Apoie o jornalismo independente de Pernambuco

Ajude a MZ com um PIX de qualquer valor para a MZ: chave CNPJ 28.660.021/0001-52

Um ano após status de Região Metropolitana, Goiana segue sem integração

Helena Dias / 11/01/2019

Há exatamente um ano, Goiana deixou de ser Zona da Mata e foi incorporada à Região Metropolitana do Recife (RMR), por meio de emenda à Lei Complementar Nº 382 que regulamenta a região sob os parâmetros federais do Estatuto da Metrópole. Completando o primeiro aniversário, a mudança não trouxe benefícios efetivos aos goianenses que continuam sem entender em quais aspectos a decisão interfere no cotidiano da cidade, já que o Terminal Integrado de Goiana é apenas uma promessa de melhoria para a mobilidade dos moradores.

À época da aprovação da emenda na Assembleia Legislativa de Pernambuco (Alepe), em dezembro de 2017, a alteração foi alvo de críticas de parte dos parlamentares por não ser uma decisão tomada com a participação popular. Originalmente, a inserção do município na RMR não fazia parte do projeto de lei proposto pelo Poder Executivo. Esta alteração foi apresentada pelo deputado estadual Ricardo Costa (PP), por meio da Emenda Modificativa nº1/2017 e incorporada à lei com algumas modificações.

A medida foi sancionada pelo governador Paulo Câmara (PSB) e publicada no Diário Oficial do estado no dia 10 de janeiro do ano passado e, desde então, Goiana e todos os municípios da região fazem parte do Conselho de Desenvolvimento Metropolitano responsável pelo Plano de Desenvolvimento Urbano Integrado (PDUI) e pelas decisões que envolvem os sistemas de trânsito, transporte e viário da RMR. Conselho este que também foi alvo de questionamentos na votação do Legislativo, por conta do peso diferenciado dos municípios nas votações internas que se baseia na quantidade de habitantes de cada cidade.

Sendo assim, o voto do prefeito de Goiana – cidade com a população estimada em 79.455 habitantes em 2018, segundo dados do IBGE – tem peso 2 nas decisões do conselho, enquanto as representações da Prefeitura do Recife e do Governo do Estado têm peso 17 e 40, respectivamente. Caso o governo e a prefeitura da capital juntem forças, os votos dos outros municípios, que somam peso 38,  não têm efeito algum na votação do conselho.

Os incentivos fiscais oferecidos a empresas que se instalam em Goiana também sofreram alterações. Ao integrar a RMR, Goiana passou a ter menos descontos no pagamento do Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS) nos programas Prodepe e Proind. Quando ainda fazia parte da Zona da Mata, o município tinha 85% de desconto e, desde a mudança, tem 75%. A redução não afeta diretamente a Fábrica Jeep instalada há três anos no município, isto porque a empresa usufrui do Programa de Desenvolvimento do Setor Automotivo do Estado de Pernambuco (PRODEAUTO), que prevê desconto de 95%.

Terminal Integrado

Apesar destas alterações serem pontos relevantes, a população tem como principal referência da inclusão de Goiana na Região Metropolitana do Recife a promessa de implantação do terminal integrado que ligaria o município às outras cidades da RMR. Pela legislação, Goiana deve ser inserida no sistema de transporte integrado gerido pelo consórcio Grande Recife, mas até agora não houve ações concretas para a efetivação dessa integração.

Logo após a sanção da Lei Complementar Nº 382, o Grande Recife declarou que realizaria estudos para entender as demandas de transporte específicas de Goiana, mas a promessa de melhoria na mobilidade local está fazendo seu primeiro aniversário sem sair do papel. Os moradores do município continuam a pagar R$11,90 para ir e voltar do Recife pelo sistema rodoviário que realiza viagens de meia em meia hora, sendo a última viagem às 18h. Quem estiver no Recife e quiser voltar a Goiana após este horário, só tem ônibus a partir das 5h.

É esse o caso da técnica em enfermagem e universitária, Janine Thaís Alves, que não pode voltar para casa ao fim do plantão em um hospital recifense. Janine mora no centro de Goiana, mas só consegue ir e voltar para Recife quando as aulas na universidade estão acontecendo e usufrui do transporte particular pelo qual paga uma mensalidade de R$ 210,00. Fora este valor, ela continua pagando as passagens rodoviárias. “Eu moro aqui em Goiana e trabalho em Recife e a questão do transporte é muito ruim. Se é para ser Região Metropolitana, deveria ter transporte até as 22h, no mínimo. Estou ficando este mês de janeiro todo em Recife, porque não tenho aula e largo às 19h. Fico dormindo na casa de conhecidos.”

O estudante de direito, Diego Mesquita, relata os mesmos problemas e faz uso do mesmo transporte particular. Atualmente, estagia em Goiana, mas quando procurava estágio no Recife afirma que as empresas não se colocavam à disposição de custear sua passagem rodoviária. “É muito ruim ter que regular o horário de acordo com os ônibus. Se estou no Recife, tenho que resolver tudo antes das 18h. Estudo à noite e largo da universidade por volta das 21h30, tenho que pegar o transporte que pago ou volto de carona mesmo. Tenho muitos amigos que foram morar no Recife, dividir apartamento, por causa disso.”

Diego contou que há dois anos a Prefeitura de Goiana não disponibiliza o ônibus público que transportava os estudantes de nível técnico e universitários que estudam em Recife sem custo algum. E acrescentou que, antes da ausência do serviço, os usuários passaram um período pagando um valor entre R$85,0 e R$75,0.

Mobilidade social

Diante deste contexto, a engenheira e professora da UFAL, Jessica Helena Lima, fez um alerta durante entrevista à Marco Zero Conteúdo. “Na engenharia de transportes, a acessibilidade costuma ser entendida como a facilidade de acessar oportunidades (de trabalho, estudo, compras, serviços como bancos, órgãos públicos). Esta definição difere um pouco do que o senso comum entende como acessibilidade, mas existe desde 1960. A falta de acessibilidade pode acarretar em exclusão de determinadas partes da população. No caso de Goiana, como não existem ônibus para estudantes e universitários essa situação pode privá-los de ascender através dos estudos. Ou seja, limita a sua mobilidade social.”, explica. Jéssica é pernambucana e doutoranda em Engenharia Civil – Transportes e Infraestruturas Urbanas na UFPE.

Também há um ano, as informações divulgadas eram de que a Empresa Pernambucana de Transporte Intermunicipais (EPTI) cederia as estruturas da rodoviária local para que o consórcio responsável pela RMR instalasse o terminal integrado. Os goianenses teriam uma linha de transporte que faria o percurso Goiana-Igarassu e Igarassu-Recife, custando a tarifa do anel B de R$4,40.

Em nota, sem muitos detalhes, o consórcio Grande Recife afirmou que a implantação do terminal de Goiana continua em fase de estudos:

O Grande Recife informa que um estudo preliminar identificou algumas particularidades no transporte de passageiros e nos usuários que fazem o trajeto Goiana/Recife. São pontos que vão desde a mudança no tipo de veículo que deve ser utilizado neste percurso ou a adequação dos BRTs já existentes e a elaboração de uma infraestrutura necessária para a integração dos passageiros, por exemplo. O Consórcio tem se debruçado sobre todas estas nuances para buscar uma alternativa viável e que atenda à demanda dos usuários de Goiana. Por conta disso, ainda não há um prazo para a conclusão destes trabalhos.

A reportagem da Marco Zero Conteúdo entrou em contato com a Prefeitura de Goiana, mas não obteve retorno até a conclusão desta reportagem.

Sobre a lei

A justificativa dada pelo deputado estadual Ricardo Costa (PP), na Emenda Modificativa nº 1/2017, que também propunha a inserção de Escada e Vitória de Santo Antão na RMR era de que os municípios atendem aos requisitos característicos da região, como consta no próprio texto:

I- Evidência ou tendência de conturbação;

II- Necessidade de organização, planejamento e execução de funções públicas ou
interesses comuns de duração contínua;

III- Existência de integração funcional socioeconômica, socioambiental e de
serviços.

A argumentação foi embasada na densidade demográfica dos municípios e no Produto Interno Bruto (PIB) . Dos três, Goiana tem o maior PIB com a cifra de R$ 3,8 bilhões segundo o IBGE/2015. A emenda passou por modificações que resultaram na inclusão apenas de Goiana na RMR.

Os outros municípios que fazem parte da região são: Recife, Camaragibe, Jaboatão dos Guararapes, Ilha de Itamaracá, Abreu e Lima, Igarassu, Moreno, São Lourenço da Mata, Olinda, Araçoiaba, Paulista, Ipojuca, Itapissuma e Cabo de Santo Agostinho.

AUTOR
Foto Helena Dias
Helena Dias

Jornalista atenta e forte. Repórter que gosta muito de gente e de ouvir histórias. Formou-se pela Unicap em 2016, estagiou nas editorias de política do jornal impresso Folha de Pernambuco e no portal Pernambuco.com do Diario. Atua como freelancer e faz parte da reportagem da Marco Zero há quase dois anos. Contato: helenadiaas@gmail.com

TAGS goiana RMR