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O pleno do Tribunal Regional Federal da 5ª Região – TRF5 decidiu, por unanimidade, na manhã desta terça-feira (19), a suspensão de liminar que desde maio havia paralisado o processo de retirada de pessoas não indígenas do território demarcado do Povo Pankararu, no Sertão pernambucano. O desembargador Leonardo Coutinho, relator do caso, emitiu parecer favorável e foi acompanhado pelos outros dois juízes. “Se, por um lado, a retirada de um número elevado de famílias – em uma área em que se evidencia tensão social entre os grupos há mais de 20 anos – requer que as medidas executórias sejam planejadas, evitando, ao máximo, que a descoordenação dos entes envolvidos cause conflitos, não se pode admitir o descumprimento de uma ordem judicial perdure por excessivo período. Neste sentido, diante do esgotamento das medidas tendentes a viabilizar a saída dos ocupantes de forma dialogada, cabe, de fato, a retomada do plano de desocupação da terra indígena”, argumentou o magistrado sobre a decisão da Quarta Turma do TRF-5.
Segundo ele, os argumentos alegados pelos autores do agravo de instrumento não são suficientes para manter o impedimento. De acordo com levantamento da FUNAI, das 346 famílias não indígenas na área Pankararu, 259 ali não moram no local e possem em cidades próximas e utilizariam as terras “apenas como local de lazer em feriados e finais de semana”.
Em vigília na capital desde o dia anterior, o Povo Pankararu comemorou a vitória da luta pela terra sagrada que se estende há cerca de 25 anos apenas na Justiça. Após a decisão, os pankararu dançaram o toré em frente ao Tribunal como celebração e entoaram cantos de agradecimento aos encantados, que guiam a espiritualidade indígena. “Foi uma vitória, mas a gente já tinha consciência que não tinha possibilidade de ter outro desfecho. Não sabemos nem como foi que coube essa primeira decisão, mas no final tudo aconteceu bem”, comentou Sarapó Pankararu, liderança à frente da mobilização indígena.
Os posseiros que vivem no território terão, a partir de agora, 90 dias para a chamada desintrusão, ou seja, a saída da terra com garantias de indenização de benfeitorias realizadas (casas construídas, etc) e reassentamento das famílias. A retirada será observada pela Polícia Federal, Polícia Militar e acompanhada pela FUNAI e INCRA, este último responsável pelo cadastramento e reassentamento em terreno de 18.500 ha.
Alguns posseiros também vieram ao Recife acompanhar o julgamento e protestaram contra a decisão do pleno. Eles afirmam que houve uma “injustiça” e vão “tomar todas as medidas para reverter isso”.
Os posseiros reclamam que as indenizações são insuficientes e o terreno destinado pelo INCRA ao reassentamento não é adequado para o plantio. Parte das famílias vive de agricultura. “Não invadimos terras indígenas, pelo contrário, colocaram uma aldeia em cima da gente. Mas estamos lutando para sair para outra terra no município de Jatobá, receber indenização justa e para todos”, diz Eraldo Souza, liderança do Sindicato dos Trabalhadores Rurais, que afirma que há pessoas que não receberam indenizações. Segundo ele, são 302 famílias de não indígenas no território.
Além disso, uma reivindicação é de que o terreno fosse no município de Jatobá, mas o INCRA alega que não há territórios disponíveis. O território Pankararu fica localizado nos municípios de Tacaratu, Petrolândia e Jabotá. “Nós pedimos que essa ação desastrosa fosse suspensa para que pudéssemos discutir com órgãos prazo para que as terras fossem distribuídas e as casas construídas”, afirmou.
Do outro lado, no entanto, os Pankararu afirmam que a decisão para saída dos posseiros foi conquistada há 15 anos e desde então os não indígenas colocam impedimentos à execução da ordem.
De acordo a procuradora federal Priscila Lima, representante do INCRA e FUNAI, legalmente ainda existem dispositivos para os posseiros recorrerem da decisão, mas acredita que instâncias superiores não devem acolher. “O diálogo com os indígenas tem sido sempre pacífico, eles têm aguardado a desocupação voluntaria dos posseiros. Mas há sempre uma criação de óbice pelos posseiros para que eles não saiam da área indígena. É provável que esses recursos sejam considerados inviáveis porque a maior parte do processo é a discussão de fatos e o que eles questionam não são questões cabíveis nos tribunais superiores. Não temos como garantir, mas a técnica mostra que é provável que isso aconteça”, explica a procuradora.
Ao todo, o INCRA cadastrou como aptas para reassentamento 153 famílias hoje e disponibilizou 95 vagas para famílias iniciarem a desintrusão e mudança. Segundo Lima, os trabalhos do INCRA, FUNAI e demais órgãos envolvidos no processo de desintrusão deve ser retomado nos próximos dias, após rearticulação no território.
Mulher negra e jornalista antirracista. Formada pela Universidade Federal de Pernambuco (UFPE), também tem formação em Direitos Humanos pelo Instituto de Direitos Humanos da Catalunha. Trabalhou no Centro de Cultura Luiz Freire - ONG de defesa dos direitos humanos - e é integrante do Terral Coletivo de Comunicação Popular, grupo que atua na formação de comunicadoras/es populares e na defesa do Direito à Comunicação.