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por Tiago Paraíba*
Após 24 edições do Big Brother Brasil, é a primeira vez que um homem negro retinto ganha o reality. As mídias demonstram que, nos últimos anos, a questão racial tem sido um dos principais elementos no enredo desse programa. Porém fica a pergunta: o racismo lá exposto está servindo a reflexão ou ao entretenimento?
Durante os últimos meses vimos eclodir na internet (mesmo que de forma não consciente) um importante debate que, no cotidiano, é jogado para debaixo do tapete: o “mito do homem negro como mau cidadão”.
O mito do negro como mau cidadão é uma ideia preconceituosa e baseada em estereótipos raciais. A percepção equivocada do negro como mau cidadão também se baseia em estereótipos construídos ao longo da história, como o de que pessoas negras são primitivas, perigosas ou violentas. Esses estereótipos contribuem para a marginalização e discriminação da população negra e, principalmente, do homem negro.
Davi, um jovem negro de Salvador, sofreu todos os tipos de violências corriqueiras mas que, em rede nacional, contribuíram para que se tornassem um grande “gatilho”.
Por um lado, há quem tentou justificar e transformar o próprio Davi em grande culpado pelas violências que sofreu, o que é a maneira mais eficaz de desqualificar a vítima de violência.
Do outro, quem defendeu a leitura que o Davi apenas não baixou a cabeça para o privilégio da branquitude e colocou o dedo na ferida, expondo desta forma que a questão não era sua personalidade e, sim, que no Brasil não se tolera a possibilidade de um jovem negro ter a ousadia de ter opinião de se afirmar enquanto sujeito. Neste sentido, chega a ser redundante dizer que as violências que o Davi sofreu são fruto do racismo que, sistematicamente, criminaliza a existência da juventude negra no Brasil.
O BBB24 foi como uma lâmina exposta a uma lupa, onde fica cada vez mais nítido que a formação social brasileira tem a desigualdade fundamentada na questão racial.
Mas e a PEC 45, o que tem a ver com isso?
No mesmo dia que o Davi ganhou o BBB24, alimentado o sonho que é possível um jovem negro vencer, no Senado Federal foi aprova a proposta de emenda constitucional 45/2023, que criminaliza porte ou posse de qualquer quantidade de drogas e mantém na opinião do policial e do juiz o critério de determinar quem é consumidor ou traficante, ao invés da lei estabelecer a diferenciação. Um grande retrocesso na política de drogas que qualifica qualquer usuário negro e periférico ao status de traficante.
É importante reafirma que a política da guerra às drogas, tem como centralidade a criminalização da juventude negra e periférica, servindo como justificativa para o extermínio e encarceramento da população negra.
O Atlas da Violência anualmente demostra que o assassinato de homens e mulheres negras lidera os rankings de homicídio no Brasil. Entre 2011 e 2021, pelo menos 445.527 mil pessoas negras foram assassinadas, quase meio milhão em uma década. Se compararmos estes números com a guerra perpetrada pelo EUA contra o Afeganistão que, até abril de 2021, resultou em aproximadamente 174.000 mortes, podemos concluir que no Brasil existe uma guerra declarada contra a população negra e a politica de guerras as drogas é a grande cortina de fumaça moral que a justifica.
Essa política vem ao mesmo tempo que a privatização dos presídios está em pauta no Brasil. Essa PEC é uma ótima ferramenta para impulsionar o avanço do encarceramento em massa e garantir o lucro com a prisão da juventude negra.
Por fim, Davi ganhou sua faculdade e o BBB. Estou feliz por ele e lhe desejo tudo de bom. Mas é importante ressaltar que hoje também a vida de milhares de jovens negros está em jogo com a PEC 45 aprovada no Senado. Temos que derrotar esse retrocesso na Câmara!
#NãoaPEC45
*Militante da Ação Negra e tesoureiro nacional do PSOL
É um coletivo de jornalismo investigativo que aposta em matérias aprofundadas, independentes e de interesse público.