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Manifestação “Fora Bolsonaro” no Recife acontece em clima de paz

Marco Zero Conteúdo / 19/06/2021
Ato 19J no Recife

A manifestação “Fora Bolsonaro, Vacina no Braço e Comida no Prato” começou e terminou em paz em Recife. Os policiais dos Batalhões de Choque e da Radiopatrulha, que foram responsáveis pelo ataque ao protesto de 29 maio, ficaram em seus respectivos quartéis, pois nem foram escalados para atuar na segurança do evento.

O horário marcado para o início da concentração, às 9h, foi ignorado por muita gente que, às 7h, já estava na praça do Derby. Um grupo de, pelo menos, 12 advogados e advogadas voluntários, integrantes de várias organizações sociais, também chegaram cedo para acompanhar o ato e prestar assistência jurídica em caso de violência ou abuso policial. Desde cedo, dezenas de militantes cuidaram da distribuição de álcool gel 70º e máscaras PFF2 para quem usava máscara de pano.

Ainda na concentração, personagens inéditos nesse tipo de manifestação atraíram a atenção de fotógrafos, cinegrafistas e repórteres: oito homens e mulheres vestindo coletes laranjas com a sinalização de “Agentes de Conciliação” procuraram os organizadores do evento e trocaram número de contato com a equipe de segurança e os assessores jurídicos da manifestação.

Enviados pela secretaria estadual de Defesa Social (SDS-PE), os agentes informaram que iriam seguir com a manifestação até o final para atuar como elo com o comando da Polícia Militar. Coordenando a equipe estava o ouvidor da SDS, Jost Paulo Reis e Silva. Ele contou que sua presença e dos mediadores foi definida na mesa de diálogo entre a organização do ato e as várias secretarias estaduais. “A intenção, inclusive, é estar presente em todas as manifestações a partir de agora”.

Eram 10h10, quando três grandes filas indianas começaram a se formar na avenida Agamenon Magalhães e andaram até a avenida Governador Carlos de Lima Cavalcanti, a via entre a Agamenon e a rua Dom Bosco normalmente confundida como “início da Conde da Boa Vista”. Como já havia acontecido no 29 de maio, dezenas de bandeiras brasileiras se misturaram à predominante cor vermelha.

As primeiras viaturas policiais só apareceram na esquina da rua da Soledade. Todos os policiais, integrantes dos batalhões de Trânsito e do policiamento de rua, usavam a tarjeta de identificação e não portavam armas ostensivamente.

19J no Recife

Bandeiras, faixas e até pequenos cartazes de papel expressavam repulsa ao Governo Federal. Crédito: Arnaldo Sete

A dor de uma mãe na avenida

Não foi só a tradicional militância que foi às ruas do Recife protestar contra Bolsonaro. Entre as filas indianas, uma família vestindo camisas pretas com a foto de uma mulher e a inscrição “por Ísis” emocionou os manifestantes.

Eram os parentes da advogada Maria Ísis, que morreu de covid-19 há duas semanas, aos 57 anos, sem ter tido a oportunidade de ser vacinada. A filha da advogada, Tatiana, estava ao lado da avó Eulália. Aos 90 anos, ela se manteve firme debaixo de chuva até o final do ato segurando um banner com a frase “Se ele não tivesse rejeitado a vacina, minha filha não teria falecido”.

Eulália de 90 anos participa de 19J no Recife

Aos 90 anos, Eulália seguiu até o fim para honrar memória da filha vítima da covid-19. Crédito: Laércio Portela/MZ

Às 11h, já sem chuva e com o sol que chegou a iludir ao arriscar-se entre as nuvens, os primeiros manifestantes chegaram à fatídica ponte Duarte Coelho, onde o trabalhador autônomo Daniel Campelo da Silva foi atingido por uma bala de borracha que lhe custou um globo ocular. Nessa altura, os manifestantes se espalharam pelas ruas da Aurora, do Sol e pela ponte Princesa Isabel para fazer um “abraço” à região da cidade que foi cenário dos ataques da PM.

O abraço, clímax do protesto, acabou acontecendo debaixo de muita chuva, que não bastou para dispersar os manifestantes. A multidão começou a se dispersar pelas ruas do centro perto do meio-dia, sem contratempos ou qualquer problema com a polícia.

Partidos e movimentos juntos

Na ponte Duarte Coelho, um grupo de jovens com bandeiras da Juventude do PSB que participaram de todo o protesto tentavam não parecerem deslocados entre os demais militantes. Um deles era Tyago Bianchi, presidente da Juventude Socialista Brasileira.

Ele contou que, em nenhum momento, ele e seus companheiros sentiram qualquer tipo de hostilidade por parte da militância dos outros partidos de esquerda ou dos movimentos sociais. “Fomos acolhidos por todos e todas. Nós viemos para mostrar que estamos a favor da democracia, da vacina e de que a população tenha o mínimo para viver. E que estamos contra esse governo genocida formado por uma patota que vai contra tudo aquilo que a gente acredita”.

A poucos metros dos socialistas, a vereadora Dani Portela (PSOL) celebrou a dimensão do ato e comentou sobre seu significado. “É muito simbólico que o ato tenha acabado com o abraço às duas pontes onde trabalhadores foram mutilados e que rosas tenham sido distribuídas para dizer que não precisamos de uma polícia militarizada. Não dá para esperar porque 2022 começa agora”.

19J no Recife

Manifestação juntou dezenas de partidos políticos e movimentos sociais. Crédito: Arnaldo Sete

O deputado estadual João Paulo (PT) afirmou que ir às ruas contra o governo Bolsonaro “é uma atitude de patriotismo. É preciso se indignar diante de um governo que quer dar restos de comida para o povo”.

Para Davi Lira, dirigente nacional do Movimento de Luta nos Bairros, Vilas e Favelas (MLB) e do partido Unidade Popular, o protesto também foi uma forma de homenagear Daniel Campelo e Jonas de França, feridos no olho pelos tiros do Batalhão de Choque. “Estar aqui é uma forma de estar junto das famílias desses trabalhadores que foram vítimas de uma polícia que só sabe perseguir os pobres”.

Atingido nas pernas por quatro disparos com balas de borracha no ato de 29 de maio, o advogado do Movimento dos Trabalhadores Sem Teto (MTST) em Pernambuco, Roberto Rocha Leandro, estava aliviado quando a ponte Duarte Coelho esvaziou. “Foi um grande avanço em relação ao 29 de maio. Com muito mais gente, apesar da chuva, não houve registro de nenhum intercorrência nem confronto com a polícia. O 19J foi pacífico e organizado. O recuo da PM se deu pela repercussão negativa depois da violência do 29M. Em vez de Batalhão de Choque, o Estado escalou agentes de conciliação”.

Ato 19J no Recife

Crédito: Arnaldo Sete

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