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Crédito: Bruno Morais/DAKI Semiárido Vivo
O Brasil perdeu 4.536 hectares de vegetação nativa por dia em 2021, o que significa um crescimento de 20,1% da área desmatada em comparação a 2020. A Amazônia foi o bioma que apresentou o maior desmatamento, representando 59% do total, com uma média de 1,9 hectare desmatado por minuto, o equivalente a cerca de 18 árvores por segundo. Já o estado de Pernambuco perdeu 40 hectares de vegetação por dia, o que representa quase 15 mil hectares no ano.
Todos os biomas do Brasil sofreram aumento de desmatamento entre 2020 e 2021. Em termos de área, os maiores desmatamentos ocorreram na Amazônia (126.680 hectares) e no Cerrado (83.981 hectares). O bioma que apresentou maior taxa de crescimento em relação ao ano anterior foram o Pampa, com 92% a mais, e a Caatinga, chegando a quase 89%, principalmente devido à melhorias no sistema de alertas e monitoramento.
Esses dados dados são do Relatório Anual de Desmatamento (RAD) lançado em julho de 2022 pelo projeto Mapbiomas. O levantamento mapeia as mudanças que ocorrem na vegetação e no solo brasileiro através de sistemas de detecção e satélites, além de contar com o apoio de universidades e diversas iniciativas que estudam sobre meio ambiente e tecnologia, a fim de fornecer informações sobre as causas do desmatamento no país.
“O desmatamento não é concentrado só na Amazônia, ele aumentou em todos os biomas, Amazônia, Caatinga, Cerrado, Mata Atlântica, Pantanal e Pampa, e isso realmente é muito preocupante. O que o Mapbiomas também monitorou foi um aumento da área média dos desmatamentos, isso quer dizer que os desmatamentos são maiores, o que é um bom indicativo da falta de fiscalização”, declarou Marcos Rosa, coordenador técnico do Mapbiomas.
Em 2021, a Amazônia foi o bioma que apresentou a maior área desmatada, com 977.773 hectares desflorestados. O Cerrado está em segundo lugar, com 500.537 hectares, seguido da Caatinga em terceiro lugar, com 116.260 hectares. Mesmo com a maior parte da sua área florestal desmatada, restando menos de 29% de toda sua cobertura, na Mata Atlântica foram desmatados 30.155 hectares.
Ainda que a Amazônia tenha sido o bioma de maior área desmatada em 2021, a Caatinga foi o bioma que apresentou o maior aumento no número de alertas de queimadas, com um percentual de 72% a mais em 2021 se comparado ao período anterior. De acordo com o relatório do Mapbiomas, a alta dos alertas é resultado tanto do crescimento no desmatamento como também da melhora no sistema de detecção de queimadas no bioma de florestas secas.
Para o coordenador geral do Centro de Pesquisas Ambientais do Nordeste (Cepan), Joaquim Freitas, o aumento do desmatamento na Caatinga deve ser visto como uma grande ameaça à biodiversidade. “A caatinga é o único bioma inteiramente brasileiro, e nela há um percentual enorme de espécies que só existem nesse bioma, especificamente na região da Chapada do Araripe, que é bastante atingida pelas queimadas. Por isso, o aumento do desmatamento representa uma cascata de efeitos negativos que vão desde devastação na biodiversidade direta até sofrermos no futuro com escassez hídrica e com o desencadeamento da expansão do processo de desertificação que já é conhecido nesse bioma”, declarou o coordenador.
Em todos os biomas do Brasil houve redução da área desmatada em APPs (Área de Preservação Permanente) em 2021 se comparado a 2019 e 2020. A exceção foi na Caatinga, que, em 2019, registrou 35 hectares desmatados em áreas de preservação permanente, mas em 2020 foram 290 hectares e, em 2021, mais 357 hectares.
O maior desmatamento ocorrido na Caatinga em 2021 foi detectado no município de Parnaguá, no Piauí, em uma área de 1.269 hectares. De acordo com a Secretaria Estadual de Meio Ambiente e Recursos Hídricos do Piauí (Semar), a área desmatada não possui nenhum licenciamento ou autorização emitida pelo órgão.
“A caatinga como um todo tem um padrão de desmatamento bastante difuso, bastante ligado ao regionalismo, mas a gente está conseguindo entender algumas tendências nessas queimadas e elas acontecem sobretudo devido a conversão de áreas florestadas para se tornarem pastagens ou áreas agrícolas”, explicou Joaquim Freitas.
Outro fator que tem causado crescimento no desmatamento da Caatinga é o processo de instalação de usinas e parques para geração de energia eólica e solar, como explica Marcos Rosa: “a região da Caatinga tem sofrido muito com o processo de implantação de usinas e parques eólicos e solares, porque eles têm sido instalados em áreas naturais, causando muito desmatamento. Existe toda uma discussão sobre como planejar e como aproveitar as áreas já abertas e abandonadas na Caatinga para realizar a instalação dessas usinas, que são essenciais para o desenvolvimento, mas isso teria que ser feito de uma forma muito bem pensada e planejada”.
O levantamento do Mapbiomas identifica quais são os vetores de pressão que provocam o desmatamento. As principais atividades apontadas são ligadas à agropecuária, garimpo, mineração e expansão urbana. Em 2021, também teve início o processo de identificar a pressão causada pela construção de usinas eólicas e solares no Brasil, principalmente na região Nordeste.
A identificação de áreas desmatadas para instalação de projetos de energia solar e eólica detectou 27 desmatamentos, somando 5.454 hectares, que foram desmatados para energia solar e outros 7 alertas, num total de 130 hectares, que foram desmatados para realizar projetos de energia eólica.
De acordo com o levantamento, a agropecuária é a atividade responsável por causar o maior número de desmatamentos e correspondeu a quase 97% de todos os alertas validados pelo Mapbiomas.
Todos os estados e o Distrito Federal tiveram alertas de desmatamento detectados em 2021, ,mas é o que Pará lidera o ranking do desmatamento com 24,31% da área desmatada no país, seguido do Amazonas, com 11,75%. No terceiro lugar ficou o estado do Mato Grosso, com 11,47% da área devastada, seguido do Maranhão, com 10,09%.
Pernambuco ficou em 15º lugar do ranking, com uma média de 40 hectares desflorestados por dia, e também está entre os estados onde, proporcionalmente, o desmatamento mais cresceu, acompanhado de Paraíba, Ceará, Minas Gerais e Sergipe, com um percentual superior a 80% da área atingida pela ação dos desmatadores. A ampliação é resultado tanto do crescimento no desmatamento como também da melhora no sistema de detecção de queimadas na Caatinga, conforme mencionado acima.
No que diz respeito a fiscalização de áreas com alerta de queimadas e desmatamentos, Pernambuco também tem uma perspectiva negativa e apresentou a menor atuação entre 2019 e 2021, com apenas 21 ações realizadas neste período.
De acordo com o Mapbiomas, considerando os dados dos órgãos federais e estaduais, apenas 7% dos alertas de desmatamento tiveram sobreposição com autorizações ou ações de fiscalização no Brasil entre 2019 e 2021.
“O que a gente percebeu é que o Governo Federal praticamente parou todas as ações de fiscalização e sobrecarregou demais os estados. Então, os estados estão tentando aumentar o efetivo da fiscalização, mas eles ainda têm muita dificuldade de equipe técnica e de sistema. Os técnicos continuam muito engajados, mas cada vez mais você vê que o Ibama como órgão de fiscalização ambiental tem deixado de atuar como deveria”, declarou Marcos Rosa.
Outro dado que enfatiza o crescimento do desmatamento no estado de Pernambuco é o ranking de Comunidades Remanescentes de Quilombos com as maiores áreas desmatadas em 2021. A comunidade Conceição das Crioulas, por exemplo, localizada em Salgueiro, região Agreste do estado, aparece em 18º lugar, com um total de 12,9 hectares desmatados.
“Territórios indígenas e comunidades quilombolas têm um modo de vida tradicional que é muito compatível com a preservação do meio ambiente, então, é super importante a preservação da cultura e do modo de vida para garantir a sustentabilidade dessas comunidades e, no entanto, o que a gente vê é exatamente o contrário, o próprio governo federal, que deveria proteger, acaba permitindo que essas áreas sejam invadidas e devastadas”, enfatizou Marcos Rosa.
Um dado alarmante do Mapbiomas mostra o aumento considerável dos desmatamentos em áreas de Unidade de Conservação (UC). Em 2021, 10,1% da área total desmatada no Brasil ocorreu dentro de alguma Unidade de Conservação. Porém, quando se exclui a categoria de Área de Proteção Ambiental (APA), que permite atividades de produção rural em propriedades privadas, o total da área desmatada nas UCs cai para 3,9%.
“Diferente dos parques e das reservas ecológicas, que são categorias extremamente restritivas, as APAs permitem praticamente qualquer atividade, desde que esteja de acordo com o plano de manejo. Mas, se não houver plano de manejo atualizado e conselho gestor em dia, essas áreas se tornam menos fiscalizadas e assim mais expostas ao desmatamento”, analisou Felipe Melo, pesquisador do Laboratório de Ecologia Aplicada da UFPE.
No ranking das Unidades de Conservação com maior área desmatada no Brasil em 2021, a Área de Proteção Ambiental (APA) da Chapada do Araripe, que engloba os estados do Ceará, Pernambuco e Piauí, aparece em 14º lugar, com o registro de 2.188,6 hectares desflorestados. Já as duas UCs com maior área desmatada foram a APA do Triunfo do Xingu e a Floresta Nacional do Jamanxim, ambas localizadas no Pará.
“A região mais ao leste da Chapada do Araripe já é conhecida por apresentar, anualmente, uma série de incêndios, a maior parte desses incêndios são causados por um manejo incorreto das práticas agrícolas. A prática de queimada de solo para renovar as lavouras é uma prática que desgasta e tira todos os nutrientes do solo e pouco a pouco vai matando ele”, explicou Joaquim Freitas, do Cepan.
Para Joaquim, a falta de fiscalização está diretamente ligada às queimadas constantes na Área de Proteção Ambiental. “Hoje, quase todo desmatamento está sujeita a um licenciamento que tem que ser seguido, mas a partir do momento que você tem uma generalização de desmatamentos que ocorrem sem ter a fiscalização devida, para entender se aquela área que está sendo desmatada pode ou não ser desmatada, cria uma sensação geral de impunidade. Isso acontece com muita frequência em áreas mais remotas e empobrecidas, onde o poder público não consegue chegar justamente por falta de recursos. Então, muitos desmatamentos na caatinga e no Araripe são alimentados por essa falta de fiscalização”.
Considerando os autos de infração do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama), apenas 6,5% da área desmatada e 1,1% dos alertas no Brasil durante o período de 2019 a 2021 resultaram em autuações. O cruzamento apontou embargos do Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio) por infração à flora de 1.199 alertas de desmatamento, o que representa apenas 1,7% da área total dos alertas, que corresponde a 75.245 hectares.
Esta reportagem foi produzida com apoio doReport for the World, uma iniciativa doThe GroundTruth Project.
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Jornalista e mestra em Comunicação pela Universidade Federal de Pernambuco.