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Crédito: Débora Britto
por Débora Britto e Raíssa Ebrahim
Recepcionado por uma multidão no pátio do Carmo, centro do Recife, o ex-presidente Lula (PT) fez um discurso de agradecimento, esperança e cobrança das elites e de quem o prendeu sem provas por 580 dias. Em 20 minutos de fala sem novidades, reforçou os três discursos anteriores que deu desde que saiu da carceragem em Curitiba, quando falou em Curitiba, São Bernardo do Campo e Salvador.
Além de não ter mencionado o desastre ambiental do vazamento de petróleo no Nordeste nem a violência política na América Latina, Lula não incorporou em seu discurso conteúdos programáticos, novas estratégias ou articulações que podem estar sendo construídas pela esquerda nesse momento.
De toda forma, o clima do primeiro Festival Lula Livre com a presença do líder petista foi de renovação e contou com dezenas de apresentações musicais, caravanas vindas de outras cidades e presença de diversos movimentos sociais.
Lula disse que está vendo o país, o emprego, a cultura, a ciência e tecnologia e a esperança, sobretudo dos jovens, serem destruídas. “Em nome de quê?”, provocou.
“Eu não precisava estar preso, eu poderia ter ido para uma embaixada, para outro pais. Eu escolhi ir para a Polícia Federal porque eu tinha que desmascarar Moro, Dallagnol e Bolsonaro”, disse Lula. “Eu não quero privilégio, eu quero que eles julguem meu processo, eu quero que eles arrumem provas para dizer quem é que formou quadrilha nesse país. Não quero favor de ninguém”, afirmou Lula.
Como sempre, também aproveitou para relembrar sua origem humilde de pai e mãe que morreram analfabetos, “eles me deram uma coisa que a elite não aprendeu na universidade, ter caráter. Quero que a elite brasileira saiba que nós não queremos mais ser tratados como cidadãos de segunda categoria”, alfinetou. A essa altura do discurso, Lula atiçou o orgulho dos pernambucanos, citando Garanhuns e Pernambuco, “terra de lutadores” onde, lembrou ele, aconteceram a Confederação do Equador 1824 e a Revolução Pernambucana de 1817.
Com a presença de Fernando Haddad (PT) e ao lado de sua namorada, a socióloga Rosângela da Silva “Janja”, Lula exaltou o ex-ministro da educação e ex-candidato e também brincou sobre “ser tímido” e “ter vergonha” enquanto a multidão gritava “beija, beija”. O petista aproveitou para dizer novamente que é “um homem com experiência de 74 anos, energia de 30 e tesão de 20”, frase que rendeu memes e postagens nas redes sociais na semana passada. Em seguida, elogiou um pernambucano, seu ex-ministro da Ciência e Tecnologia, Sérgio Rezende, “o melhor do Brasil”.
Lula subiu ao palco recepcionado por Lia de Itamaracá e, de mãos dadas com o patrimônio vivo de Pernambuco, começou o discurso. Dois nordestinos reconhecidos pela contribuição à sociedade com títulos de doutor honoris causa por universidades federais.
Ao exaltar o Nordeste e a resistência dos nordestinos, Lula disse “nós não queremos tirar nada de nenhum estado, queremos igualdade de condições. Eu provei em oito anos do meu governo que é possível o nordestino sorrir, estudar e se vestir. É possível o nordestino trocar o jegue por uma motocicleta sem deixar o jegue morrer de fome.”
“Agora a campanha Lula Livre tem que se transformar numa campanha muito maior porque o que nós queremos é a anulação da safadeza dos processos contra nós”, disse ao final. “Na democracia, o show não para”, finalizou, abrindo novamente o palco para as apresentações musicais.
Nas ruas, becos e vielas mal cheirosas do centro do Recife, desde cedo grupos de pessoas com o mote #lulalivre e a imagem do ex-presidente nas camisas vermelhas se dirigiam para o pátio do Carmo, onde um palco recebia diversos artistas enquanto crescia a expectativa pela chegada do senhor de 74 anos recém liberto.
Desde cedo já havia uma multidão. Ao entardecer, era praticamente impossível chegar próximo ao palco.
Famílias inteiras comendo espetinho, gente bebendo cerveja, abraçando amigos e conhecidos. A sensação era que, para todas aquelas pessoas, a esperança e autoestima retornaram.
Esperança e convicção também estavam presentes na fala e na kombi de Seu Dida, estilizada em seus mínimos detalhes , que veio do município de Itabaiana, em Sergipe – a 521 quilômetros do pátio do Carmo – para acompanhar o festival. Por sinal, viagem não é novidade para ele, que foi a Curitiba várias vezes enquanto o ex-presidente esteve preso. “Todo dia é uma luta. Mas acredito que o desmanche do país já está sendo visto por algumas pessoas que votaram em Bolsonaro. Agora, temos que pensar na união, pensar no país, como Lula pensa”, conta.
O previsto seria Lula subir ao palco às 17h20min, mas isso só aconteceu alguns minutos antes das 19h. No entanto, nem a demora desanimou o público presente.
Para Fátima Silva, que veio de Camaragibe e chegou antes das 10h, a felicidade era tanta que não dava para estar em casa no dia de hoje. “É um sentimento de gratidão muito grande, Lula aqui fortalece quem estava fragilizado”, conta com um sorriso no rosto.
Um grupo de jovens estudantes do Cabo de Santo Agostinho, na região metropolitana do Recife, saiu cedo de ônibus para chegar ao festival. Avisaram que só iriam embora depois de ver o presidente, mesmo sem garantia de conseguir o transporte de volta para casa.
Como eles, de Jardim Paulista, outro grupo trouxe cooler para aguentar a maratona debaixo de sol. ”Faltam palavras, eu estou emocionada de estar aqui. Mesmo que ele não saia candidato, com certa vai influenciar as eleições para retomar esse país”, afirma Luíza Dornelas, filiada ao PT desde a década de 90.
Além da liberdade de Lula, o festival lembrou ao longo do dia de símbolos de luta e resistência, como Marielle Franco, mestre Moa, assassinado em um bar por um apoiador de Bolsonaro, e a cantora Preta Ferreira. Também não passaram despercebidas manifestações contra o encarceramento em massa da população negra e contra a censura na arte e educação
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