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Morte de dois PMs e chacina da família do atirador completam um mês com muitas dúvidas a esclarecer

Marco Zero Conteúdo / 13/10/2023
painel com fotos dos rostos dos 8 mortos - cinco homens e três mulheres - dos dias 15 e 16 de setembro de 2023.

Crédito: Reprodução/WhatsApp

por Jorge Cavalcanti*

Sábado, 14 de outubro, completa um mês dos oito assassinatos com relação entre si, ocorridos num intervalo de aproximadamente 12 horas no Grande Recife. Naquele período, foram feridos de forma letal dois policiais militares em serviço e seis pessoas de uma mesma família. O episódio pode ser classificado como “chacina”, o que acontece quando quatro ou mais pessoas são assassinadas simultaneamente ou num curto prazo de tempo por um ou mais indivíduos, por motivo determinado. A chacina de familiares do homem suspeito de ter atirado contra os PMs é a maior dos últimos cinco anos ocorrida em Pernambuco; a primeira registrada no governo de Raquel Lyra (PSDB).

As investigações da Polícia Civil e do Ministério Público de Pernambuco ainda estão em curso. Por conta do nível de complexidade do inquérito, o delegado que apura o caso, Ivaldo Pereira, do Grupo de Operações Especiais (GOE), deve pedir mais 30 dias para a conclusão do trabalho. Testemunhas já foram ouvidas. Entre elas, sobreviventes do tiroteio em que os dois agentes foram alvejados, no bairro de Tabatinga, em Camaragibe, e o policial militar que os acompanhava no atendimento à ocorrência registrada pelo 190.

A dinâmica envolvendo as oito mortes violentas intencionais pode ser dividida em três momentos:

  • O tiroteio que culminou com a morte do soldado Eduardo Roque, 33 anos, e cabo Rodolfo José da Silva, 38;
  • o sequestro e a execução de cinco parentes de Alex da Silva Barbosa, 33 anos, o homem suspeito de ter atirado contra os policiais;
  • o tiroteio com policiais em que Alex foi morto.

Na primeira vez que falou publicamente sobre o assunto, foi o próprio secretário de Defesa Social, Alessandro Carvalho, quem estabeleceu a ligação entre os crimes. “O que sabemos é que dois policiais foram assassinados ao atender uma ocorrência e, depois disso, cinco pessoas ligadas ao suspeito foram mortas em menos de 12 horas. Existe uma correlação entre os fatos e é isso o que nós vamos investigar”, disse.

Era tarde de sexta-feira (15 de setembro), no Palácio do Campo das Princesas, quando o secretário começou a falar sobre o caso, logo após o pronunciamento à imprensa da governadora. “Infelizmente, oito vidas foram ceifadas em Pernambuco. A polícia está investigando cada uma delas como são: crimes bárbaros”, declarou Raquel. Nem a governadora nem o secretário falaram abertamente sobre a possibilidade de participação de policiais no sequestro e morte da mãe, esposa, irmã e dois irmãos de Alex, como forma de vingança pelo óbito dos dois colegas de corporação.

Desafios às investigações

A reportagem da Marco Zero Conteúdo conversou com profissionais e agentes do sistema de justiça criminal para entender quais as dúvidas e perguntas que as investigações precisam elucidar para, assim, apontar as circunstâncias em que as mortes ocorreram e os responsáveis pela autoria dos crimes. Momentos depois dos PMs serem baleados, foram achados os corpos dos cinco parentes de Alex e do próprio suspeito, em locais diferentes.

Abaixo, os nove pontos de questionamento que precisam ser respondidos:

1) Como ocorreu a dinâmica da abordagem policial no atendimento à ocorrência do 190? Segundo testemunhas, quem atirou primeiro, Alex ou os policiais?

2) Em relação a Alex, qual a posição onde os policiais se encontravam, assim também como as duas pessoas baleadas que sobreviveram ao tiroteio?

3) Qual a análise é possível fazer das imagens da live feita pela irmã de Alex no Instagram, momentos antes de ser executada e durante a sua própria execução? É possível afirmar que há um nível de organização na ação do grupo? Lembrando que, antes da transmissão, Ágata Ayanne da Silva, 30, postou nas redes sociais que a mãe havia sido sequestrada por mais de dez homens encapuzados.

4) Qual a probabilidade e/ou evidências de que os executores tenham relação com o tráfico de drogas da localidade? Esta hipótese chegou a ser ventilada em entrevistas à imprensa pela chefe da Polícia Civil, Simone Aguiar.

5) Já foi realizada a reprodução simulada dos fatos? A “reconstituição dos crimes” é um instrumento imprescindível para checar o nível de compatibilidade dos depoimentos de testemunhas e suspeitos.

6) De acordo com o sistema de rastreamento de localização, quantos e quais veículos policiais foram acionados nas buscas por Alex? A caçada mobilizou homens e viaturas do 20º BPM e outros batalhões por três municípios (Camaragibe, Paudalho e São Lourenço da Mata).

7) Já foram recolhidas as imagens de câmeras de segurança de imóveis localizados no perímetro investigado? Quem as recolheu e o que elas registraram?

8) Sobre as perícias técnicas, em que contexto foram realizadas nos locais dos crimes e o que apontam?

9) Qual o histórico de chamadas realizadas e atendidas dos telefones das cinco pessoas da família de Alex e o que sugere?

No Ministério Público estadual, há dois Procedimentos Investigatórios Criminais abertos sobre os oito homicídios. É prerrogativa da instituição o controle externo da atividade policial. A investigação é conjunta e está com a 1ª Promotoria Criminal de Camaragibe e os Grupos de Atuação Conjunta Especial (Gace) e de Atuação Especializada de Combate ao Crime Organizado (Gaeco).

Duas vítimas, além das oito mortes

Um adolescente e uma jovem grávida ficaram feridos no tiroteio em Tabatinga. O rapaz teve alta logo. A gestante estava dentro do lote em que fica sua casa, próxima à de Alex, quando foi atingida na cabeça. Ela permanece internada, com um estado de saúde que exige cuidados por conta de uma infecção bacteriana. O agravamento do quadro levou a equipe médica a optar pela realização do parto, por conta da saúde da criança, que nasceu com oito meses. 

O soldado e o cabo eram lotados no 20º Batalhão. Eduardo Roque tinha seis anos na PM, era casado e pai de duas filhas. Rodolfo José da Silva estava há oito anos na corporação, tinha esposa e filha. Os corpos da mãe e da esposa de Alex foram encontrados num canavial em Paudalho, identificadas como Maria José Pereira da Silva e Nathália Nascimento, respectivamente. As outras duas vítimas foram Amerson Juliano da Silva e Apuynã Lucas da Silva, ambos de 25 anos, irmãos de Alex.

*Jornalista com 19 anos de atuação profissional e especial interesse na política e em narrativas de garantia, defesa e promoção de Direitos Humanos e Segurança Cidadã

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