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As fortes chuvas que atingiram Pernambuco no último fim de semana também impactaram comunidades tradicionais pesqueiras. De acordo com o Conselho Pastoral dos Pescadores (CPP), devido às enchentes provocadas pelo grande volume de chuvas, famílias inteiras que vivem da pesca artesanal tiveram suas casas alagadas e estão desabrigadas.A preocupação agora é também com o pós-desastre, porque, além da perda de embarcações e materiais de trabalho, a lama compromete a pesca e a coleta dos mariscos e crustáceos.
O buraco dos caranguejos está tomado pela lama em várias localidades. Além disso, uma grande quantidade de caranguejo-uçá apareceu morta na Reserva Extrativista (Resex) Acaú-Goiana, na divisa entre Pernambuco e Paraíba. Em Goiana, na Mata Norte, onde o rio Goiana transbordou (o que não acontecia desde 2014), pescadores e pescadoras denunciam também o aparecimento de problemas de saúde após as enchentes.
Segundo informações do agente pastoral Severino Santos, as chuvas destruíram a comunidade do Baldo do Rio. “A quantidade de água nos estuários põe em risco a atividade e a segurança alimentar das famílias de pescadores das outras cinco comunidades beneficiárias da Resex Acaú-Goiana. Duas dessas comunidades têm na cata do caranguejo sua maior fonte de renda. Em Gongaçari, 70% dos pescadores são catadores de caranguejo. Nas comunidades de Povoação de São Lourenço e Tejucupapo, o número de catadores de caranguejo é bem grande também”, contabiliza.
Laurineide Santana, do CPP , contextualiza a situação: “As pescadoras e pescadores já vêm sofrendo há um tempo. Primeiro foi a contaminação do petróleo, em seguida a pandemia, que ainda nem passou, e agora vem essa situação das chuvas que deixou várias comunidades de Pernambuco em situação de calamidade”.Ela relata que as cidades de Goiana, na Zona da Mata Norte, Igarassu, Jaboatão dos Guararapes, Cabo de Santo Agostinho e Ipojuca, na Região Metropolitana do Recife, são as que estão em estado mais crítico em relação ao número de pescadores desabrigados.
“São várias comunidades atingidas e mais uma vez o governo não tem uma estratégia de acolhimento e atendimento para a categoria dos pescadores, que é tão importante e gera alimentos para todo o estado. Então a gente conta com a solidariedade de amigos e ONGs parceiras”, afirma.
O transbordar dos rios afeta diretamente a atividade pesqueira, que após o impacto causado pelas chuvas deve demorar a se restabelecer. Além disso, muitos materiais utilizados na pesca foram perdidos com as enchentes. Agora, os pescadores e as pescadoras se preocupam com a renda, que ficará comprometida durante um bom tempo, como explica a presidenta da Colônia de Pescadores do Baldo do Rio, em Goiana, Ângela Fonseca: “Quando essa água [da enchente] baixar é que vem o sofrimento do pescador porque o buraco do caranguejo está enterrado, acabou com os buracos dos caranguejos, nada vai ter para pescar no rio por um tempo e como é que a gente faz com os pescadores?”
Ângela teve sua casa coberta pelas águas e agora está em um dos abrigos cedidos pela Prefeitura de Goiana, na escola municipal Doutor Manoel Borba, localizada no centro da cidade. A pescadora relata que falta estrutura no acolhimento, pois algumas pessoas ainda estão sem colchões e roupas, além de haver atraso na distribuição das refeições. Outro problema exposto por ela diz respeito a uma questão de saúde. “A gente está com uma coceira que a gente ainda não sabe o que é, o hospital está cheio de crianças e mulheres com essa coceira e estamos sofrendo”, disse.
A Prefeitura de Goiana repassou que, até a terça-feira, 31 de maio, havia 545 pessoas desabrigadas na cidade. A gestão municipal disponibilizou três escolas municipais para acolher as vítimas das enchentes. A cheia do Rio Goiana atingiu as comunidades do Baldo do Rio, Bom Tempo, Vila Operária e Rua da Impoeira, onde as casas foram invadidas pelas águas e as famílias tiveram que sair às pressas. Não há nenhuma confirmação de mortos ou desaparecidos.
Com o nível do rio, que transbordou no último domingo, 29 de maio, voltando a baixar, algumas famílias já se preparam para retornar às suas casas, mas ainda com muitas dificuldades para enfrentar. “A nossa grande preocupação é nas próximas semanas quando essas famílias voltam para os seus lares, mas continuam com muitos problemas. Muitas perderam tudo, perderam comida, móveis, materiais de pesca, embarcações e a gente só conta com a solidariedade dos parceiros porque o estado não tem uma política para atender de forma emergencial a nossa categoria”, reforça Laurineide Santana.
Para a assessora jurídica do CPP, Ornela Fortes, a falta de ações de monitoramento e diálogo com as comunidades pesqueiras pelo poder público agrava ainda mais as consequências causadas pelas enchentes. “O que a gente percebe, nas várias comunidades pesqueiras que foram atingidas nesse primeiro momento, é a falta de coordenação do governo do estado no levantamento dos impactos e na articulação com as prefeituras para saber o que essas comunidades precisam a curto, médio e longo prazos. Isso é bastante angustiante porque essa falta de coordenação faz com que essa relação de vulnerabilidade abra espaço para mais situações de desigualdade e para mais violação de direitos”, declara Ornela.
A fim de amenizar os problemas gerados por consequência das chuvas, o Conselho Pastoral dos Pescadores criou uma campanha de arrecadação de donativos para as famílias de pescadores e pescadoras de Pernambuco.As doações podem ser feitas na Associação das Marisqueiras da Povoação de São Lourenço, em Goiana, ou na Sede do Conselho Pastoral dos Pescadores, localizada na Avenida Governador Carlos de Lima Cavalcante, 4688, em Rio Doce, Olinda.
Os itens solicitados são: materiais de limpeza e higiene pessoal, colchões, lençóis e alimentos em geral.
Doações em dinheiro também podem ser feitas através do pix: 042.572.374-73, no nome de Edjane Agostinho da Silva. Mais informações podem ser encontradas nas redes sociais do CPP.
Esta reportagem foi produzida com apoio doReport for the World, uma iniciativa doThe GroundTruth Project.
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Jornalista e mestra em Comunicação pela Universidade Federal de Pernambuco.
Vencedora do Prêmio Cristina Tavares com a cobertura do vazamento do petróleo, é jornalista profissional há 12 anos, com foco nos temas de economia, direitos humanos e questões socioambientais. Formada pela UFPE, foi trainee no Estadão, repórter no Jornal do Commercio e editora do PorAqui (startup de jornalismo hiperlocal do Porto Digital). Também foi fellowship da Thomson Reuters Foundation e bolsista do Instituto ClimaInfo. Já colaborou com Agência Pública, Le Monde Diplomatique Brasil, Gênero e Número e Trovão Mídia (podcast). Vamos conversar? raissa.ebrahim@gmail.com