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A presença de Jair Bolsonaro e seu candidato a prefeito em Recife, Gilson Machado (PL), antecipando a campanha de rua na sacada da sinagoga Kahal Zur Israel constrangeu a parcela progressista dos quase 2.500 judeus pernambucanos. O Coletivo Judeus e Judias pela Democracia em Pernambuco emitiu uma nota para demonstrar “indignação e repúdio” diante da “manipulação da fé em proveito de interesses partidários”.
Porta-voz do grupo, o psicólogo e mestre em Educação Judaica pela Universidade Hebraica de Jerusalém, Marcos Gandelsman, disse que o grupo decidiu se posicionar diante da instrumentalização da religião pelos políticos do PL. “Não é algo pontual, isolado, é uma tática global da extrema-direita. Eles já fazem isso com as igrejas evangélicas, agora fizeram isso na sinagoga que, mais do que templo religioso, é um símbolo de tolerância religiosa”, afirmou.
A Federação Israelita de Pernambuco (Fipe), que administra a sinagoga, se justificou por meio de nota de esclarecimento assinada pelo seu presidente Boris Berenstein, com o argumento de que recebe “permanentemente visitas de diversas autoridades e expoentes do mundo político, empresarial, diplomático e acadêmico” por ter a “missão de apresentar o espaço a [sic] sociedade”.
Mais adiante, no entanto, a entidade se distancia de Bolsonaro e seus aliados afirmando “não assumimos, enquanto instituição, tendência alguma político-partidária e não encapamos qualquer manifestação que procure associar a Kahal Zur Israel a esses propósitos”.
Nós, do Coletivo Judeus e Judias pela Democracia-PE, manifestamos nossa indignação e repúdio pela utilização das dependências da Kahal Zur, a primeira sinagoga oficial das Américas, como palco de proselitismo religioso, servindo a usos políticos de um território e patrimônio religioso e cultural judaico pelo sr. Jair Messias Bolsonaro, por políticos de nosso estado que o acompanhavam, e por suas comitivas. Esse ato, que repercutiu na Marco Zero e em outros canais de mídia, alerta para a prática corriqueira neste país de aparelhamento e uso indevido da fé, que leva aos templos a disseminação das pautas de costumes tão apreciadas pela direita, motivo central da trajetória política deste representante inelegível da extrema direita nacional.
Para a sociedade brasileira temos a dizer que nos opomos a todas as formas de manipulação da fé em proveito de interesses político-partidários, baseados em retórica, falso moralismo e policiamento ideológico. Estas tem sido práticas corriqueiras de setores da direita nacional, ao sequestrarem símbolos judaicos a fim de atrair parcelas do eleitorado sensíveis à narrativa bíblica e às tradições religiosas que se baseiam neste registro.
Ao repudiarmos este ato estamos defendendo também o patrimônio simbólico e histórico da Sinagoga Kahal Zur Israel, tanto para nosso país quanto para a comunidade judia local e mundial. Símbolo de tolerância religiosa, e do valor judaico de congregar, a Kahal é um lugar de memória que merece ser respeitado e preservado. Em um país democrático e laico não se pode legitimar semelhante atividade política em um espaço religioso e de prática comunitária.
A baixa audiência desse injustificável evento confirma que o povo pernambucano, que garantiu a retomada democrática neste país junto aos demais estados do Nordeste, não se deixará ser usado de palco e palanque para nenhum retrocesso. Nós, do coletivo Judeus e Judias pela democracia, reiteramos nossa disposição de luta pela preservação de todas as identidades culturais e religiosas ameaçadas pelo autoritarismo político-partidário. Fazemos parte de uma comunidade e temos o dever, de forma livre e transparente, de nos posicionarmos pela defesa dos direitos humanos e contra quaisquer tentativas de, perante a opinião pública, atrelar o judaísmo, suas tradições e espaços de congregação às práticas abjetas da direita nacional.
Jornalista e escritor. É o diretor de Conteúdo da MZ.