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Crédito: MST
As 55 famílias expulsas do Acampamento Margarida Alves, no Engenho Xixaim, em Moreno, Região Metropolitana do Recife, por ordem de despejo cumprida nesta quinta-feira (19), agora brigam para serem indenizadas e amparadas. Vivendo há 16 anos na terra, de cerca de 100 hectares, as pessoas foram retiradas à força pela polícia, por ordem judicial, e tiveram casas, lavouras e sala de aula totalmente destruídas.
A ação aconteceu cinco dias após o início do Acampamento da Resistência em favor do Centro de Formação Paulo Freire, no Assentamento Normandia, em Caruaru, Agreste de Pernambuco. No início da semana, ficou acertado que não haveria envio de policiais a Normandia. O mesmo tratamento, no entanto, não foi dado no caso de Xixaim. O cenário atual é de disputa jurídica e, sobretudo, política diante do cerco que se fecha à continuidade da luta pela reforma agrária no Brasil.
A reintegração de posse em Xixaim foi expedida pela juíza Ana Carolina Avellar Diniz, da 1ª Vara Cível de Moreno. O autor da ação, que consta no processo, é Paulo de Sena Maranhão, um dos donos da terra. A polícia fechou o acampamento, com a presença do Batalhão de Choque e da Cavalaria, e determinou que as pessoas tinham uma hora para deixar o local. Algumas famílias foram para casas de parentes e as demais seguiram para outros acampamentos do Movimento dos Sem Terra (MST) nos arredores.
Segundo imagens e informações repassadas pelo MST, “os homens colocaram tudo abaixo”. O acampamento possuía casas de alvenaria, Escola de Jovens e Adultos – Campo, casa de farinha, produção de peixe, criação de animais e produção agroecológica. O clima é de revolta, indignação e tristeza. “A destruição levou junto o sonho das famílias de ter um pedaço de terra para comer e se sustentar”, diz Romildo Félix (Axé), representante do MST.
O processo já vinha se arrastando na Justiça, a decisão de reintegração de posse havia sido dada há dois anos e agora foi executada. A ação de ontem foi a 11ª ocorrência de tentativa de despejo no acampamento, de acordo com o movimento. O MST alega que o despejo aconteceu mesmo havendo uma negociação em curso para realocar as famílias para duas outras áreas, os engenhos Araújo e Covos, na Usina Bulhões, também em Moreno, na divisa com São Lourenço da Mata.
A Marco Zero Conteúdo procurou o Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra) para saber por que, apesar do longo tempo de acampamento, nunca houve um processo de assentamento. O Incra informou que chegou a haver pleito do MST pelo imóvel, mas a tentativa de aquisição parou na fase de fiscalização, quando foi constatado que a propriedade é de médio porte (cerca de 100 hectares). O instituto concentra esforços, segundo informação repassada pela assessoria de imprensa, em propriedades de grande porte.
A Ouvidoria Agrária do Incra chegou a mediar a aquisição através de crédito fundiário, que possibilita aos trabalhadores rurais sem terra ou com pouca terra, comprar e estruturar um imóvel rural por meio de financiamento. Porém, apenas um dos três proprietários da terra aceitaram a proposta e, por isso, ela não seguiu adiante. O instituto afirmou ainda à reportagem que não entrou na negociação a respeito das duas áreas em Bulhões porque a usina nunca ofertou imóveis para aquisição do Incra.
Em nota, o Governo de Estado, por meio da Secretaria de Desenvolvimento Agrário e da Secretaria de Desenvolvimento Social, Criança e Juventude, informou que vem acompanhando o conflito de Xixaim desde 2012 e que a reintegração desta semana aconteceu com intermediação da Comissão Estadual de Mediação de Conflitos e com a determinação de que não houvesse uso da violência.
“Por suas características, a área do Engenho Xixaim não se enquadra nos padrões do programa de regularização fundiária, o que impediu o Governo de Pernambuco de propor a desapropriação das terras para por fim ao conflito. Uma vez executada a reintegração de posse, o proprietário da área tomou a decisão de demolir as construções erguidas no terreno”, detalhou a nota enviada à Marco Zero Conteúdo.
As famílias do acampamento solicitaram ao governo o fornecimento de lonas e cestas básicas. O pedido, segundo o estado, “está sendo acompanhado pelas respectivas secretarias, que se comprometem em viabilizar as melhores alternativas para que essas famílias de agricultores possam ter acesso a uma área para plantar e obter renda a partir das atividades desenvolvidas no campo”.
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Vencedora do Prêmio Cristina Tavares com a cobertura do vazamento do petróleo, é jornalista profissional há 12 anos, com foco nos temas de economia, direitos humanos e questões socioambientais. Formada pela UFPE, foi trainee no Estadão, repórter no Jornal do Commercio e editora do PorAqui (startup de jornalismo hiperlocal do Porto Digital). Também foi fellowship da Thomson Reuters Foundation e bolsista do Instituto ClimaInfo. Já colaborou com Agência Pública, Le Monde Diplomatique Brasil, Gênero e Número e Trovão Mídia (podcast). Vamos conversar? raissa.ebrahim@gmail.com