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Conselho Estadual de Saúde poderá recomendar quarentenas pontuais para conter covid em Pernambuco

Raíssa Ebrahim / 30/04/2021

Crédito: Andréa Rego Barros/Arquivo PCR

Após uma forte aceleração, a pandemia em Pernambuco chegou a uma estabilidade, porém em níveis bastante elevados e com uma taxa de ocupação de UTIs que persiste acima de 90% desde fevereiro. Não há, no entanto, ao menos por ora, qualquer sinalização de novas medidas restritivas. O Governo do Estado diz que vem monitorando os dados e insiste num discurso que pede conscientização enquanto a população se espreme cotidianamente no transporte público lotado e, praticamente, todos os setores da economia estão liberados, apesar de algumas poucas restrições.

Diante desse cenário, o Grupo de Trabalho de Emergência Sanitária do Conselho Estadual de Saúde (CES) está defendendo quarentenas pontuais, específicas e delimitadas em áreas onde a situação está mais crítica, ou seja, onde há grande número de casos e mortes por covid-19. A recomendação tem um caráter também pedagógico, de sensibilização da população de que a situação está longe da normalização.

A nota técnica, elaborada em reunião na quinta-feira, dia 29, com a presença de um representante da Secretaria Estadual de Saúde (SES-PE), ainda depende da aprovação no pleno do conselho, na próxima semana. Além das quarentenas pontuais, o grupo também defende, mais uma vez, a imediata suspensão das aulas presenciais e também a construção de estratégias locais caso haja um lockdown nacional, como vem reivindicando o Conselho Nacional de Saúde (CNS), a Frente pela Vida e centrais sindicais, mediante um auxílio emergencial adequado.

Com mais 1.917 casos da doença confirmados pela SES-PE nas últimas 24 horas, o Estado chega, nesta sexta (30), ao segundo dia consecutivo de alta da média móvel de novas contaminações. Agora, Pernambuco totaliza 406.585 casos de covid-19, sendo 40.234 graves e 366.351 leves. Também foram registrados 71 novos óbitos, ocorridos entre junho e abril. Com isso, o total soma 14.038 mortes desde o início da pandemia.

No final da tarde de sexta-feira, dia 30, a Associação Nacional dos Registradores de Pessoas Naturais (Arpen, entidade que representa os cartórios de registro civil) anunciou que, pela terceira vez na história, houve mais mortes do que nascimentos na cidade do Recife: foram 2.022 mortes e 1.521 nascimentos. O mesmo aconteceu em março, que teve 2.209 óbitos e 2.200 nascimentos. Antes disso, em maio de 2020, a cidade já havia registrado o mês mais letal de sua história, com 940 óbitos a mais que nascidos vivos.

Lockdown nacional e estratégias locais

Petra Duarte, professora da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE) e suplente da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz) no Conselho Estadual de Saúde, coloca que há uma grande preocupação com a pressão sobre a rede de saúde e a prorrogação da crise, que pode afetar também a questão dos insumos necessários para intubação de pacientes.

“A pressão sobre a rede de assistência é muito intensa e preocupante. O governo fez um esforço grande de ampliação e vem fazendo um esforço grande para manejar esses leitos, mas sabemos que há risco permanente e iminente de haver um processo de incapacidade assistencial. Estamos numa situação muito crítica em termos de leito de UTI”, diz.

O CES vem defendendo um lockdown mais amplo, semelhante ao do ano passado, mas as decisões do Governo do Estado têm ido na contramão, com o anúncio da reabertura, ainda com algumas restrições, e do retorno ao ensino presencial no pior momento da pandemia. Pelas falas que vêm sendo feitas em coletivas de imprensa semanais com o secretário de saúde André Longo, está praticamente descartado, por enquanto, um passo atrás no plano de convivência, com a volta do fechamento amplo das atividades econômicas. Sem apoio federal e sem auxílio emergencial, os gestores públicos estaduais e municipais têm dificuldades em tomar decisões mais duras.

Em sua fala na última entrevista coletiva realizada pelo Governo Estadual, o secretário Longo admitiu a eficácia das medidas restritivas que foram abandonadas pelo governo estadual: “As medidas restritivas impopulares, que foram tomadas com muito arrojo por Pernambuco e pelos estados do Nordeste, no momento adequado, quando da aceleração da pandemia, foram fundamentais para a gente ter a reversão da aceleração da doença neste momento em que a gente vive a nossa sazonalidade de maior ocorrência de doenças respiratórias, momento propício para a maior contaminação por parte do vírus”.

Com mais de 400 mil vidas perdidas num cenário de descontrole sanitário, os Conselhos Estaduais de Saúde têm se unido ao Conselho Nacional na luta em defesa da Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental nº 822 (ADPF/822), documento que responsabiliza o Executivo Nacional pelo atual estado de calamidade e solicita que o Supremo Tribunal Federal (STF) instrua por um lockdown amplo e nacional por 21 dias, além de medidas protetivas à população.

“Se esse lockdown nacional for aprovado, será necessário ter uma estratégia local. Temos uma situação de pressão sobre a economia, as medidas parciais que vêm sendo tomadas ao longo do tempo, sempre com uma condução muito equivocada por parte do Governo Federal, fazem com que a pressão sobre a economia seja persistente ao longo dos meses”, comenta Petra.

Sobre a estratégia das quarentenas em áreas mais críticas, ela detalha que, para isso, é necessário que a Secretaria Estadual de Saúde identifique esses locais através de massificação de testagem, com o acompanhamento detalhado do crescimento de óbitos e casos nessas regiões para poder definir as ações. “Com essas quarentenas por áreas mais críticas, evitaríamos uma pressão de contenção geral, que gera toda essa crise econômica que temos vivido e, ao mesmo tempo, estaríamos sensibilizando a população da necessidade desse enfrentamento”, defende.

“A baixa adesão da população às ações de controle, como uso de máscara, higienização das mãos e evitar aglomeração, vai muito também de como a questão é posta. Temos o problema das fake news do Governo Federal, que diminui o impacto do que é dito pelos governos locais. Mas também o fato de estarmos numa conjuntura de atividades econômicas praticamente todas liberadas gera na população um clima de normalidade, que não existe”, argumenta a professora.

O CES também voltou a insistir na elaboração da nota discutida nesta quinta, 29, e que ainda será aprovada, na reafirmação pela suspensão das aulas presenciais enquanto houver esse nível tão crítico de pressão sobre a rede assistencial. “Quanto mais a gente puder conter a circulação de pessoas num momento crítico como esse, melhor”, coloca Petra.

Estado não considera restrições atuais como brandas

Apesar do aumento de casos e mortes, Longo descarta medidas mais restritivas para conter pandemia. Crédito: Governo de PE

Na coletiva desta quinta (29), a Marco Zero Conteúdo perguntou ao secretário André Longo se, mesmo com o alto patamar de casos confirmados e mortes, o governo iria seguir cedendo à pressão dos setores econômicos e ampliando a reabertura dos estabelecimentos. O gestor explicou que Pernambuco teve uma forte aceleração da pandemia em fevereiro e março e agora em abril uma estabilização num patamar elevado, atingindo o chamado “platô”.

Longo explicou que, em abril, foi retomado o plano de convivência, mas ainda com medidas restritivas que o governo estadual considera importantes. “É preciso dizer que alguns setores da economia sequer retomaram as suas atividades, como o setor de eventos, por exemplo. A gente tem hoje uma limitação rígida em relação ao funcionamento daquelas atividades recreativas, de bares e restaurantes, com um fechamento às 20h durante a semana e às 18h durante os finais de semana”, seguiu explicando.

“A gente não considera essas medidas como brandas, mas adequadas para o momento epidemiológico que estamos vivendo”, concluiu, reforçando os patamares altos e que o governo não está “baixando a guarda”. Longo pediu cautela da população e ampliação dos cuidados, independente dos estágios em relação às medidas restritivas. “Eu sempre disse aqui que não adianta a adoção de medidas restritivas pelo governo se não houver consciência da população nesse processo, fazendo aquilo que é o trivial, o básico da educação sanitária num momento de pandemia”, acrescentou, frisando que os dados continuam sendo acompanhados.

“Ainda temos muito sofrimento por parte das atividades econômicas, respeitamos todos os setores, pedimos compreensão e paciência em relação às próximas semanas, que serão decisivas para que a gente possa ter um segundo semestre melhor em relação a este primeiro semestre”, pediu o secretário.

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AUTOR
Foto Raíssa Ebrahim
Raíssa Ebrahim

Vencedora do Prêmio Cristina Tavares com a cobertura do vazamento do petróleo, é jornalista profissional há 12 anos, com foco nos temas de economia, direitos humanos e questões socioambientais. Formada pela UFPE, foi trainee no Estadão, repórter no Jornal do Commercio e editora do PorAqui (startup de jornalismo hiperlocal do Porto Digital). Também foi fellowship da Thomson Reuters Foundation e bolsista do Instituto ClimaInfo. Já colaborou com Agência Pública, Le Monde Diplomatique Brasil, Gênero e Número e Trovão Mídia (podcast). Vamos conversar? raissa.ebrahim@gmail.com