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O coronel Robson Santos da Silva. Imagem: YouTube/Reprodução
O coronel Robson Santos da Silva vai começar nos próximos dias a trabalhar na Fundação Joaquim Nabuco (Fundaj). Especialista em ensino à distância, ele ocupava até segunda-feira (12) o cargo de assessor especial do ministro da Educação, o colombiano Ricardo Vélez Rodríguez. O militar foi nomeado diretor de Formação Profissional e Inovação da Fundaj no mesmo dia em que outros seis comissionados do alto escalão foram exonerados dentro da disputa de influências no Ministério da Educação.
A nomeação deixou apreensivos os funcionários do órgão. A diretoria e a presidência da Fundaj continuam a não ter um único profissional de carreira – e apenas um servidor público, o diretor de pesquisas sociais, Carlos Osório. Há quem veja na chegada do militar um novo front no que os bolsonaristas chamam de guerra cultural: fazer um revisionismo histórico da ditadura militar, mudando a leitura de golpe para a de uma revolução, e impedir a divulgação de certos temas. A Fundaj seria o palco perfeito para isso, já que oferece cursos, promove eventos e tem uma editora própria. Com experiência em ensino à distância, o coronel poderia ampliar esse alcance.
Há também outra leitura da chegada do coronel Robson Santos da Silva: o começo da retirada dos comissionados indicados por Mendonça Filho (DEM), ministro da Educação no governo Temer. Sem citar o que exatamente seria, o Ministério da Educação voltou na segunda-feira a citar a “Lava Jato na Educação”, que, se investigar o governo Temer, poderia atingir a gestão do ex-ministro. Nos bastidores, o que se comenta é que a ex-presidente interina Ivete Lacerda, hoje Diretora de Planejamento e Administração, pode ser a próxima do grupo ligado a Mendonça Filho a ser afastada da Fundaj.
A diretoria que o coronel vai ocupar é estratégica. Foi criada em 2016 por Luiz Otávio Cavalcanti e ganhou bastante autonomia dentro da Fundaj, sendo considerada por muitos até como um núcleo à parte. Ocupa hoje boa parte do prédio do Derby, local historicamente ligado à área cultural. A maioria dos funcionários é de comissionados, com poucos funcionários de carreira. A diretoria engloba cursos de curta duração, cursos mais voltados para o mercado, a escola de governo da Fundaj e também os cursos de especialização e mestrado, alguns voltados para a formação de professores.
O primeiro diretor da Formação Profissional e Inovação da Fundação Joaquim Nabuco foi Felipe Oriá, que depois ficaria mais conhecido por usar o aplicativo de paquera Tinder para fazer campanha para deputado federal pelo PPS (apesar da ousadia, teve pouco menos de 12 mil votos). À frente da diretoria, Oriá e seu braço direito Vinícius Werneck promoveram ações para dar visibilidade à gestão, com parcerias com prefeituras do interior e criação de prêmios.
Em alguns meses, o salário de diretor no valor de R$ 13.623,39 (DAS 101.5) era abastecido por gratificações, já que Oriá e Vinícius se colocavam também como instrutores dos cursos que a própria diretoria oferecia.
Oriá deixou o cargo para se candidatar. Vinícius assumiu a vaga e saiu no ano passado, na época em que o Tribunal de Contas da União e a Controladoria Geral da União fizeram uma auditoria na Fundaj. Tiago Diniz, também ligado a Mendonça Filho, assumiu no segundo semestre de 2018. Foi uma gestão curta, interrompida abruptamente. Funcionários que trabalhavam na diretoria só ficaram sabendo da exoneração pelo Diário Oficial.
Em conversas em reserva, funcionários da Fundaj dizem que antes da chegada de Alfredo Bertini à presidência da Fundação, o que se comentava nos corredores era que um militar poderia assumir o cargo. A Fundaj não é território desconhecido para o coronel Robson Santos da Silva. Em pelo menos duas ocasiões neste ano, como assessor especial do ministro, ele veio ao Recife para reuniões com a diretoria do órgão.
Já Bertini é tido como um presidente frágil, que nunca ficou muito tempo em um cargo público. Teria se aproximado do guru bolsonarista Olavo de Carvalho – a quem chama de “mestre” – durante a celeuma para exibição de um documentário sobre ele no festival Cine PE, que comanda há mais de 20 anos. Também participou de encontros com a equipe de Paulo Guedes em Brasília durante a transição Temer-Bolsonaro. Foi indicado por Vélez, com aval de Olavo.
Nas últimas semanas, o Ministério da Educação ganhou as manchetes com as disputas entre os vários grupos que o compõem: alunos de Olavo, militares, técnicos e ex-alunos de Vélez. O vexame da carta às escolas pedindo a gravação do hino nacional foi a gota d’água para uma reestruturação. O ‘viés ideológico’ dos olavetes (como Olavo se refere a seus discípulos) foi posto em xeque e gerou uma série de troca de farpas entre os grupos. No fim de semana, Vélez e Bolsonaro se reuniram. Na segunda-feira, seis assessores do alto escalão tiveram suas exonerações publicadas no Diário Oficial – entre eles, Tiago Diniz, substituído na mesma publicação pelo coronel.
Houve baixas de vários lados. Para cessar as críticas do seu guru, Bolsonaro pediu a demissão do coronel Ricardo Wagner Roquetti, que era diretor de programa da secretaria-executiva. Ele foi acusado por Olavo de perseguir e boicotar seus ex-alunos no ministério. Outro exonerado, Silvio Grimaldo, que ocupava o cargo de assessor especial e é ex-aluno de Olavo, publicou nas redes sociais que ofereceram a ele, e não foi aceito, um cargo na Capes para “enxugar gelo e fazer guerra cultural”.
Ao contrário dos seus antecessores na diretoria de Formação Profissional e Inovação da Fundaj, o coronel Robson Santos da Silva tem um currículo lattes extenso. Possui quatro graduações (pedagogia, licenciatura plena em matemática e em português e bacharelado em ciências militares pela Aman), oito especializações e dois mestrados. Atualmente é doutorando em Engenharia e Gestão do Conhecimento pela Universidade Federal de Santa Catariana. Foi também diretor da Associação Brasileira de Ensino à Distância e publicou quatro livros sobre o tema. Com esse currículo, funcionários da Fundaj acham difícil que ele venha “enxugar gelo”. Já guerra cultural…
A Marco Zero solicitou um comentário do presidente da Fundaj Alfredo Bertini sobre a nomeação do coronel Robson Santos da Silva. A assessoria de comunicação da Fundaj disse que ele não iria se pronunciar sobre o assunto. A Marco Zero também questionou o Ministério da Educação sobre a mudança na Fundaj. Não obteve resposta até a publicação desta matéria. Também tentamos contato com o coronel pelas assessorias da Fundaj e da editora Novatec, que publica seus livros, sem sucesso.
Em (confusa) nota divulgada na segunda-feira, o MEC afirmou que “As movimentações de pessoal e de reorganização administrativa, levadas a efeito nos últimos dias, em nada representam arrefecimento no propósito de combater toda e qualquer forma de corrupção. Ademais, envolveram cargos e funções de confiança, de livre provimento e exoneração.”
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