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Moradores da Comunidade do Bode pedem paz e justiça após tiroteio que matou criança de um ano

Giovanna Carneiro / 06/06/2023

Por volta das 23h da última sexta-feira, 2 de junho, Andréa Carla Barros, de 17 anos, e sua filha, Aryelly Lavínia Barros, de 1 ano e 2 meses, estavam em uma lanchonete na Rua Oswaldo Machado, na Comunidade do Bode, no bairro do Pina, Zona Sul do Recife, quando foram atingidas por disparos de arma de fogo. A mãe foi socorrida e sobreviveu, mas a criança não resistiu aos ferimentos e morreu. 

Além de Andréa e Aryelly, os disparos atingiram os moradores Cláudio Barbosa, de 22 anos, Ana Karolina Rodrigues, de 23 anos, e Rosane Gomes, de 47 anos. Rosane também não resistiu e faleceu no local. As demais vítimas foram socorridas no Hospital da Restauração (HR) e já receberam alta. 

De acordo com a Polícia Militar, o tiroteio foi realizado por homens encapuzados que efetuaram os disparos na comunidade. O caso está sob investigação da Polícia Civil de Pernambuco e foi registrado como dois homicídios dolosos – quando há intenção de matar – consumados e três homicídios tentados.

Insegurança e revolta na Comunidade

O tiroteio que resultou na morte de duas pessoas despertou revolta da população na Comunidade do Bode. A fim de chamar a atenção do poder público na garantia de segurança para o bairro e em memória das vítimas, nesta segunda-feira, 5 de junho, integrantes de movimentos sociais que atuam na comunidade realizaram uma manifestação. 

O ato foi convocado por familiares de Aryelly Lavínia e integrantes de movimentos sociais da Comunidade do Bode. Crédito: Ingrid Veloso / Coletiva Cabras

O ato teve início às 16h, na Rua Oswaldo Machado, local onde ocorreu o tiroteio, e às 18h seguiu em caminhada até a Igreja do Pina, na Avenida Herculano Bandeira.Vestidos de branco e carregando bolas brancas e cartazes, moradores da Comunidade do Bode, familiares das vítimas e líderes de movimentos sociais do bairro clamaram por paz e justiça.

“Nós estamos fazendo um ato simbólico para demonstrar solidariedade aos familiares e também para cobrar justiça. A comunidade toda respira esse sentimento de luto e impunidade, porque a gente acompanha esses casos, tidos como tragédias, acontecendo frequentemente. A gente fica só esperando o próximo caso e é muito triste que isso continue acontecendo, é um descaso com as nossas vidas, principalmente com os jovens e as crianças da favela”, declarou Mariana Passos, integrante do Maracatu Encanto do Pina e do grupo Maracatu Baque Mulher. 

Aryelly também participava das ações dos movimentos sociais que atuam na Comunidade do Bode. Com apenas um ano, a criança já integrava e participava das reuniões do maracatu junto com a mãe. Ainda se recuperando da tragédia, Andréa não conseguiu participar do ato desta segunda-feira.

“Andréa ainda está muito abalada. Ela tem ferimentos por várias partes do corpo: cabeça, braço, perna, por isso ela está em casa se cuidando. Mas a pior dor que fica é a perda da filha, a ficha do que aconteceu ainda está caindo e está sendo muito difícil, principalmente, pra ela que tem apenas dezessete anos e já perdeu uma filha dessa forma”, disse Mariana Passos. 

Bastante abalados, o pai de Aryelly, Guilherme Nogueira, e a avó da criança, Joana D’arc Barros participaram da manifestação. “Foi a primeira filha que Deus me deu e esses bandidos levaram. Eu só quero justiça”, declarou o pai da criança.

Ato em memória de Aryelly Lavínia. Na imagem: à esquerda, Joana D'arc, avó da criança. À direita, Mariana Passos. Crédito: Ingrid Veloso / Coletiva Cabras

Para os integrantes das organizações Maracatu Encanto do Pina, Baque Mulher, Coletiva Cabras e Projeto Criança Urgente – Procriu, que organizaram o ato por paz e justiça na Comunidade do Bode, a tragédia do dia 2 de junho é um atestado do cenário de descaso e insegurança que faz parte do cotidiano da população. 

“Esse ato é também uma chamada para o poder público atuar na nossa comunidade através da educação, da convivência cidadã, trazendo oportunidades para as pessoas. Os movimentos sociais estão aqui tentando suprir aquilo que o poder público não dá à comunidade e mesmo assim, com todo nosso empenho, de repente, a vida de uma criança que integra nossos projetos é tirada de uma forma violenta. Não é com violência que vamos resolver e sim trazendo educação e cidadania para essas pessoas”, afirmou Luiz Henrique dos Santos, liderança do Projeto Criança Urgente – Procriu.

De acordo com o levantamento do Instituto Fogo Cruzado, em 2023, já ocorreram 6 tiroteios no bairro do Pina. Ao todo, sete pessoas morreram e três ficaram feridas. No primeiro semestre de 2022, o Instituto mapeou dez tiroteios no bairro. Na época, seis pessoas morreram e duas ficaram feridas. 

A integrante da Coletiva Cabras, Ana Menezes, reforçou do cotidiano violento da Comunidade do Bode, no Pina: “A gente tá passando por um processo de apagamento da vida das pessoas que vivem dentro da favela e nós resolvemos fazer essa mobilização também para trazer visibilidade para a comunidade e para que o poder público possa trazer soluções para a violência. Não chegar com ações truculentas pra dentro do bairro, mas pensar estrategicamente como acabar com a violência”.

“A minha neta era uma criança muito querida na comunidade e graças a ela todo mundo se mobilizou. Eu quero justiça pela minha neta, uma criança que morreu inocentemente, e também pela minha filha que está sofrendo muito. A gente só quer paz”, declarou Joana D’arc Barros, avó de Aryelly. 

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AUTOR
Foto Giovanna Carneiro
Giovanna Carneiro

Jornalista e mestranda no Programa de Pós-graduação em Comunicação da Universidade Federal de Pernambuco.