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Foto: ASA Brasil
Faltam 343 mil cisternas para garantir água de beber para as quase 1,8 milhão de famílias que vivem na zona rural do Semiárido. Como cada uma delas custaria pouco mais de R$ 3.490,00, seriam necessários R$ 1,254 bilhão para assegurar a universalização do acesso à água captada das chuvas nos 10 estados da região (os nove do Nordeste, além do norte de Minas Gerais).
E é para assegurar a inclusão desses recursos no Plano Plurinanual 2020-2023 que a Articulação do Semiárido Brasileiro (ASA Brasil) articula, desde o início do ano, a criação da Frente Parlamentar em Defesa da Convivência com o Semiárido, lançada hoje pela manhã no Congresso Nacional.
Seriam necessárias 198 assinaturas favoráveis. Até ontem 221 parlamentares – incluindo 11 do governista PSL – tinham assinado, autorizando a criação da Frente, o que garante a realização – nas agendas oficiais da Câmara e do Senado – de debates, seminários, audiências públicas e a defesa formal dos argumentos em favor do conceito de convivência com o Semiárido.
Os números relativos à necessidade de cisternas fazem parte do estudo sobre o acesso à água no Semiárido, entregue pela ASA aos deputados e senadores participantes da Frente.
O levantamento não se limita às cisternas de “primeira água”, ou seja, usadas para o consumo da família. No caso dos equipamentos de “segunda água”, que coletam e armazenam água para a produção agrícola e de animais, a demanda é bem maior: segundo a ASA, apenas 20% da população rural da região conta com estruturas desse tipo em suas propriedades. Seriam necessárias mais 797 mil cisternas e outras tecnologias (como cisternas calçadão, barragens subterrâneas e barreiros-trincheira), a um custo médio de R$ 15.500,00. Ao todo, seriam 1,1 milhão de cisternas e estruturas para as propriedades de famílias agricultoras.
No caso das tecnologias para a produção, a intenção seria assegurar 30% do total necessário para suprir a demanda no PPA 2020-2023: R$ 4,323 bilhões para a construção de mais de 239 mil tecnologias. Somados aos valores requeridos para as cisternas de consumo humano, o esforço será para carimbar R$ 5,6 bilhões nos orçamentos dos próximos quatro anos. Os outros 40% ficariam para o PPA 2024-2027.
Se o conceito convivência com o Semiárido atraiu simpatias no Legislativo, no Executivo sob a presidência de Jair Bolsonaro continua sendo ignorado. Apesar do Programa 1 Milhão de Cisternas ter sido premiado por agências das Nações Unidas, que também o consideram um modelo a ser replicado tanto na África quanto na América Central, nenhum integrante do Governo Federal demonstrou interesse em iniciar um diálogo com a ASA, composta por quase 3 mil entidades que atuam há décadas no Semiárido.
“A política de cisternas está em stand by, não sabemos para onde vai nem qual a visão que o Governo tem a respeito do tema, pois o foco do governo está sendo centrado nas tecnologias de dessalinização de água do mar. Apesar de haver excelentes pesquisas sobre o tema desenvolvidas no Brasil, é necessário muito cuidado com eventuais danos ambientais que podem levar à desertificação”, afirma Alexandre Pires, coordenador-executivo da ASA. Para ele, além do risco ambiental, a dessalinização não é capaz de universalizar o acesso à água.
Sem diálogo aberto e com o fim do Conselho Nacional de Segurança Alimentar, não se sabe qual o destino dos R$ 75 milhões previstos para o programa de cisternas no orçamento de 2019. Por enquanto, a construção de cisternas só não parou completamente graças aos convênios e políticas estaduais do Nordeste.
O Plano Nacional de Segurança Hídrica, cuja elaboração foi licitada ainda sob o governo Temer, apresentado no dia 11 de abril, reforça o silêncio governamental sobre o assunto. O Plano prevê R$ 27,5 bilhões de investimentos em 99 obras consideradas “plenamente habilitadas”, principalmente barragens e adutoras. O documento só menciona a palavra “cisterna” uma vez, na condição de “solução local”.
Jornalista e escritor. É o diretor de Conteúdo da MZ.