Ajude a MZ com um PIX de qualquer valor para a MZ: chave CNPJ 28.660.021/0001-52
Palco principal de resistência dos movimentos sociais no Recife, a praça do Derby vai ser ocupada neste sábado (27) pelas mulheres do Coletivo Marcha das Vadias. “Feminismo é Revolução” é o mote desta sétima marcha contra o feminicídio, o racismo e a retirada de direitos das trabalhadoras e dos trabalhadores com as propostas de reformas Trabalhista e da Previdência.
“As mulheres são especialmente perseguidas. Os números são alarmantes em relação à violência contra a mulher e nós precisamos atrair a atenção para essa temática para que ela seja debatida amplamente pela sociedade e os órgãos responsáveis . É preciso criar políticas públicas específicas para combater essa realidade”, explica Hanna Barbosa, integrante do Coletivo Marcha das Vadias.
Feminicídio
Entre 1980 e 2013, 106.093 brasileiras foram assassinadas. Somente em 2013 foram registrados 4.762 assassinatos de mulheres no país, o que dá uma média de 13 homicídios por dia. E a pior notícia é que o número de vítimas cresceu 21% na década de 2003 a 2013.
Com uma taxa de 4,8 assassinatos em 100 mil mulheres, o Brasil está entre os países com maior índice de homicídios femininos: ocupa a quinta posição em um ranking de 83 nações, segundo dados do Mapa da Violência 2015 (Cebela/Flacso).
O que é feminicídio?
“Trata-se de um crime de ódio. O conceito surgiu na década de 1970 com o fim de reconhecer e dar visibilidade à discriminação, opressão, desigualdade e violência sistemática contra as mulheres, que, em sua forma mais aguda, culmina na morte. Essa forma de assassinato não constitui um evento isolado e nem repentino ou inesperado; ao contrário, faz parte de um processo contínuo de violências, cujas raízes misóginas caracterizam o uso de violência extrema. Inclui uma vasta gama de abusos, desde verbais, físicos e sexuais, como o estupro, e diversas formas de mutilação e de barbárie.”
Eleonora Menicucci, ex-ministra chefe da Secretaria de Políticas para as Mulheres da Presidência
Para saber mais sobre o tema acesse o Dossiê das Violências Contra as Mulheres
Racismo e gênero
O Mapa da Violência 2015 também mostra que as principais vítimas da violência de gênero são as mulheres negras. A taxa de assassinatos de mulheres negras aumentou 54% em dez anos, passando de 1.864, em 2003, para 2.875, em 2013. No mesmo período, o número de homicídios de mulheres brancas caiu 9,8%, de 1.747, em 2003, para 1.576, em 2013.
Dados da Central de Atendimento à Mulher – Ligue 180 relativos ao ano de 2013 apontam que 59,4% dos registros de violência doméstica feitos por meio do serviço de teleatendimento referem-se a mulheres negras.
“O racismo é um fenômeno ideológico que se manifesta de distintas formas e que preconiza a hierarquização dos grupos, atribuindo a alguns deles valores e significados sociais negativos que servem de justificativa para seu tratamento desigual. Concretamente, nossas sociedades foram estruturadas a partir da definição de lugares sociais para mulheres e para a população negra que não passam pelos espaços de poder e cidadania plena.”
Ana Carolina Querino, Coordenadora de Direitos Econômicos do ONU Mulheres Brasil e Cone Sul
Redução de direitos
A Marcha das Vadias também vai às ruas do Recife contra a escalada de redução de direitos trabalhistas e previdênciarios promovida pelo governo Temer. Aprovada pela Câmara dos Deputados e tramitando agora no Senado, a reforma Trabalhista tem como eixo central a prevalência dos acordos coletivos negociados entre trabalhadores e patrões sobre a CLT. Será possível por exemplo negociar jornadas de trabalho acima de 12 horas. O período de férias poderá ser fatiado em até três vezes.
A mudança na Constituição vai enfraquecer a posição dos sindicatos, que poderão ser substituídos nas negociações com os patrões por comitês de trabalhadores dentro das empresas, com mais chances de sofrerem pressão e interferência direta dos empregadores. Mais uma vez as mulheres devem pagar a conta mais alta nesse processo porque elas já são de fato as principais vítimas do preconceito no mundo do trabalho.
No Brasil, as mulheres recebem em média 76% do salário dos homens. Em 2015, os homens possuíam salário médio de R$ 2.012,00, enquanto que as mulheres recebiam R$ 1.522,00, segundo dados divulgados pelo IBGE. A desigualdade de gênero também pode ser percebida quando o assunto é cargos de chefia. Em 2015, só 4,7% das mulheres ocupavam esses cargos em relação ao total de trabalhadores empregados em contraposição a 6,1% de homens. Pior: elas recebiam em média apenas 68% do salário dos homens na mesma posição.
A reforma da Previdência também vai atingir em cheio os direitos das mulheres. A idade mínima de aposentadoria, que era de 60 anos para elas, passa para 62 anos. A contribuição por tempo mínimo sobe de 15 anos para 25 anos. Especialistas em trabalho têm avaliado que a proposta vai prejudicar as mulheres de baixa renda, que têm mais dificuldade em conseguir um emprego de carteira assinada e sofrem mais com a tripla jornada.
A Marcha
Durante a concentração, que terá início às 13h, na Praça do Derby, haverá confecção de cartazes e programação artística. O ato vem sendo preparado ao longo dos últimos três meses com vários debates abertos ao público, organizados pelo coletivo. Debates estes que trataram de temas de relevância social como a realidade das mulheres em situação de encarceramento, o racismo e os privilégios da branquitude, o transfeminismo e também a prostituição.
“Faço um convite para todas as mulheres, cis e trans participarem da Marcha das Vadias. Faça chuva ou faça sol estaremos lá, na praça do Derby, unidas e fortalecidas, contra o governo golpista que está aí instaurado, contra a invisibilidade da mulher nos espaços políticos e de poder. É muito importante a presença das mulheres na rua neste momento de avanço do conservadorismo para que possamos combater toda forma de machismo que sofremos diariamente”, convoca Hanna Barbosa.
Ela e Carmen Silva, doutora em Sociologia e integrante da ong SOS Corpo, participaram do Programa Fora da Curva, na Rádio Universitária FM, na quinta-feira (25), para debater o tema: Por que uma Marcha das Vadias?
“Nesse momento em que o Ocupa Brasília foi reprimido com tanta violência é muito importante que todas nós nos somemos à Marcha das Vadias nas ruas. Primeiro porque a resistência nas ruas é a forma que nós, dos movimentos sociais, estamos encontrando para expressar nossa indignação e nossa vontade de mudar esse país. Segundo, porque esse golpe está liberando uma onda de ódio contra as mulheres, os LGBTs, a juventude negra de periferia. Um ódio que precisa ser enfrentado nas ruas”, avaliou Carmen.
Trazer estas questões à tona e convocar as mulheres às ruas para lutar pelos seus direitos e contra o sexismo é apenas uma parte do trabalho que o Coletivo Marcha das Vadias-Recife vem desempenhando nos últimos anos. O coletivo está engajado a lutas de vários outros movimentos sociais ligados às causas feministas, antiproibicionistas, das trabalhadoras e dos trabalhadores e do direito à cidade.
Sobre o Coletivo
Formado em 2014, o Coletivo Marcha das Vadias-Recife é um movimento feminista autônomo, auto-organizado, horizontal e apartidário com perspectiva anti-sistêmica, anti-capitalista,antisexista, anti-racista e antiproibicionista.
O que, quando e onde
7ª Marcha das Vadias –Recife. 27/05, concentração às 13h, na Praça do Derby. Para qualquer dúvida sobre o ato entrar em contato pelo e-mail: vadiasrecife@gmail.com. Também pelo facebook: @MarchaDasVadiasRecife
Co-autor do livro e da série de TV Vulneráveis e dos documentários Bora Ocupar e Território Suape, foi editor de política do Diário de Pernambuco, assessor de comunicação do Ministério da Saúde e secretário-adjunto de imprensa da Presidência da República