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Lançado com pompa e circunstância pelo governador Paulo Câmara (PSB) em solenidade no Palácio do Campo das Princesas, em 11 de março de 2015, na presença de autoridades locais e da então ministra Teresa Campelo (Desenvolvimento Social), o Comitê Estadual de Convivência com a Estiagem está próximo de completar dois anos de existência sem nunca ter realizado uma reunião.
A situação é ainda mais grave quando consideramos que Pernambuco entra em 2017 no sexto ano da mais intensa e extensa seca das últimas décadas. Nada menos do que 125 municípios, do total de 184, decretaram estado de emergência. Os reservatórios estão secos. As obras das adutoras que poderiam minimizar os danos da estiagem nas regiões mais atingidas, atrasadas.
Falta água para a agricultura e o cuidado com os animais. O abastecimento para o consumo humano é precário em vastas áreas do semiárido pernambucano – e nordestino -, especialmente no Agreste.
Dados divulgados pela Compesa (empresa estadual de saneamento) dão conta de que a seca está afetando a vida de 1,1 milhão de pernambucanos. Pelo menos 300 mil pessoas são abastecidas apenas por meio de carros-pipa. Em comunidades rurais mais afastadas, a água potável está sendo garantida pela ação do Exército. Nas áreas urbanas, ela é um produto raro e caro.
Compromisso ficou no papel
A assinatura do decreto 41.535 pelo governador Paulo Câmara, há dois anos, gerou uma expectativa positiva dos movimentos sociais. Criado em 2012 pelo então governador Eduardo Campos (PSB), o Comitê de Convivência com a Estiagem passava agora a ter caráter permanente e a incluir na sua formação representantes de entidades da sociedade civil.
Soou como o reconhecimento pelo Governo do Estado da situação gravíssima vivida com a seca em Pernambuco e da necessidade de levar em conta a experiência de organizações civis que atuam há décadas no apoio técnico, jurídico e político aos trabalhadores rurais e às populações mais vulneráveis do Agreste e do Sertão.
Mas o que parecia uma iniciativa louvável para ampliar o diálogo com entidades que vivem o dia a dia das populações mais afetadas pela longa estiagem e que, portanto, poderiam contribuir de forma mais efetiva para a formulação e avaliação das políticas públicas, na verdade ficou apenas na promessa. O Comitê, na prática, inexiste. Em 22 meses, nunca se reuniu.
É o que garantem os representantes da sociedade civil ouvidos pela Marco Zero Conteúdo e que têm assento no Comitê.
Sem participação social
Coordenador do Centro Sabiá e da ASA-Pernambuco (Articulação no Semiárido), o biólogo Alexandre Pires diz que a postura do Governo compromete a qualidade e a transparência das políticas públicas para a região. “Estamos falando de entidades que atuam há décadas com o público-alvo das políticas de convivência com a estiagem. Quando o Estado não nos chama para o diálogo há um prejuízo de natureza política muito grave. Ele não assegura o direito de participação social”.
A ASA é uma rede que congrega organizações civis das mais diversas naturezas (sindicatos, associações, cooperativas de trabalhadores, ONGs) num trabalho permanente de incentivo e apoio a práticas de desenvolvimento sustentável e convivência com o semiárido. Neste último caso, as ações estão pautadas na cultura do estoque de água, alimentos, sementes e animais. E nos preceitos da agroecologia; economia popular e solidária; educação contextualizada; e segurança alimentar e nutricional.
A ASA está organizada nos dez estados que compõem o semiárido brasileiro (MG, BA, SE, AL, PB, PE, RN, CE, PI e MA). Em Pernambuco, são 18 organizações – entre cooperativas de trabalhadores, movimentos sociais, sindicatos e entidades ligadas à Igreja Católica – atuando em todos os municípios do semiárido do estado.
Alexandre relata que esteve com o secretário de Agricultura e Reforma Agrária de Pernambuco, Nilton Mota, no último dia 20 de dezembro e cobrou dele a convocação da primeira reunião do Comitê de Convivência com a Estiagem. Cabe à Secretaria a coordenação do grupo, segundo decreto assinado por Paulo Câmara.
Nilton, que é deputado estadual licenciado em primeiro mandato pelo PSB, teria dito que convocaria os integrantes do comitê para a reunião na semana seguinte. Um mês se passou e nada do encontro.
Menos fiscalização, mais desvios
Para Alexandre, a falta de espaço de fiscalização da sociedade civil só vai reforçar os desvios históricos dos recursos aplicados para minimizar os efeitos da seca no Nordeste. “Por décadas, enfrentamos no semiárido a destinação de recursos públicos para atender interesses econômicos de agentes políticos da região, alimentando a indústria da seca. Sem participação social, eles estão omitindo da sociedade para onde estão sendo destinados esses recursos”.
O biólogo faz um alerta para a falta de transparência. “O Estado tem a prerrogativa de aplicar as verbas, tem os estudos e as análises, sabemos disso. Mas a política e os critérios têm que ser claros e discutidos com a sociedade. Sabemos que na maior parte das vezes os recursos atendem a interesses político-eleitorais ao invés de serem dirigidos em benefício da população”.
Símbolo de luta, Fetape não é ouvida
Fundada há 54 anos e símbolo da luta no campo, a Fetape (Federação dos Trabalhadores Rurais de Pernambuco), também tem assento no Comitê de Convivência com a Estiagem. O seu presidente, Doriel Barros, confirma as declarações de Alexandre Pires.
Nos últimos dois anos, a Federação nunca foi convidada para participar de qualquer reunião ou encontro do Comitê, seja para receber informações oficiais seja para debater as ações do Governo.
“Não tenho informação se o comitê tem se reunido só com representantes do governo. Se isso está acontecendo, não estão nos convidando. Não temos sido convidados nos últimos anos. Isso demonstra a falta de organização e de respeito do Governo do Estado. A sociedade civil quer e pode contribuir com as políticas de convivência com a estiagem, mas, se não somos chamados, não se abre o espaço para o diálogo. Isso é muito ruim”, critica Doriel.
As queixas da Fetape vão para além do funcionamento do Comitê. Doriel afirma que o Governo sequer tem convidado a Federação para eventos que envolvem ações que impactam diretamente na vida dos trabalhadores rurais de Pernambuco.
Cita solenidade recente realizada no Palácio para anúncio de regularização fundiária e crédito fundiário. Segundo ele, nem a Fetape nem o MST, as duas entidades mais atuantes nestas áreas, foram chamadas a participar. Segundo soube nos bastidores, houve uma orientação política para que as entidades não fossem convocadas.
Ele classifica a postura do Governo de “absurda”. Explica que a Fetape é quem presta assessoria direta a 99% dos assentamentos beneficiados pelo crédito fundiário em Pernambuco e que “não poderia – nem deveria –“ ser ignorada pelas autoridades do Estado.
Em Pernambuco, a Fetape é considerada um símbolo da luta contra a ditadura militar e a opressão no campo e em favor da reforma agrária. A Federação foi durante décadas uma importante aliada do ex-governador Miguel Arraes, liderança máxima do PSB, partido que comanda o Governo do Estado desde 2007 e ao qual pertence o atual governador Paulo Câmara. Mas a relação esfriou nos últimos tempos.
“Nem Jarbas agiu assim”
“Eduardo (o ex-governador Eduardo Campos – PSB) sempre nos convidou para participar dos eventos do Governo. A Fetape tem mais de 50 anos de trajetória de luta no meio rural. Mas Paulo Câmara nunca recebeu a Fetape, nunca se reuniu com a Fetape. Fizemos várias solicitações em dois anos para que nos recebesse. E, até agora, nada”, alega o presidente da Federação dos Trabalhadores Rurais de Pernambuco.
“Isso só demonstra a falta de compromisso com os trabalhadores rurais. Nem Jarbas (atual senador pelo PMDB, que governou Pernambuco entre 1999 e 2006 numa aliança com o DEM) agiu assim quando foi governador. Nem Jarbas. Essa postura é muito grave. É a participação popular que garante que os benefícios do Estado cheguem de verdade para as famílias dos trabalhadores rurais”, argumenta Doriel.
Presente em 179 dos 184 municípios de Pernambuco, a Federação representa, pelos cálculos de seu presidente, em torno de 1,2 milhão de trabalhadores rurais.
Em outubro de 2016, a Fetape ocupou parte das dependências da Secretaria de Agricultura e Reforma Agrária por dois dias. Entre as várias exigências negociadas com o Governo para a saída dos agricultores do prédio, firmou-se o compromisso de que o Comitê de Convivência da Estiagem seria convocado em seguida. Passados três meses, nada.
Doriel é crítico em relação às iniciativas do Governo do Estado no enfrentamento à longa estiagem. “A atuação é muito tímida. Não tem capacidade de alcançar os agricultores. O que está salvando o abastecimento em muitas comunidades são os carros-pipa disponibilizados pelo Exército. Sem eles as comunidades estariam desassistidas”.
“Estamos vivendo um momento muito difícil. E quando precisamos de mais diálogo, de um diálogo permanente para termos mais força para enfrentarmos essa situação tão difícil para os trabalhadores e para as trabalhadoras, é justamente quando as portas se fecham”.
Discurso valorizava participação social
Em matéria publicada no site do Governo de Pernambuco em 10 de março de 2015, um dia antes do lançamento do Comitê de Convivência com a Estiagem no Palácio, a ênfase estava na intensidade dos trabalhos do novo fórum e seu caráter de dar transparência aos dados da gestão: “As reuniões serão mensais e sempre que necessário. Seus membros acompanharão o panorama climático, com o detalhamento do monitoramento da seca, prognósticos de chuva e evolução do volume dos reservatórios”.
O texto que anunciava a instalação do comitê trazia declaração do governador, preocupado com a diminuição das chuvas e a redução do nível de armazenamento de água no semiárido. Um problema que, segundo Paulo Câmara dizia à época, precisava ser enfrentado. “A instalação do comitê reforça a nossa necessidade de reavivar o debate sobre o tema avaliando as iniciativas já realizadas, as que estão em execução e as novas propostas; de modo que haja um planejamento integrado e efetivo das ações do Governo do Estado”.
No texto publicado no site do Governo de Pernambuco, o recém-empossado secretário de Agricultura e Reforma Agrária, Nilton Mota, lembrava que comitê semelhante havia sido formado em 2012 pelo então governador Eduardo Campos, tendo produzido ações que minimizaram o impacto da seca.
Ele enaltecia a integração da sociedade civil no Comitê que se formava agora com a gestão Paulo Câmara: “Foram muitas as ações realizadas a partir da articulação desse comitê (no governo Eduardo). Desta vez, vamos avançar mais, já que ampliamos, inclusive, a representação da sociedade civil, incluindo nesse fórum, conselhos e associações que são fundamentais para nos ajudar a enfrentar essa realidade posta”.
Governo não desmente entidades
Passados quase dois anos do discurso do secretário e diante das críticas levantadas pela sociedade civil, a reportagem da Marco Zero Conteúdo fez contato com a assessoria de imprensa da Secretaria de Agricultura e Reforma Agrária pedindo esclarecimentos e respostas. A assessoria solicitou que o pedido fosse formalizado por meio de email, o que foi feito no final da manhã da terça-feira (24). Enviamos cinco perguntas:
Por que, apesar de criado com caráter permanente há quase dois anos, o Comitê nunca se reuniu com a participação dos integrantes da sociedade civil? Foi divulgado no lançamento do Comitê que se realizariam reuniões mensais.
O comitê tem se reunido apenas com a presença de representantes do governo?
Os representantes da sociedade civil reclamam da falta de diálogo e transparência das ações do Governo do Estado e da Secretaria de Agricultura na implantação da política de convivência com a estiagem. Dizem que não são ouvidos sobre a formulação das políticas e a destinação de recursos. Qual a posição da Secretaria sobre essas críticas?
Há alguma política ou diretriz de repasses regulares de informações da gestão para entidades da sociedade civil? Como ela funciona? O Comitê não deveria suprir essa demanda das organizações por informação e participação efetiva na formulação das políticas de convivência com a estiagem?
Há estimativa de data para a convocação de reunião do comitê em 2017?
No início da noite da quarta-feira (25) recebemos uma nota oficial de resposta (que segue na íntegra no final deste texto). A Secretaria lista uma série de ações tocadas pelo Governo para auxiliar a população do semiárido no desenvolvimento de uma convivência produtiva com a estiagem entre “obras de engenharia de construção, recuperação e/ou ampliação de barragens, cisternas e sistemas simplificados de abastecimento de água, além da perfuração de poços”. E enumera um conjunto de outras ações que “contribuíram para fixar o homem em seu lugar de origem e melhorar a qualidade de vida no campo”.
A nota em nenhum momento desmente as declarações de representantes da sociedade civil de que o Comitê nunca se reuniu desde que foi lançado oficialmente em 2015, há 22 meses. Não apresenta documentos de convocação dos representantes ou datas e pautas tratadas em qualquer encontro. Apenas reafirma, de modo geral e só depois de listar as obras realizadas pela gestão, que o Governo tem cumprido o compromisso de dialogar com as entidades.
“Todas as ações desta gestão, sobretudo as de convivência com a estiagem, foram ou estão sendo implementadas a partir de um amplo debate com demais órgãos públicos, sociedade civil organizada, entidades de classe e movimentos sindicais e sociais. Esse diálogo ocorre em grandes atividades e constantemente nos fóruns e conselhos e/ou sempre que a gestão é demandada pelo povo e por suas entidades representativas”.
Mesmo sem responder diretamente ao questionamento da Marco Zero Conteúdo e falando de um modo geral, o texto encaminhado pela Secretaria contraria as declarações dos representantes de entidades ouvidos pela reportagem.
A novidade na nota é que a Secretaria de Agricultura e Reforma Agrária anuncia que “nova” reunião do Comitê está marcada para a quinta-feira (2) da próxima semana para “analisar a atual conjuntura da estiagem e as ações para 2017”. Uma decisão, ao que tudo indica, tomada nesta própria quarta-feira, portanto, depois do envio das perguntas, porque os representantes da sociedade civil ainda não estavam informados dessa agenda quando entrevistados pela reportagem.
Espaço minoritário
Dos 26 assentos no Comitê, 19 são de órgãos estaduais (16 secretarias, mais Procuradoria do Estado, agência de planejamento, e programa de planejamento rural sustentável – o ProRural). Participam ainda do grupo a Associação Municipalista de Pernambuco (que representa os prefeitos) e a Federação da Agricultura de Pernambuco (dos grandes empresários).
São apenas quatro as entidades representativas dos trabalhadores rurais e das comunidades mais vulneráveis às longas estiagens. Além da ASA-PE e da Fetape, completam a representação da sociedade civil o Consea-PE (Conselho Estadual de Segurança Alimentar e Nutricional) e o Conselho Rural de Desenvolvimento Sustentável, este atualmente comandado por representante do Governo do Estado.
Durante a instalação do Comitê em 2015, Paulo Câmara enfatizou o papel central do fórum na formulação e fiscalização das políticas de convivência com a seca. “O Comitê tem uma sistemática de trabalho e será monitorado por nós que vamos cobrar os trabalhos constantemente. Vamos trabalhar Pernambuco por inteiro, buscando que tenhamos realmente uma convivência para que o sofrimento que toda a estiagem traz seja melhor superado”.
Consea-PE sem respaldo
As queixas e críticas da sociedade civil expõem agora os limites impostos pelo Governo do Estado para a participação social. A presidente do Conselho Estadual de Segurança Alimentar e Nutricional (Consea-PE), Zênia Tavares, reitera o que afirmam o coordenador da ASA-PE e o presidente da Fetape. “Nunca teve reunião do Comitê. Aliás, sempre que somos convidados para algo do Governo é em cima da hora. Mas do Comitê nunca fomos chamados. Não aconteceu.”
“Claro que é muito importante a participação da sociedade civil neste Comitê. Claro que sim. Daria instrumentos e traria propostas para a ação do Governo do Estado. A estiagem interfere de forma importante na segurança alimentar da população. E muito. A participação da sociedade civil é fundamental para, junto com o Governo, buscar caminhos e soluções conjuntas. Minimizar os efeitos da estiagem”, defende Zênia.
O Consea-PE funciona numa sala no prédio do Prorural (Programa Estadual de Apoio ao Desenvolvimento Rural Sustentável), do Governo. Segundo Zênia, a estrutura é muito pequena. Para fazer uma ligação telefônica interurbana é preciso pedir autorização. O Estado também não garante transporte, combustível, nem hospedagem e alimentação para os integrantes do Conselho.
Falta de estrutura
“Não temos condições de acompanhar os programas de segurança alimentar e de convivência com a estiagem implantados pelo Governo do Estado nos municípios do interior. A falta de estrutura é muito grande. Contamos com a ajuda individual de servidores que apoiam e valorizam o nosso trabalho, mas falta apoio real do Estado. Na verdade, não é uma questão de apoio, é de obrigação do Estado”.
Vinculado à Secretaria de Agricultura e Reforma Agrária, o Consea-PE tem caráter consultivo e deliberativo e reúne em sua composição representantes de 22 entidades, sete do Governo e 15 da sociedade civil, e conta com mais de sessenta conselhos municipais vinculados. Tem a função de auxiliar o Estado na formulação de diretrizes e no monitoramento das politicas públicas de segurança alimentar e nutricional.
Segundo Zênia, o Governo precisa do aval do Consea-PE para ter aprovada a liberação de recursos do Ministério do Desenvolvimento Agrário. “Mas não temos condições reais de acompanhar na prática a aplicação dos recursos e a implementação dos projetos avalizados pelo Conselho. Não temos como acompanhar a instalação das cisternas, por exemplo. Sabemos que muita coisa foi paralisada no enfrentamento à insegurança alimentar por parte dos governos do Estado e Federal. Criam-se os conselhos, mas não temos o apoio que deveríamos ter para fiscalizar”.
Ela considera que a participação efetiva do Consea-PE e das demais entidades da sociedade civil no Comitê de Convivência com a Estiagem seria um passo importante para possibilitar o acompanhamento das políticas públicas.
“Acho que a sociedade civil está e sempre esteve pronta para conversar com o governador e com o secretário. Nunca estive com nenhum dos dois. Sinceramente não sei por que isso acontece. Não falta interesse da parte da sociedade civil. Pode ser que eles prefiram atender prioritariamente os grandes. Colocar o econômico na frente do social. Vai ver é isso. O problema é que a estiagem interfere diretamente na vida dos pequenos, na agricultura familiar”.
Zênia conta que o Estado demorou a apoiar a realização da 5ª Conferência Estadual de Segurança Alimentar e Nutricional, em 2015. “Eles só agilizaram o processo depois que ameaçamos fazer a denúncia na imprensa e dizer que a Conferência só iria sair do papel por causa da sociedade civil e do Governo Federal”, explica.
Este ano está prevista a realização da 5ª Conferência + 2, quando será analisada a efetivação das políticas traçadas há dois anos, justamente o setor (monitoramento e fiscalização) em que a falta de apoio financeiro do Governo e de espaços de diálogo mais prejudica o trabalho do Consea-PE.
Denúncias ficam sem apuração
A proximidade de entidades como a ASA-PE e a Fetape do dia a dia das comunidades mais afetadas pela estiagem traria um ganho substancial para o Governo, inclusive no que diz respeito à vigilância permanente contra o desvio de recursos, na avaliação de Alexandre Pires. Ele cita como exemplo a denúncia recorrente de que vários donos de carros-pipa têm despejado água na estrada para realizar viagens mais rápidas, rodar mais quilômetros e garantir pagamentos (com recursos públicos) maiores. Sem acesso ao Governo, as denúncias ficariam sem apuração e punição.
Segundo Alexandre, o Governo do Estado contrata organizações que compõem a ASA para fazer a gestão dos recursos do programa de cisternas no semiárido, o que significa que reconhece a capacidade técnica dessas organizações. No entanto, não abre o diálogo para a participação efetiva na definição das políticas e na aplicação geral das verbas destinadas para a convivência com a estiagem.
As cisternas (mais de 1 milhão no semiárido) têm garantido o armazenamento da pouca água das chuvas ou daquela fornecida por carros-pipa. Mas o coordenador da ASA reclama da falta de políticas mais estruturadoras. Lembra, por exemplo, da última seca de longa duração e intensidade em Pernambuco, entre 1979-83.
“Hoje corremos o risco de entrar numa situação de colapso pela falta de água, de abastecimento. E tudo isso acontece sem que o Governo do Estado abra o diálogo com a sociedade. Precisamos discutir e elaborar políticas de médio e longo prazos para que no futuro, daqui a 20 anos, não passemos pelas mesmas necessidades de hoje. O Estado sempre atua na perspectiva emergencial. Nunca de forma preventiva e estrutural”.
Íntegra da nota oficial encaminhada pela Secretaria Estadual de Agricultura e Reforma Agrária
Atravessando um período prolongado de estiagem, Pernambuco tem hoje 125 municípios em situação de emergência, sendo 56 no Sertão e 69 no Agreste, afetando um universo de 1,5 milhão de pessoas. Para minimizar os efeitos da estiagem nas comunidades rurais, o Governo de Pernambuco tem investido numa série de ações, qualificando e ampliando a infraestrutura hídrica dos municípios pernambucanos.
São medidas adotadas para auxiliar a população do semiárido com o desenvolvimento de políticas públicas de convivência produtiva com a seca. Por intermédio da Secretaria de Agricultura e Reforma Agrária, estão sendo executadas obras de engenharia de construção, recuperação e/ou ampliação de barragens, cisternas e sistemas simplificados de abastecimento de água, além da perfuração de poços.
Por se tratar de uma meta prioritária, o Estado investiu 30% de todos os seus recursos em obras hídricas, nos anos de 2015 e 2016. As ações estratégicas, visando o fortalecimento da agropecuária, são executadas muitas vezes em parceria com as prefeituras municipais e o Governo Federal, podendo contar ainda com o aporte de recursos provenientes de emendas estaduais e federais.
Além das grandes intervenções, a secretaria de Agricultura materializou um conjunto de ações que contribuíram para fixar o homem em seu lugar de origem, melhorar a qualidade de vida no campo e ajudar na convivência com a estiagem:
– Construção de 62 pequenas barragens, beneficiando mais de 9,3 mil pessoas que vivem em comunidades rurais no Agreste e Sertão pernambucano, com investimento de R$ 6,2 milhões.
– Implantação de 116 sistemas de abastecimento, com recursos da ordem de mais de R$ 48 milhões. Os sistemas abasteceram as residências de mais de 45 mil pessoas;
– Perfuração de 946 poços em parceria com as prefeituras;
– Construídas 20.968 cisternas de placas de 16 mil litros para consumo humano, com investimento no valor de R$ 60.689.988,88, beneficiando um total de 104.840 pessoas.
– Construídas 3.858 cisternas calçadão de 52 mil litros visando aumentar a capacidade produtiva das famílias da zona rural, viabilizando a criação de pequenos animais e a implantação de hortas orgânicas. Investimentos da ordem de R$ 48.820.215 milhões, beneficiando 19.290 pessoas
Outra ação relevante visando minimizar os efeitos da estiagem foi o apoio à pecuária do leite. Atualmente, a bacia leiteira de Pernambuco produz 1,4 milhão de litros/dia. Apesar da redução, o Estado já enfrentou situações mais críticas, como no ano de 2012, no pico da estiagem, quando a produção chegou a apenas 700 mil litros/ dia.
Em apoio à reestruturação da pecuária de leite, a Secretaria de Agricultura, por meio do Instituto Agronômico de Pernambuco (IPA), prestou assistência a 4.163 agricultores e um rebanho de 33.812 cabeças.
Para que os animais tivessem o alimento necessário para resistir a estiagem prolongada o Estado distribuiu, de 2014 até 2016, 19.4 milhões de raquetes de palma, concedeu a isenção do ICMS para o milho e descentralizou a venda do produto.
Outro incentivo importante foi a regulamentação da lei da agroindústria rural de pequeno porte, que reduziu em 60% os custos para implantação/regularização de laticínios, facilitando o registro junto a Agência de Defesa e Fiscalização Agropecuária de Pernambuco (Adagro), reduzindo a informalidade do setor e garantindo a comercialização dos produtos em todo o Estado.
Todas as ações desta gestão, sobretudo as de convivência com a estiagem, foram ou estão sendo implementadas a partir de um amplo debate com demais órgãos públicos, sociedade civil organizada, entidades de classe e movimentos sindicais e sociais. Esse diálogo ocorre em grandes atividades e constantemente nos fóruns e conselhos e/ou sempre que a gestão é demandado pelo povo e por suas entidades representativas.
Na próxima quinta-feira (02/02) ocorrerá nova reunião do Comitê Integrado de Convivência com a Estiagem para analisar a atual conjuntura da estiagem e as ações para 2017.
Co-autor do livro e da série de TV Vulneráveis e dos documentários Bora Ocupar e Território Suape, foi editor de política do Diário de Pernambuco, assessor de comunicação do Ministério da Saúde e secretário-adjunto de imprensa da Presidência da República