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ONG que ocupa casa cedida ao Elefante de Olinda promete deixar o imóvel

Maria Carolina Santos / 03/09/2025
A foto mostra a fachada simples de um prédio baixo, pintado em tom claro. Na parede, em destaque, lê-se em letras maiúsculas “DEFESA ESTADUAL”, acompanhado de um brasão institucional. A porta de entrada é metálica, branca e gradeada, com fechadura visível. Em frente, há um pequeno jardim com plantas ornamentais de folhas pontiagudas sobre solo gramado. À direita, um caminho calçado leva até a porta. O telhado tem beiral de telhas cerâmicas, mostrando sinais de desgaste. Uma árvore aparece à esquerda, projetando sombra sobre parte da construção. O céu ao fundo está claro, com algumas nuvens leves. A cena transmite simplicidade e solidez de um espaço oficial.

Crédito: Arnaldo Sete/Marco Zero

A futura sede do Clube Misto Elefante de Olinda pode ser desocupada em breve. O presidente da ONG que ocupa o imóvel no bairro do Carmo – cedido pelo Governo de Pernambuco ao bloco carnavalesco – procurou hoje a Marco Zero para dizer que vai se mudar. “A gente vai sair de lá. Não quero confusão, nem quero problema pra minha vida com ninguém”, afirmou Paulo Fernando Marinho da Silva, presidente da Defesa Estadual Integrada da Criança e do Adolescente e Garantia dos Direitos das Famílias do Estado de Pernambuco (Deica).

“Eu quero falar com alguém do Elefante para me dar pelo menos dois meses pra eu poder me estabelecer, tirar tudo que é meu, porque tem muita coisa lá. Arrumar outro lugar e sair de boa, tranquilo. Não tem que ter problema, não”, disse, afirmando que a Deica deve alugar um novo espaço.

Paulo Fernando disse que a ONG não invadiu o imóvel, que foi repassado por outra entidade chamada Deca. “A gente funciona aqui desde 1986. Digo a gente porque antes da Deica era a Deca e antes da Deca era DCA, que era a Defesa da Criança e do Adolescente”, disse.

Na semana passada, o clube entrou na Justiça para garantir a reintegração de posse do imóvel, após a Deica ter se recusado a sair extrajudicialmente. “Eles disseram que fizeram benfeitorias lá e que não iriam ‘sair sem nada’. É como se eles estivessem esperando algum tipo de retorno financeiro”, afirmou um dos diretores do bloco, o arquiteto Bruno Firmino, em reportagem publicada ontem pela Marco Zero.

No dia 4 de abril deste ano o Elefante de Olinda enviou uma notificação extrajudicial para a Deica desocupar o imóvel, mas a ONG ignorou o documento. Paulo Fernando, no entanto, afirmou para MZ que não recebeu nenhuma notificação ou contato do bloco para deixar o imóvel – apesar de outras matérias na imprensa local já terem sido publicadas sobre o assunto no mês passado. “Não vale a pena a gente ficar com problema com a Justiça, ficar brigando. É só perda de tempo. É melhor sair de boa, tranquilo, sem confusão, amigável. Quero ser amigo de quem vai entrar (na casa) também. É melhor a gente apoiar quem vai entrar, ajudar em alguma coisa, ser amigo. Não quero confusão nem problema com ninguém”, repetiu.

Reforma irregular, roupa de polícia e doação de remédios

Como a reportagem da Marco Zero mostrou ontem, a Polícia Civil instaurou um procedimento investigativo preliminar para apurar o uso de distintivos, insígnias, fardas ou equipamentos pela Deica que possam se assemelhar aos das forças policiais do Estado. Em várias fotos e vídeos nas redes sociais, funcionários da Deica usam camisetas pretas onde se lê “agente” e usam credenciais que parecem distintivos.

Para a Marco Zero, Paulo Fernando afirmou que a Deica não usa mais a camisa preta com “agente” e que “usa o distintivo da Deica pra se apresentar nos lugares”. Em matéria do Diario de Pernambuco publicada há menos de um mês, Paulo Fernando foi fotografado usando a camisa com insígnia assemelhada à da polícia, com o nome “agente” escrito nela.

A reportagem publicada ontem pela Marco Zero também mostra que a Deica publicou posts em janeiro de 2024 fazendo doação de medicamentos e produtos hospitalares. Em nota, a Agência Pernambucana de Vigilância Sanitária (Apevisa) informou que o armazenamento e a distribuição de medicamentos e produtos hospitalares, mesmo que de forma gratuita por organizações não governamentais (ONGs), só podem ocorrer mediante autorização legal específica.

Para conseguir essa autorização – que a Deica não tinha – a legislação sanitária faz uma série de exigências: autorização de funcionamento emitida pela Anvisa; licenciamento da vigilância sanitária local; responsabilidade técnica de um profissional farmacêutico regularmente inscrito no Conselho Regional de Farmácia; e cumprimento das normas de armazenamento e controle estabelecidas para garantir a qualidade e a segurança dos medicamentos.

De acordo com a Apevisa, qualquer instituição que exerça essas atividades sem as devidas autorizações e condições estabelecidas pela legislação está em situação irregular, sujeita à fiscalização e às sanções cabíveis. “Com relação à ONG mencionada [a Deica], orientamos que seja formalizada uma denúncia por meio dos canais oficiais de atendimento da Apevisa, para que a equipe técnica avalie o caso e, se necessário, realize a fiscalização no endereço informado”, diz a nota para a MZ.

Questionado pela Marco Zero sobre a origem dos medicamentos e produtos hospitalares que aparece doando no vídeo, Paulo Fernando afirmou que não poderia dizer. E que usou o nome do vereador do Recife Alcides Teixeira Neto (Avante) no vídeo porque estava apoiando ele. “Se eu for te falar quem passou os medicamentos para a Deica, eu posso até me prejudicar. Porque aí vocês podem interpretar de outra forma e, daqui a pouco, eu tô pagando preço por causa disso. Comentei o nome dele (Alcides) para dar apoio e levantar a moral dele”, afirmou, dizendo que foi uma ação isolada. “Isso aí já faz dois anos, passou. Não tem remédio mais. Tá faltando até remédio pra mim que eu tô com problema de pressão. Se alguém me doasse medicamento, seria até bom”.

Sobre as obras feitas no imóvel, que está no polígono de tombamento do Sítio Histórico de Olinda e possui regras rígidas para reformas, o presidente da Deica disse que foram substituições de toras de madeira, colocação de portas e grades, colocação de gesso e retirada de rachaduras. “Se fosse esperar (autorização), a casa já tava no chão há muito tempo”, afirmou.

AUTOR
Foto Maria Carolina Santos
Maria Carolina Santos

Jornalista pela UFPE. Fez carreira no Diario de Pernambuco, onde foi de estagiária a editora do site, com passagem pelo caderno de cultura. Contribuiu para veículos como Correio Braziliense, O Globo e Revista Continente. Contato: carolsantos@marcozero.org