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“Estou vendo as campanhas dos adversários nas ruas, comitês suntuosos em espaços caros e zero real declarado. A única campanha que declarou recurso e que está trabalhando como manda a lei, dentro da regra, é a nossa. Espero que haja fiscalização”, declaração do candidato à Prefeitura do Recife, Daniel Coelho (PSDB), reproduzida em reportagem do dia 23 de agosto doJornal do Commercio
O financiamento das campanhas eleitorais no Brasil sempre foi um tema polêmico. As denúncias e confissões de caixa 2 que tomaram o país nos últimos anos, atingindo os mais diversos partidos do espectro político, deram ao tema conotação policial e impulsionaram mudanças na legislação eleitoral, com a proibição de doação de empresas aos candidatos a partir das eleições deste ano.
Mal começou a segunda semana da disputa pela Prefeitura do Recife e o tema já foi levantado em tom de denúncia pelo candidato Daniel Coelho (PSDB). OTruco Eleições 2016– projeto de checagem daAgência Pública, feito em parceria com aMarco Zero Conteúdona capital pernambucana –procurou a assessoria do político tucano para saber qual a fonte de informação que respaldava sua declaração. A assessoria informou que Daniel se baseara na declaração de doações de campanha aos candidatos disponibilizada nosite do Tribunal Regional Eleitoral de Pernambuco (TRE-PE).
A assessoria explicou que colheu o dado no site do TRE no domingo à noite (21) e que o candidato concedeu entrevista aoJornal do Commerciosobre o assunto na segunda-feira (22) à noite, durante caminhada no bairro de Água Fria.
OTruco Eleições 2016checou a declaração de Daniel e concluiu que ela é falsa ao indicar que ele é o único candidato que está cumprindo a legislação e ao dar a entender que os seus adversários estariam praticando algum tipo de irregularidade eleitoral. Por isso, recebe a carta “Blefe”.
Na manhã da terça, dia 23, aMarco Zeroacessou os dados públicos de prestação de contas dos candidatos e verificou que constavam no site, naquele momento, apenas informaçõesrepassadas pela campanha de Daniel Coelhoe do ex-prefeito petista João Paulo.
No caso de Daniel, há uma doação no valor de R$ 1 milhão feita pelo Partido Social Liberal, por meio do seu Fundo Partidário. O PSL é a sigla do candidato a vice-prefeito na chapa de Daniel, o empresário Sérgio Bivar. Não havia informações sobre as despesas efetuadas pela campanha de Daniel.
No caso de João Paulo, há registrada uma doação no valor de R$ 30 mil feita diretamente pelo seu candidato a vice-prefeito Silvio Costa Filho (PRB). Também constam despesas no total de R$ 174.700,00: R$ 114.700,00 mil com a MXM Gráfica Editora LTDA e R$ 60 mil com a Vivenda Comércio Imobiliário LTDA.As informações são públicas e podem ser acessadas por qualquer pessoano Sistema de Prestação de Contas Eleitorais (SPCE 2016), no site do Tribunal Superior Eleitoral.
Na manhã da quarta-feira, dia 24, constavam do sistema do TSE doações a mais dois candidatos: Carlos Augusto (PV) e Priscila Krause (DEM). No caso de Carlos Augusto havia o registro de uma doação no valor de R$ 350.000,00 do Fundo Partidário do PV. Priscila registrou a doação feita por ela mesma à sua campanha, no valor de R$ 35.000,00.
Para esclarecer os caminhos que os candidatos devem seguir na prestação de contas de suas campanhas, a Marco Zero consultou aResolução 23.463/2015, do Tribunal Superior Eleitoral. Nela estão dispostos todos os parâmetros que devem nortear a prestação de contas. O capitulo 2 (DO PRAZO, DA AUTUAÇÃO DA PRESTAÇÃO DE CONTAS E DA DIVULGAÇÃO DO RELATÓRIO FINANCEIRO DE CAMPANHA) trata, entre outros itens, da publicização dos dados financeiros da campanha no site do próprio TSE.
Pela resolução, os candidatos devem repassar em até 72 horas, para o Tribunal, as informações sobre as doações financeiras (dinheiro) de pessoas físicas e partidos às suas campanhas. Isso significa que, feito o repasse dos recursos doados para a conta de campanha do candidato, ele tem o prazo máximo de três dias para enviar as informações ao TSE sobre o CPF do doador e o valor doado. Essas obrigações recaem também sobre os partidos políticos e as coligações. No prazo máximo de 48 após o recebimento, o Tribunal disponibiliza as informações no seu site oficial, dando acesso público aos dados.
Mas existe um outro tipo de doação para a qual as campanhas não precisam passar de imediato as informações ao TSE. São as doações estimáveis em dinheiro, aquelas relativas a serviços e bens. Estas só precisam constar da Declaração Parcial das Contas de Campanha, que deve ser enviada ao TSE via internet entre 9 e 13 de setembro, constando todo o registro de movimentação financeira desde o primeiro dia oficial de campanha até o dia 8 de setembro.
“No dia 15 de setembro, o Tribunal Superior Eleitoral divulgará, na sua página, na Internet, a prestação de contas parcial de campanha de candidatos e partidos políticos com a indicação dos nomes, do CPF ou CNPJ dos doadores e dos respectivos valores doados (Lei nº 9.504/1997, art. 28, § 4º, inciso II, e§ 7º)”, informa o Parágrafo Quinto do Artigo 43 da resolução do TSE.
O analista judicial da Seção de Auditoria de Contas Eleitorais e Partidárias, do TRE-PE, Rodrigo Morais, esclarece que as doações definitivas ou temporárias de uma casa, de carros ou de panfletos, cartazes e outros utensílios usados na divulgação da campanha não precisam ser declaradas neste momento. Em setembro, sim, os candidatos precisarão dizer ao TSE os nomes e dados dos doadores e os valores estimados em reais dessas doações. Além de pessoas físicas, informa Rodrigo, os próprios partidos podem doar bens e serviços adquiridos com recursos do Fundo Partidário para as campanhas de seus candidatos.
Mesmo para as doações financeiras que precisam ser encaminhadas em 72 horas para o TSE, não é preciso discriminar neste momento como os recursos adquiridos estão sendo gastos, como fez João Paulo (PT). Mas este tipo de informação (despesas) necessariamente precisará constar da Prestação Parcial da Campanha em setembro, incluindo os dados dos fornecedores.
A eventual ausência de informações da campanha sobre o recebimento de recursos financeiros por meio de doação só será examinada, de acordo com a quantidade e os valores envolvidos, no julgamento final das prestações de contas dos candidatos, após a eleição.
Em Recife, cada candidatura majoritária à Prefeitura tem um teto de gasto no primeiro turno definido no valor de R$ 6.607.443,14. O teto de gasto para o segundo turno é de R$ 1.982.230,00. Pessoas físicas podem doar às campanhas até 10% dos seus rendimentos brutos recebidos em 2015. No caso de doações estimáveis (bens móveis e imóveis de propriedade do doador ), o limite é de R$ 80.000,00. No caso dos candidatos, eles podem doar recursos próprios até o limite total de gastos definidos pelo TSE, que é de mais de R$ 6 milhões em Recife.
Sendo assim, o fato de Daniel Coelho ter sido o primeiro a encaminhar ao TSE o registro de doação financeira à sua campanha não indica, como faz sugerir a declaração do candidato, que haja qualquer tipo de irregularidade ou crime sendo praticado pelos demais postulantes ao mandato de prefeito do Recife. Daniel pode até questionar a funcionalidade da resolução do TSE, mas as informações até aqui disponibilizadas (ou mesmo não disponibilizadas) no site do Tribunal não dão qualquer base sólida para questionar a idoneidade da campanha de seus adversários.
Outra questão que analisamos da declaração do candidato tucano foi a sugestão de que o Ministério Público, a Justiça Federal e Polícia Federal devem fiscalizar a prestação de contas dos candidatos que ainda não enviaram registros de doações ao TSE.
AMarco Zeroouviu o advogado especialista em direito eleitoral, Humberto Vieira de Melo, que já trabalhou em várias campanhas eleitorais no Estado. Falando de um modo geral e não especificamente do caso de Daniel, Humberto esclareceu que a Justiça Eleitoral, assim como é praxe no Poder Judiciário, só atua quando é provocada. “A Justiça precisa ser provocada para agir. Qualquer candidato que considere ter elementos que sinalizem irregularidades por parte de outro candidato deve fazer uma denúncia ao Ministério Público Eleitoral para que o órgão avalie a possiblidade de abrir ou não investigação”.
(Laércio Portela e Thayná Campos)
Co-autor do livro e da série de TV Vulneráveis e dos documentários Bora Ocupar e Território Suape, foi editor de política do Diário de Pernambuco, assessor de comunicação do Ministério da Saúde e secretário-adjunto de imprensa da Presidência da República