e os livros de uma sala que será ocupada pela Polícia Federal (PF) para uma outra sala. Esta sala que a PF ocupará, será feito através de um contrato com contrapartida de recuperação da referida sala, a exemplo do que também estamos fazendo com a Receita Federal, no bloco C. Para onde estão sendo levados os livros, aqui dentro do DNOCS mesmo, eles serão selecionados, limpos, catalogados e colocados no lugar próprio, que é nossa biblioteca que fica ao lado da sala da direção da ASSECAS, que aliás está contribuindo com todo este processo, sob o controle da nossa funcionária Célia, como também do Delegado Cardoso, da PF, que está a frente desta mobilização.

Esta biblioteca já contém vários livros tombados pelo nosso patrimônio e que estavam no quarto andar, onde hoje funciona o Ministério de Desenvolvimento Regional (MDR).

A foto do caminhão carregado de livros pode deixar alguém desavisado “perplexo”, pois sendo fora do contexto do que realmente está sendo feito e não está sabendo que foi esta a forma mais prática e econômica de se deslocarem os livros para outro local, em vez de pequenos carros de mão. 

Assim, esperamos ter explicado a celeuma que causou a referida foto que foi colocada em vários grupos e até na impressa, sem uma explicação lógica da realidade. Lamentável esta atitude de quem deveria ter procurado saber primeiro a verdade, esta sim, liberta!

JOSÉ EDILSON MONTEIRO -CEL PMPE

Coordenador do DNOCS em Pernambuco.

AUTOR
Foto Laércio Portela
Laércio Portela

Co-autor do livro e da série de TV Vulneráveis e dos documentários Bora Ocupar e Território Suape, foi editor de política do Diário de Pernambuco, assessor de comunicação do Ministério da Saúde e secretário-adjunto de imprensa da Presidência da República