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“Se pegar a votação de Geraldo e a minha, por eu ter ficado mais no campo de esquerda, é uma votação maior do que a de Priscila e de Daniel. Só que a minha votação junto com a de Daniel e a de Priscila, não foi uma disputa ideológica, foi uma disputa contra o governo de Geraldo, que é péssimo. Com essa reflexão, eu acredito que vamos ganhar a eleição”. João Paulo, edição de domingo do Jornal do Commercio.
Numa eleição em segundo turno, atrair a atenção e o voto dos eleitores dos candidatos que ficaram para trás na primeira etapa da disputa pode fazer a diferença na contagem final das urnas, especialmente quando se está em desvantagem nas pesquisas iniciais de intenção de voto.
O petista João Paulo sabe disso e tem tentado conquistar a simpatia do eleitorado de Daniel Coelho (PSDB) e Priscila Krause (DEM) com o discurso de que, acima das questões partidárias, o que une as três candidaturas é a oposição ao prefeito Geraldo Julio (PSB). Para vingar, a estratégia exige um processo de desideologização da campanha.
OTruco Eleições 2016– projeto defact-checkingda Agência Pública em parceira com a Marco Zero Conteúdo – analisou os discursos formulados por Daniel e Priscila no primeiro turno das eleições municipais para checar a veracidade da declaração de João Paulo e concluiu que o candidato petista tem distorcido e omitido aspectos centrais dos posicionamentos políticos recentes de seus adversários. Por isso ele recebe a carta “Não é bem assim”.
Se é verdade que Daniel e Priscila focaram suas campanhas em duras críticas à gestão de Geraldo Julio (condizentes com a postura oposicionista dele na Assembléia Legislativa e Câmara dos Deputados e dela na Câmara de Vereadores e na Assembléia), é também verdade que os dois associaram a atual administração do PSB aos 12 anos do PT no poder, lembrando que os dois partidos passaram a maior parte do tempo unidos no mesmo projeto político à frente da Prefeitura do Recife.
Daniel atacou recorrentemente o que chamou de “política mofada”. Aquela, segundo o tucano, praticada durante 16 anos por PT e PSB na administração municipal.
Em vídeo postado no Facebook oficial de Daniel, no dia 12 de setembro, o candidato era taxativo: “Há 16 anos eles se juntam (PT e PSB) e se separam, e dividem a Prefeitura para ficar no poder. João Paulo governou com o apoio do PSB e juntos entregaram a cidade a João da Costa (PT). Eles estão brigando agora, mas o atual vice de Geraldo (Luciano Siqueira, do PCdoB) foi vice nos oito anos de João Paulo. É a velha política mofada dos acordos para ganhar a eleição. Se você olhar a cidade depois desses 16 anos, fica fácil perceber que quem está apanhando nesta briga é o povo. O que o recifense precisa entender é que não somos obrigados a escolher nenhum deles. A gente não precisa continuar do jeito que está com o PSB, nem voltar para trás com o PT, que teve o apoio de um presidente que não está mais no poder.”
No dia 14 de setembro, Daniel voltou a criticar psebistas e petistas. “Há 16 anos que o Recife é administrado pelos mesmos grupos. O vice de um era o vice do outro, o que era secretário de um, hoje é vice do segundo (Silvio Costa Filho, PRB, é o candidato a vice-prefeito de João Paulo e foi secretário estadual de Turismo no governo Eduardo Campos, PSB). A briga dos dois é para ver quem foi pior. O Recife quer solução. E a solução a gente vai construir com novas ideias, com novas propostas. Vamos acabar com as panelinhas. Ninguém muda mantendo as mesmas pessoas”.
Priscila seguiu a mesma linha em sua campanha. Em vídeo postado no dia 25 de setembro, ela apontava a relação de proximidade entre PT e PSB. “O Recife está há 16 anos nas mãos do mesmo grupo: João Paulo que passou para João da Costa, que governou com um vice do PSB (Milton Coelho), que elegeu Geraldo, que tem um vice que foi de João Paulo. O fato é que a cidade evoluiu menos do que podia. A gente precisa ter coragem para encarar os desafios e fazer diferente. Dê uma chance ao compromisso, à seriedade e à coerência”.
Terminado o primeiro turno das eleições, PSDB e DEM anunciaram formalmente o apoio à candidatura do prefeito Geraldo Julio na disputa do segundo turno contra João Paulo. É bom lembrar que os dois partidos fizeram parte do governo psebista, ocupando cargos na gestão municipal até decidirem apostar nas candidaturas de Daniel Coelho e Priscila Krause, respectivamente. Fato que os dois candidatos omitiram durante seus programas eleitorais em rádio e TV e também nas suas redes sociais.
Embora PSDB e DEM tenham construído uma proximidade recente com o PSB a partir do rompimento do ex-governador Eduardo Campos com o PT (os três apoiaram o impeachment da ex-presidenta Dilma e participaram da gestão estadual do socialista Paulo Câmara), a verdade é que Daniel e Priscila sempre tiveram uma postura oposicionista ao PSB e ao PT na capital e no estado.
Tão logo PSDB e DEM anunciaram o apoio a Geraldo, neste segundo turno, Daniel e Priscila informaram aos seus eleitores que não subiriam no palanque de nenhum dos dois candidatos na disputa recifense do segundo turno, reiterando as críticas que fizeram na campanha, inclusive ao PT, bem longe portanto da disputa “não ideológica” que João Paulo agora tenta sugerir ao eleitorado.
Em nota, após o primeiro turno, Daniel voltou a criticar psebistas e petistas, mas deixou seus eleitores à vontade para escolher o candidato no segundo turno: “Fizemos ao longo desta campanha duras críticas aos projetos do PSB e do PT, que muito se parecem. Entendemos que o inchaço do Estado com a ocupação de cargos comissionados e secretarias, que hoje traz graves consequências para a cidade, é uma ação conjunta dos 16 anos desses dois partidos no poder e essa mensagem foi muito bem compreendida pelas pessoas” .
Priscila Krause admitiu a proximidade política entre DEM e PSB no cenário nacional, mas decidiu não participar do palanque de Geraldo, apesar do apoio formal dos demistas: “Ficou decidido por uma questão de coerência ao posicionamento nacional do partido em todo esse processo que aconteceu (impeachment de Dilma com apoio do DEM e PSB). Até por exclusão, inclusive, nós vamos dar essa orientação de apoio ao PSB, agora, acreditando que o eleitor é absolutamente livre. Mas o partido é uma instituição que precisa ter posicionamento”.
Em nota oficial, depois do apoio tucano e demista ao PSB no segundo turno, o PT chamou de contradição essa nova aliança, considerando o fato de os candidatos dos dois partidos “terem feito severas críticas à atual gestão do Recife”, já numa sinalização clara de que os petistas querem o apoio dos eleitores de Daniel e Priscila. O que a nota omite é a postura de oposição dos dois ao PT e a João Paulo, tão severa quanto foi a posição contra Geraldo Julio. Se há a “contradição” apontada pela nota petista no apoio a Geraldo tampouco sugerir uma proximidade política entre os discursos de Daniel e Priscila com a candidatura petista parece aceitável.
Co-autor do livro e da série de TV Vulneráveis e dos documentários Bora Ocupar e Território Suape, foi editor de política do Diário de Pernambuco, assessor de comunicação do Ministério da Saúde e secretário-adjunto de imprensa da Presidência da República