Fotos: Nattasha Pollyane

por Nattasha Pollyane

Desde julho deste ano, a vista panorâmica nos morros do bairro de Caixa D’água, em Olinda, está diferente. Entre as pequenas casas multicoloridas há vazios cobertos de resto de entulhos. Nas redondezas desses escombros, entre ruelas e escadarias, sobrevivem as famílias que, atingidas pela chuva de 24 de julho, viram suas casas serem arrastadas pelos deslizamentos de barreiras ou, dias depois, serem demolidas pelas equipes da Defesa Civil.

Quatro meses após a tragédia, a Marco Zero foi procurar essas famílias para saber como estão vivendo depois de tantas perdas.

O acesso à parte mais alta do morro de Caixa D’água é difícil. A avenida Leopoldino Canudo é a principal via de acesso. Às suas margens, as barreiras estão cobertas com pedaços de lonas pretas, que, segundo os moradores, foram colocadas no período da chuva.

Nesse trecho do bairro vivia dona Nadir. Desempregada, ela conta como perdeu sua casa própria, na rua Astral: “Eu morava em cima da barreira, mas com as chuvas, a barreira caiu e atingiu o muro da casa de baixo. No outro dia, um engenheiro da prefeitura de Olinda veio e mandou demolir a minha casa. Não me deram auxílio, nem respostas, até agora ”. Quatro meses após perder sua casa, o seu sustento se resume aos bicos que consegue. Agora, morando perto do seu antigo terreno, ela paga R$ 300 de aluguel, valor que é dividido com sua filha, que mora com ela.

Nadir ressalta que sempre estava em contato com a prefeitura, em especial com o próprio secretário de Desenvolvimento Social, Cidadania e Direitos Humanos de Olinda, Odin Neves, que sempre prometia ajuda, além de manter contato também com a assistente social da prefeitura, que ela conhece apenas pelo primeiro nome, Cibele. No dia 17 de outubro, entretanto, os contatos foram interrompidos depois de uma mensagem enviada via Whatsapp para o secretário, que chegou a ser visualizada, mas jamais foi respondida.

Valdinete Dornelas, mais conhecida como Tia Netinha, também perdeu a casa. No seu terreno ainda restam entulhos que não foram retirados pela Defesa Civil. “Eles chegaram aqui no dia 13 de agosto com uma ordem judicial de demolição. E já foram destruindo tudo. Sorte que minha mãe já tinha tirado todos os móveis de dentro, mas ela enlouqueceu quando viu tudo que tinha conseguido ao longo da vida no chão”, recorda, indignada, Michele Dornelas, filha de Valdinete.

Dona Valdinete, a Tia Netinha, perdeu tudo o que tinha

Michele ainda mora no mesmo terreno de onde sua mãe teve de sair, porém um pouco mais afastada da barreira. “Eu tenho medo porque ainda existe sujeira e os ratos podem fazer ninho no meio dos entulhos. Eles (a prefeitura) não limparam e nós não temos dinheiro pra mandar ninguém limpar.”

Tia Netinha é uma das poucas pessoas que recebem o auxílio-moradia da prefeitura, no valor de R$ 130 por mês. “O laudo para a liberação desse auxílio, que é uma forma de ajuda para as pessoas que perderam as casas, é dado pela Defesa Civil, que constata o risco da moradia. Caso o risco seja avaliado nos níveis mais graves (3 ou 4), a entrada da pessoa no cadastro que dá direito ao auxílio é efetuada, com os documentos do responsável. A definição do valor é feita pelo Governo Federal junto ao município”, explica o secretário de Desenvolvimento Social, Cidadania e Direitos Humanos de Olinda, Odin Neves.

As marcas da tragédia em Caixa D’água

Sem casa e sem resposta

Ainda em Olinda, no bairro Alto São Nascente, Lucio Cláudio perdeu tudo nas chuvas de 24 de julho, que ele garante ter sido um dos piores dias em sua vida. “Nós estávamos dormindo, quando a parede do vizinho caiu no nosso quarto, acordamos assustados e saímos correndo, fomos para uma casa de familiares perto daqui. Graças a deus, ou melhor, ao nosso guarda-roupa, a parede não caiu em cima da gente.”

Durante a entrevista, Lucio se dispôs a ligar para Defesa Civil, que, segundo ele, não tinha resolvido nada sobre o auxílio-moradia. Após esperar até o telefone ser atendido, ele pediu para falar com a assistente social Cibele. Cinco minutos depois, informaram que ela não estava de plantão, então Lucio explicou o porquê da sua ligação: “Eu perdi a minha casa nas chuvas, tento falar com vocês quase toda semana e não tenho respostas. E aí? Quando iremos ter respostas?”, indagou, impaciente e irritado com a falta de suporte e respostas da Defesa Civil olindense.

“Estou vivendo há quatro meses na casa do meu enteado, porque ele não está por aqui. Mas quando ele voltar para Olinda, vai querer morar na casa dele. Graças a deus tenho um trabalho e minha mulher está fazendo uns bicos. Se não fosse isso, nem sei como iríamos viver, mas isso não dá o direito deles nos deixar ao léu, sem respostas. Porque toda vez que ligo é a mesma coisa: falam que, quando tiverem um resposta, irão retornar nossas ligações, mas quando vai ser isso?” Lúcio dá por encerrada a entrevista com um olhar cansado.

O secretário Odin Neves explicou que “a prefeitura está viabilizando, junto à Caixa Econômica Federal, um projeto do programa Minha Casa Minha Vida para as pessoas atingidas pelas chuvas no município. O projeto irá cobrir aproximadamente 70% dos custos de cada imóvel. Esses apartamentos serão construídos e entregues no bairro de Aguazinha. E os moradores sem casa estão concorrendo a 432 residências”. De acordo com Neves, a previsão é que a obra saia em 2020. Ele detalhou que os outros 30% do valor de cada imóvel serão pagos pelos moradores.