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Foi vítima de racismo, violência policial ou sexual durante o carnaval? Saiba o que fazer

Arte: Thiko

Quem, no dia a dia, precisa de informações para ter os seus direitos garantidos pode enfrentar uma verdadeira peleja. No Carnaval, uma festa que mobiliza uma complexidade de serviços públicos, é ainda pior.

Todo mundo sabe que as grandes festas favorecem cenários de violações de direitos, abusos ou excessos. Quase todo mundo conhece alguém que passou por algo desse tipo e, possivelmente, não sabia onde procurar ajuda. Violência sexual, violência policial, racismo e redução de danos são assuntos que os poderes públicos não falam ou, se falam, ainda estão envoltos em muito tabu.

O que fazer, então? Reunimos informações cruciais em áreas em que ainda há pouca informação disponível e confiável para as cidadãs e cidadãos.

O que fazer se sofrer violência sexual e não encontrar informações nos serviços públicos

No caso de mulheres vítimas de violência sexual, a gravidade é
ainda maior. Segundo Paula Viana, enfermeira e integrante da ONG
Grupo Curumim, há relatos de mulheres que receberam, em delegacias,
informações erradas de como proceder para chegar ao atendimento
médico necessário. Tudo isso favorece um cenário de fragilidade da
mulher. “Em
se tratando de violência contra a mulher tem a informação geral,
com
as campanhas de
basta de violência, a
Lei Maria da Penha.
E
isso
é muito importante, já entranhou na nossa cultura, mas quando tu
vai chegando na violência sexual é super tímido. Ninguém
fala de contracepção de emergência”, explica.

A invisibilidade dos serviços especializados é outro fator. No Recife, três locais realizam o atendimento a vitimas de violência sexual e também o aborto legal resultado de estupro. Saber onde está o serviço e em que situação procurar pode determinar, inclusive, o quanto uma mulher conseguirá superar o trauma. Não é simples, mas ter informação e apoio disponível salva vidas.

Saiba que hospitais atendem em casos de violência sexual (clique para encontrar o endereço)

  • Para meninas até 10 anos: IMIP (Boa Vista)

É fundamental frisar que, em caso de estupro, a mulher não precisa realizar Boletim de Ocorrência para ser encaminhada para o atendimento de saúde. Para as profissionais, a prioridade é garantir a vida e bem estar da mulher, que deve procurar em até 72 horas após a violência um posto ou atendimento especializado. No atendimento especializado, profissionais podem orientar inclusive a ida à delegacia e órgãos de segurança.

Para Juliana Keila Jeremias, mestra em Psicologia e pesquisadora do Núcleo de Pesquisa sobre Gênero e Masculinidade (GEMA), que realizou pesquisa sobre as dificuldades de acesso aos Serviços de Aborto Legal em casos de estupro, embora os serviços existam as barreiras para as mulheres chegarem a eles são muitas. Para começar, a falta de informação é crucial para determinar que mulheres realizem procedimentos ilegais, sem apoio, e que resultem até em mortes.

“A carga moral e o preconceito também são barreiras. Muitas vezes a mulher não contra para ninguém que foi estuprada. A questão do desconhecimento da existência do direito ao aborto legal em caso de estupro, por exemplo, é enorme”, explica a pesquisadora.

Saiba o passo a passo recomendado para casos de violência sexual:

Presenciou ou sofreu violência policial?

Além de registrar a abordagem violenta da Polícia, passado o episódio é importante fazer a denúncia na Ouvidoria e Corregedoria. Os canais de atendimento funcionarão normalmente durante o carnaval (Veja na imagem).

Para o cidadão, é
importante saber seus direitos durante uma abordagem violenta, até
para se proteger de abusos e excessos. Segundo a legislação
brasileira, não existe nenhuma lei que proíba a filmagem de
policiais em locais públicos. Na Constituição Federal, “filmar e
fotografar é um direito garantido a todo cidadão brasileiro ou
residente no Brasil, em todo o território nacional (art. 5o, IV,
VIII e IX e art. 220, §2o da CF)”.

Caso um policial exija que pare de gravar, confisque celular ou câmera, ou peça cartão de memória, diga em alto e bom som que a ordem é ilegal. De acordo com experiências de coletivos ativistas, informar que você está transmitindo o vídeo ao vivo pode evitar uma escalada de violência e inibir a atitude excessiva policial.

Ainda de acordo com manual elaborado pelas organizações Artigo 19 e Advogados Ativistas, “como o policial representa um funcionário público em exercício de funções de interesse público, aplica-se o princípio da transparência e afasta-se a argumentação de defesa da honra e privacidade”. Portanto, nenhum policial tem poder para determinar que se desligue uma câmera. Uma ordem nesse sentido poderia ser considerada abuso de autoridade (art. 3o, “j” da Lei 4.898/65).

Fui vítima de racismo. Como proceder?

O racismo envolve diversas questões: cor, raça, etnia, religião ou procedência nacional. Entre alguns dos atos de racismo mais frequentes no Carnaval, estão negar ou dificultar a entrada e a circulação em estabelecimentos e espaços públicos, fazer propagandas com conteúdo discriminatório, fazer apologia ao racismo, ofender ou ridicularizar alguém e descumprir leis e políticas públicas de promoção da igualdade racial.

O racismo policial também é uma realidade a todo momento, não somente nas festas. O racismo é crime (Lei 7.716/89) e dá, no mínimo, um ano de prisão.

Como lembra o Ministério Público de Pernambuco (MPPE), às vezes a discriminação acaba sendo esquecida porque acontece junto com outros crimes, como agressão física ou lesão corporal. Na hora de fazer a queixa, certifique-se de registrar também o crime de racismo.

O processo contra quem cometeu racismo é de responsabilidade do MP, portanto não é obrigatório contratar um advogado particular. É essencial que a queixa seja registrada corretamente, para que automaticamente o caso seja encaminhada ao Ministério Público depois que a delegacia finalizar o inquérito.

Não basta o policial civil na delegacia abrir um Termo Circunstanciado de Ocorrência (TCO). Insista que o crime deve ser investigado através de inquérito. Por meio do promotor de Justiça, o MP deve tomar as providências necessárias para abrir o processo criminal, que você pode acompanhar pela internet (www.tjpe.jus.br).

Dicas de redução de danos

Neste Carnaval, serão distribuídos 5 mil kits gratuitos de redução de danos pelas ladeiras de Olinda, através do trabalho de 30 agentes voluntários parceiros da Escola Livre de Redução de Danos do Recife, responsável pela proposta, como parte da #Ação Fique Suave no Carnaval – Se for usar drogas, reduza os danos.

Os kits contarão com soro, canudos, camisinhas, tatuagens corporais da RD, água, protetor solar, pirulito, cartão com tabela sobre a mistura de drogas, sedas e piteiras.

A iniciativa também conta com a Casa Fique Suave, com um quintal de
acesso gratuito para acolhimento e descanso e uma área exclusiva de day
use, somente para pagantes. O endereço é a Ladeira da Misericórdia, 155.

Selecionamos algumas dicas da escola e também do projeto “Dichavando a Redução de Danos” (@dichavandoard). Confira:

Mas afinal, o que significa Redução de Danos (RD)?

É um conjunto de estratégias e práticas individuais e coletivas, com o objetivo de reduzir os danos associados ao uso de drogas psicoativas (lícitas e ilícitas) para pessoas que não querem ou não podem parar de usar drogas. As intervenções são baseadas no compromisso com a autonomia dos cidadãos, a saúde pública e os direitos humanos, tendo em perspectiva o acolhimento e a autonomia de escolha das pessoas em contraponto a políticas e práticas punitivistas.

AUTORES
Foto Débora Britto
Débora Britto

Mulher negra e jornalista antirracista. Formada pela Universidade Federal de Pernambuco (UFPE), também tem formação em Direitos Humanos pelo Instituto de Direitos Humanos da Catalunha. Trabalhou no Centro de Cultura Luiz Freire - ONG de defesa dos direitos humanos - e é integrante do Terral Coletivo de Comunicação Popular, grupo que atua na formação de comunicadoras/es populares e na defesa do Direito à Comunicação.

Foto Raíssa Ebrahim
Raíssa Ebrahim

Vencedora do Prêmio Cristina Tavares com a cobertura do vazamento do petróleo, é jornalista profissional há 12 anos, com foco nos temas de economia, direitos humanos e questões socioambientais. Formada pela UFPE, foi trainee no Estadão, repórter no Jornal do Commercio e editora do PorAqui (startup de jornalismo hiperlocal do Porto Digital). Também foi fellowship da Thomson Reuters Foundation e bolsista do Instituto ClimaInfo. Já colaborou com Agência Pública, Le Monde Diplomatique Brasil, Gênero e Número e Trovão Mídia (podcast). Vamos conversar? raissa.ebrahim@gmail.com