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Como se prevenir da covid nas manifestações de rua contra Bolsonaro

Maria Carolina Santos / 28/05/2021

Crédito: Roberto Parizotti/Fotos Públicas

É com sentimentos conflitantes que os brasileiros que são contra o governo Bolsonaro se deparam com os protestos marcados para este sábado. Movimentos estudantis, sindicais e sociais estão puxando manifestações Fora Bolsonaro em 139 cidades neste 29 de maio. Em Pernambuco, haverá protestos no Recife (concentração no Derby, às 9h), em Caruaru (Centro, às 9h) e em Garanhuns (Centro, às 9h).

Se não há dúvidas de que o Governo Federal é o principal responsável pelo descontrole da pandemia que o Brasil vive – já são quase 30 dias com média de mortes por covid acima de mil -, bem se sabe que aglomerações são terreno fértil para a propagação do vírus. Ainda mais neste momento. Pernambuco vive o pior cenário desde o início da pandemia: nesta semana, chegou a 60 mil casos ativos no estado. Ou seja, um a cada 160 pernambucanos está infectado.

Mas é a sensação de que não há mais nada a fazer que volta a colocar as ruas como palco de protestos. “A situação sanitária e política do Brasil é gravíssima e há um descontrole intencional. O ato é fundamental para mostrarmos que não suportamos mais esse sofrimento e mortes evitáveis, esse genocídio nacional”, diz a médica sanitarista e vice-presidente da Associação Brasileira de Saúde Coletiva (Abrasco), Bernadete Perez. “O risco do nosso silêncio tem sido muito grande. Quem puder ir com segurança, principalmente quem já está vacinado, vá”, chama a médica, que também faz parte da Rede Solidária em Defesa da Vida.

“Qualquer que seja a aglomeração enquanto o vírus da covid-19 circula é problemático e pode gerar mais contaminação. É importante que, se as pessoas vão fazer manifestação, que sigam as orientações e protocolos, que usem máscaras. O ideal era que não houvesse aglomerações, que houvesse medidas restritivas. O vírus não deixou de circular”, alerta a infectologista Sylvia Lemos Hinrichsen, professora do Departamento de Doenças Infecciosas da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE) e consultora da Sociedade Brasileira de Infectologia (SBI).

“É uma situação delicada, estamos no meio de várias narrativas. Mas também não dá para ficar só na internet ou batendo panela”, diz o físico Vitor Mori, pesquisador da Universidade de Vermont e membro do Observatório Covid-19 BR.

Há mais de um ano dando recomendações sobre a prevenção do coronavírus em entrevistas e posts no Twitter, Mori lembra que não há risco zero de contaminação, ainda mais quando estamos falando de uma manifestação com milhares de pessoas. Mas o pesquisador coloca uma série de pontos que podem diminuir esses riscos.

Antes de tudo, é necessário reforçar como se dá a transmissão do novo coronavírus. “É essencialmente por aerossóis, que são partículas inaladas. É muito mais frequente se infectar por aerossóis do que por gotículas, por exemplo, que são partículas mais pesadas, que caem no chão rapidamente”, explica. Isso é importante para frisar a principal forma de se prevenir do vírus: uso de máscaras e ambientes abertos, bem ventilados. “Ao ar livre, essas partículas se diluem. É como uma pessoa fumando em um ambiente fechado e uma pessoa fumando na rua. A fumaça se dilui no ar”, compara Mori.

O pesquisador lembra que estudos de rastreamento de pessoas infectadas com o Sars-Cov-2 mostraram que menos de 1% contraiu o vírus em atividades ao ar livre. “Mas isso não significa que as chances de pegar covid ao ar livre seja de 1%”, alerta. “Isso é de uma pesquisa que olhou para trás e viu que cerca de 1% se infectou ao ar livre. Quanto à estimativa de risco, é muito difícil de prever, pois depende de muitos contextos”, diz.

O médico infectologista no Hospital Universitário Oswaldo Cruz (UPE) e professor no curso de medicina da UFPE em Caruaru, Diego Guedes, atenta para o fato de que boa parte da população já está nas ruas. “Estamos há meses com UTIs lotadas, filas para leitos, com a pandemia descontrolada. E nada é feito para que haja uma restrição mais efetiva, que o auxilio emergencial seja ampliado e que as pessoas fiquem em casa. Há algumas medidas restritivas agora, mas a população está na rua, no trabalho, o auxílio diminuiu. Na prática, tudo parece estar funcionando”, reclama. “O risco de se estar em ônibus ou metrô lotados, com janelas fechadas, é maior do que estar em uma praça, em ambiente aberto”, diz.

Atenção aos pontos críticos

Ficar ao ar livre, portanto, é relativamente seguro. Como os protestos deste sábado serão nas ruas, a preocupação dos manifestantes deve ser redobrada nos trajetos. “As pessoas não se teletransportam até o protesto. O que eu considero de maior risco é o antes e o depois da manifestação. O caminho de ir até até o local, se vai antes na casa de alguém, se vai dividir o carro, se vai usar o transporte público. Muitas vezes as pessoas vão em grupo ou na volta decidem ir para outo lugar, para a casa de alguém. É com muita gente em locais fechados que está o maior risco. Seria importante que os organizadores dos atos reforçassem a necessidade de alerta sobre o transporte, que são especialmente perigosos”, explica Vítor Mori.

Para se prevenir, é preciso redobrar os cuidados. Máscaras de boa qualidade, de preferência as PFF2/N95, devem ser usadas. A alternativa é usar uma máscara cirúrgica por baixo e uma de tecido, bem ajustada, por cima. “E não se deve tirar a máscara em momento algum. Evitar também falar alto, gritar, porque quanto mais alto você fala, mais partículas joga no ar”, detalha o físico, direto da Universidade de Vermont.

Mas quem já esteve em qualquer ato sabe que é impensável uma manifestação sem gritos. “O uso de megafone é indicado. É melhor falar normal usando um megafone do que gritar”, indica Mori. Sempre, claro, de máscara. É recomendado levar sua própria água de casa, para evitar entrar em bares ou lojas no trajeto. Quando for tomar água, se afastar dos demais manifestantes e beber ao ar livre. “Melhor ainda usar um garrafa com canudo e só levantar a máscara”, indica Mori.

Outra dica é não perder o foco. Provavelmente você vai encontrar amigos, amigas e conhecidos que não via há tempos. Nada de beijos, abraços ou tirar a máscara. “Estando com amigos é mais comum baixar a guarda”, alerta Mori. Neste mesma linha, Bernadete Perez alerta sobre o consumo de álcool. “As pessoas bebem e ficam mais relaxadas. Tem o fato também de que para beber vai precisar tirar a máscara, então é melhor evitar”, diz.

O infectologista Diego Guede avisa ainda que o distanciamento entre as pessoas deve ser seguido. “Reforçar também que quem está com algum sintoma compatível com covid-19 não vá, fique isolado em casa”, diz. “Se você é grupo de risco, também é melhor não ir. Mesmo quem tomou a primeira dose, mas não está com a vacinação completa, é melhor evitar”, recomenda.

Um receio tanto dos especialistas quanto da Rede Nacional de Médicas e Médicos Populares, que criou um guia de prevenção, é de que as manifestações neste sábado sejam usadas como bode expiatório para o já esperado novo pico da pandemia. O último boletim do Observatório Covid-19 da Fiocruz, por exemplo, alerta para o recrudescimento da de casos nas próximas semanas. Oito estados, incluindo Pernambuco, e o Distrito Federal estão hoje com taxas de ocupação de leitos iguais ou superiores a 90%. O que está péssimo tende a ficar ainda pior. “Analisando manifestações passadas, vemos que não foram responsáveis pelo aumento de casos no Brasil. É algo que pode acontecer independentemente da realização desses protestos”, acredita Mori.

Para quem não sente segurança de que os protocolos serão realmente seguidos ou acha que ainda não é o momento para manifestações de rua, pode participar dos protestos pelas redes sociais. Os organizadores estão divulgando as hashtags #forabolsonaro e #29m. Abaixo, as recomendações da Rede de Médicos Populares, que faz parte da organização dos protestos.

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AUTOR
Foto Maria Carolina Santos
Maria Carolina Santos

Jornalista pela UFPE. Fez carreira no Diario de Pernambuco, onde foi de estagiária a editora do site, com passagem pelo caderno de cultura. Contribuiu para veículos como Correio Braziliense, O Globo e Revista Continente. Contato: carolsantos@marcozero.org