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Aqueles que apostaram que a greve geral contra a Reforma da Previdência e a Reforma Trabalhista seria esvaziada, erraram feio. Esvaziadas amanheceram as ruas do Grande Recife. Nenhum ônibus circulou, o metro funcionou em horário reduzido, o comércio fechou as portas. Na Conde da Boa Vista, principal via do centro da cidade, a manhã de silêncio e calmaria era o retrato mais evidente de que o Recife parou.
Algumas das principais vias da cidade foram bloqueadas logo cedo por manifestantes: avenidas Recife, Norte, Cruz Cabugá, Caxangá, Conselheiro Aguiar. Nas rádios e TVs locais, a mesma ladainha de sempre: os transtornos no trânsito e a dificuldade dos recifenses de se deslocar até o trabalho. Flashes e mais flashes ao vivo de tudo quanto é lugar para mostrar os “prejuízos” à população.
A pauta, essa rainha dos acontecimentos fabricados nas redações, era o trânsito. A razão de tudo, a Greve Geral e os protestos contra a Reforma da Previdência e a Reforma Trabalhista, apenas um detalhe. Não para os manifestantes que tomaram as ruas centrais de Serra Talhada, Afogados da Ingazeira, Ouricuri, Belo Jardim, Garanhuns e ocuparam trechos da BR-232 em São Caetano, BR-104 em Lajes, BR-101 no Cabo de Santo Agostinho e BR-428 em Santa Maria da Boa Vista. Os sem-mídia registraram suas mobilizações em fotos e vídeos nas redes sociais.
Estes manifestantes sabem que o que está em jogo não é o trânsito de um dia, mas os direitos trabalhistas e previdenciários de uma vida. Estamos falando de mudanças que vão afetar milhões de pessoas por gerações. Mudando a correlação de forças entre capital e trabalho na cidade e no campo assentada em leis trabalhistas consolidadas nos anos 1940 e na Constituição Federal de 1988. E tudo isso acontece num cenário de crise econômica e escalada do desemprego: já são mais de 14 milhões de desempregados no Brasil.
Fim da calmaria
A calmaria das primeiras horas do dia no centro do Recife foi aos poucos sendo substituída, no começo da tarde, pela agitação de milhares de pessoas que chegavam com bandeiras, faixas e cartazes à Praça do Derby, ponto de concentração para a passeata que ocuparia em algumas horas toda a extensão da Avenida Conde da Boa Vista.
Os organizadores da Central Única dos Trabalhadores (CUT) falaram em 200 mil pessoas, mas o número não é verificável. A Polícia Militar não fez nenhum levantamento. O certo é que, para quem esteve presente, a sensação é de que esta foi uma das maiores manifestações realizadas em muitos anos na capital.
A Marco Zero Conteúdo acompanhou a concentração e o trajeto da passeata até a Avenida Guararapes e fez registros em fotos e vídeos. Chamou a atenção a diversidade de sindicatos e organizações profissionais presentes, entre elas a dos auditores fiscais, dos trabalhadores da Justiça Federal, servidores federais da Saúde e da Previdência Social, Ministério Público do Estado, trabalhadores da indústria química, associação dos profissionais de educação física, rodoviários, metroviários, farmacêuticos, professores da Universidade Federal de Pernambuco, professores da Universidade Católica e servidores dos Correios, entre tantos outros.
Lá estavam também as mais diversas organizações da sociedade civil, como o Movimento de Luta nos Bairros, Vilas e Favelas (MLB) e a Frente de Evangélicos pelo Estado de Direito. E a militância dos partidos de esquerda, com bandeiras do PT, do PSOL e do PSTU. Mas também muita gente que não tem ligação direta com sindicatos, nem partidos políticos e que fez questão de sair de casa e ir para a rua protestar contra a agenda de reformas do governo Temer.
Ao voltar para casa e assistir o noticiário, muitos manifestantes devem ter se assustado com o que viram e ouviram. Governo e analistas minimizaram as manifestações, alegaram que elas foram majoritariamente integradas por servidores públicos que temem perder seus “privilégios”. Temer disse que os protestos não mudaram em nada a intenção do governo de aprovar o quanto antes as reformas no Congresso. Na imprensa nacional, o binômio transtorno no trânsito-vandalismo deu o tom da cobertura.
Nada de novo no front?
Aos incautos, convém não subestimar a capacidade de mobilização dos trabalhadores e trabalhadoras organizados. A Avenida Conde da Boa Vista vazia pela manhã e tomada pela multidão à tarde diz alguma coisa. E toda grande cidade brasileira tem sua Conde da Boa Vista..
Co-autor do livro e da série de TV Vulneráveis e dos documentários Bora Ocupar e Território Suape, foi editor de política do Diário de Pernambuco, assessor de comunicação do Ministério da Saúde e secretário-adjunto de imprensa da Presidência da República