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Destino de mais de 40 milhões da Comunicação do Recife ainda sem resposta

Débora Britto / 10/10/2018

Foto: Beto Figuerôa

A quebra de braço da Prefeitura do Recife com o vereador Ivan Moraes (Psol) no que diz respeito à transparência com os valores gastos com comunicação e publicidade pelo poder público ganhou novo capítulo. O destino de mais de 40 milhões de reais liquidados neste ano com comunicação pela gestão do prefeito Geraldo Julio (PSB) foi o motivo da nova audiência pública realizada na terça-feira (09), na Câmara dos Vereadores do Recife.

“É um cheque, na verdade é uma fatura de cartão de crédito de mais de 40 milhões que não diz para onde foi. E é uma conta que já foi paga, a gente nem pode decidir não pagar. A prefeitura tem obrigação de disponibilizar esses dados, não para que o mandato entenda, mas para que qualquer pessoa do Recife compreenda, de acordo com o que diz a lei”, declarou Moraes.

Disponíveis no Portal da Transparência como operações chamadas  “Outras medidas” e “Ação não informada”, o montante de recursos chamou atenção e levantou suspeitas da sociedade civil organizada, que reclama da falta da clareza das informações e cobra da Prefeitura a explicação e detalhamento de onde e como foram gastos os recursos. “Para onde vai nosso dinheiro?” é a pergunta feita pelo vereador Ivan Moraes (Psol), autor da convocação das audiências.

Convocados pela segunda vez, representantes da Secretaria de Governo e Participação Social, Diretoria de Orçamento e o presidente da Fundação de Cultura do Recife, empresa pública à qual a Rádio Frei Caneca está vinculada, compareceram à audiência para responder às questões que ficaram em aberto na primeira audiência, realizada em Setembro. Na primeira reunião pública, a ausência de todos os representantes da Prefeitura foi motivo de críticas severas à gestão e a abertura de uma representação no Ministério Público de Pernambuco (MPPE). “Foi protocolado uma representação e já está se movimentando e vamos acompanhar acompanhar essa investigação”, afirmou o vereador.

Explicação pela metade

A secretária Executiva de Comunicação, Renata Stadtler, representando o secretário de Governo e Participação Social, Sileno Guedes, refutou o vereador dizendo que as informações estão disponíveis no portal. No entanto, não apresentou respostas concretas às questões que pairam sobre o debate. Ela ficou de informar ao mandato um prazo para responder quando teriam disponíveis as informações dos gastos exclusivamente com comunicação.

“É uma questão de interpretação dos dados e evolução do sistema tecnológico de apresentação de dados”, disse a secretária executiva. Segundo ela, não é possível contabilizar cerca de 30 milhões do orçamento previsto para a pasta, pois estariam reservados para processo licitatório. No entanto, a conta não fecha. Do total de recursos disponíveis (73.320.000,00), até outubro de 2018 já foram liquidados 47.405.789,12 – restaria, assim, pouco mais de 25 milhões.

A secretária também questionou os nomes das rubricas que são o foco da audiência, sugerindo que não seriam verdadeiros. Apesar de serem os nomes alimentados pelo sistema da própria Prefeitura. Segundo ela, os nomes não correspondem à realidade dos pagamentos feitos. Haveria uma “inconsistência no sistema”, segundo Stadtler, que coloca todos os gastos com pagamento de pessoal da Secretaria de Governo e Participação Social na rubrica “Ação não informada”, que é vinculada, especificamente, à ação de comunicação.

“E aí a tecnologia vai nos dizer. Todo salário de pessoal da Secretaria de Governo e Participação Social, até a Secretaria de Direitos dos Animais, que tem o veterinário, porque está vinculada à secretaria de governo, é naquela ação não informada. Eu pago o salário de todo mundo e eu pago até o médico do cachorrinho e aí tu chama de publicidade. Tem um problema da informação, como ela se colocou, mas aí vai ter o esclarecimento”, garantiu.

Para o vereador, a Prefeitura não respondeu às questões levantadas. “A Prefeitura não dá resposta para a pergunta da gente, que é bem objetiva. Tem que ter descrito como é gasto. A prefeitura descumpre a Lei Federal que diz como devem ser disponibilizados os dados com propaganda”, criticou.

A lei que ele cita é a Lei Federal nº 12.232/2010, que prevê no artigo 16 que “informações sobre a execução do contrato, com os nomes dos fornecedores de serviços especializados e veículos, serão divulgadas em sítio próprio aberto para o contrato na rede mundial de computadores, garantido o livre acesso às informações por quaisquer interessados. Parágrafo único: As informações sobre valores pagos serão divulgadas pelos totais de cada tipo de serviço de fornecedores e de cada meio de divulgação”.

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Como encaminhamento da nova audiência, a equipe do vereador irá se reunir também com o Diretor de Orçamento, Arthur Gueiros, que participou da mesa e explicou como a Prefeitura organiza o ordenamento financeiro internamente. Segundo ele, internamente a gestão vem testando uma modificação no sistema: criaram “sub ações” que ajudam a detalhar e classificar os gastos de maneira descritiva ao que correspondem. No entanto, ele reconheceu que o recurso ainda não está disponível no Portal da Transparência e não há um prazo para entrar no ar. O internauta que acessa o portal hoje tem as mesma informações gerais, sem informações detalhadas e claras sobre os gastos com comunicação.

“Hoje o que conseguem ver no nível de detalhe não atende ao que vocês desejariam. Essas operações constam na Lei orçamentária. Isso que vocês veem foi uma tentativa de detalhamento da prefeitura feita há uns 10 anos. E se comprovou não ser a melhor alternativa. Até hoje nem o cidadão consegue enxergar bem nem ajuda no gerenciamento da prefeitura”, explicou o diretor.

Ainda de acordo com ele, a criação das sub ações vão simplificar e tornar mais compreensível para o cidadão como são feitos os gastos. “Sub ação existe gerencialmente na Prefeitura, mas ainda não é visualizada no Portal da transparência porque ela ainda não é instrumental. A prefeitura faz uso disso, mas o cidadão não. É do desejo que isso ocorra o mais rápido possível. Hoje a gente tem cerca de 200 sub ações. São nomes diretos e óbvios para o cidadão entender. Hoje estamos no momento da transição”, explicou.

Histórico

“O que nós queremos é muito mais que a lei, a gente quer transparência total, mas se a prefeitura não quiser chegar onde a gente quer, que pelo menos cumpra a lei”, cobrou o vereador, fazendo referência ao Projeto de Lei 21/2017, de sua autoria, que propunha que toda publicidade paga com recurso público fosse veiculado com o valor gasto em cada uma. O projeto foi rejeitado pela Câmara dos Vereadores.

 

AUTOR
Foto Débora Britto
Débora Britto

Mulher negra e jornalista antirracista. Formada pela Universidade Federal de Pernambuco (UFPE), também tem formação em Direitos Humanos pelo Instituto de Direitos Humanos da Catalunha. Trabalhou no Centro de Cultura Luiz Freire - ONG de defesa dos direitos humanos - e é integrante do Terral Coletivo de Comunicação Popular, grupo que atua na formação de comunicadoras/es populares e na defesa do Direito à Comunicação.