Ajude a MZ com um PIX de qualquer valor para a MZ: chave CNPJ 28.660.021/0001-52
Crédito: Facebook ANF
por Mateus Moraes
Com um olhar crítico em relação às dificuldades que atingem as comunidades cariocas, o jornalista, ex-fuzileiro naval e ex-missionário André Fernandes atuou como coordenador da campanha Rio Desarme-se. Esta atuação fez com que ele visitasse e se tornasse conhecido nas favelas e torna-se uma espécie de interlocutor entre a mídia hegemônica, que não tinha acesso aos morros, e as comunidades. A partir deste contexto, há quase 19 anos, André pensou em democratizar o acesso a essas informações e criou a Agência de Notícias das Favelas (ANF).
A
ANF é uma mídia independente que produz
conteúdo a partir da visão
das periferias. A inovação era tão perceptível que, após o
lançamento do primeiro site da ANF, a Reuters noticiava o surgimento
da primeira agência de notícias de favelas do mundo. As principais
mídias do grupo são jornal impresso, portal na internet e redes
sociais.
Além
de mais de quinhentos colaboradores, que têm acesso direto
para publicar conteúdos
no site, a agência
distribui 150
mil exemplares do “A Voz da Favela”, jornal impresso do grupo.
São 50
mil no Rio de Janeiro, 50
mil em Salvador e mais 50
mil no
Recife, a mais nova capital onde a ANF vai atuar dentro das
comunidades. A expectativa é que o número chegue a 200
mil jornais distribuídos em abril, quando será aberta uma sede em
Natal (RN).
Com
uma grande circulação de jornais dentro das comunidades, a
principal fonte de renda da ANF são anúncios que empresas privadas
e órgãos governamentais pagam para ocuparem um espaço no “A Voz
da Favela”. “O Ministério da Saúde, companhias de cimento,
universidades, empresas
de telefonia, os
restaurantes. São diversas áreas. Todo mundo quer se comunicar com
a favela. Quem não quer se comunicar com ela?”, questiona André
Fernandes. O dinheiro arrecadado com a venda dos impressos fica com
as pessoas que os distribuem. Apesar de ser um valor colaborativo,
Fernandes afirma que os vendedores conseguem fazer, em média, R$
1 mil por mês.
Sobre a importância da atuação da agência contra a estigmatização das comunidades como lugar de violência, Fernandes afirma questiona a cobertura da grande mídia que traz sempre abordagens negativas. “A favela é cultura, é potência. A principal festa do país, o carnaval, é movimentada pela favela. Você vê o funk, o rap, e as pessoas que fazem isso estão na favela. A Agência de Notícias das Favelas tem essa percepção e a gente busca falar muito mais disso, já que a gente tem propriedade, do que qualquer outra coisa. A gente mostra o que a favela tem de melhor, mas também denunciamos os abusos governamentais que acontecem”.
O
grande diferencial da Agência de Notícias das Favelas é a formação
que ela oferece para
moradores de periferias que desejam realizar um curso de extensão em
comunicação. São
60
horas de carga horária divididas
em três meses de
aulas. Por
meio de edital, 25
pessoas de 25 diferentes
comunidades são selecionadas para participarem do projeto. As aulas
acontecem em faculdades que fecham parceria com a ANF e o melhor
aluno de cada turma ganha uma bolsa integral para estudar e se formar
em comunicação social – no
Recife, a parceria foi
com a Universidade
Católica de Pernambuco (UNICAP). Ao
todo, cem
alunos já se formaram
por esse sistema.
Após
o término do curso, cada um
dos 25 alunos recebe um
crachá de imprensa da ANF. Além da
produção de três
edições do jornal “A Voz da Favela”, quem participa do programa
passa a ser integrantes de uma Rede de Agentes Comunitários de
Comunicação (RACC), que também é composta por colaboradores da
ANF em vários estados do Brasil. Para André Fernandes, “a RACC é
uma alavanca da ANF no país. É através dela que discutimos e
trazemos conteúdos para o jornal impresso e para o portal”.
Apesar
do crescimento da Agência de Notícia das Favelas, que já conta com
o selo ANF Produções, com o Data ANF e planeja
distribuir meio milhão de jornais em 10 capitais até 2024, o
contexto político
atual do Brasil
preocupa André
Fernandes: “Os abusos
sempre aconteceram, mas está pior. Quando você tem um presidente
que diz que vai colocar seus ministros no pau-de-arara e um
governador que diz que a polícia tem que mirar na cabecinha e os
policiais miram, e matam… isso não foi sempre assim. Perdeu-se o
pudor. Cada vez mais a gente tem que denunciar e ir para cima. Sem
imprensa não tem democracia”.
Com
a visão de quem convive diretamente com a população que está à
margem da vista do poder público, André Fernandes cita um dos funks
cariocas mais conhecidos no Brasil para revelar o maior desejo de
quem vive nos morros: “Eu só quero é ser feliz, andar
tranquilamente na favela onde eu nasci, é, e poder me orgulhar e ter
a consciência que o pobre tem seu lugar”.
É um coletivo de jornalismo investigativo que aposta em matérias aprofundadas, independentes e de interesse público.