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Foto de um trecho da avenida Norte, no Recife, durante o dia, iluminada pelo sol. À direita, há um muro com raízes de árvore crescendo junto dele e uma pintura azul desbotada. Uma árvore robusta está parcialmente visível, com muitas de suas folhas amarelas caídas no chão, criando um tapete natural ao longo da calçada e da rua. Ao fundo, carros estão estacionados ao lado de edifícios baixos sob um céu claro.

Crédito: Arnaldo Sete/MZ Conteúdo

Quem tentou matar duas grandes árvores na avenida Norte?

Inácio França / 03/05/2024

Crédito: Arnaldo Sete/MZ Conteúdo

O mais provável é que a pergunta que dá título a este texto nunca seja respondida, mas a secretaria municipal de Meio Ambiente deu início a uma “investigação administrativa para, em caso de confirmadas quaisquer irregularidades, proceder com as medidas cabíveis”. As árvores em questão são dois Ficus na calçada da avenida Norte Miguel Arraes de Alencar na altura do número 3698, entre o cruzamento com a rua Cônego Barata e a esquina com a rua Silveira Lira, na Tamarineira,

No final de abril, entre a sexta-feira, dia 20 e o sábado, 21, os vizinhos começaram a perceber que as folhas das árvores estavam caindo em velocidade e quantidade incomuns, ao ponto da calçada ficar coberta por uma grossa camada de folhas secas que logo espalharam-se pela própria avenida. Durante a semana seguinte, as copas das duas plantas foram ficando cada vez amareladas e, em seguida, despidas.

Especialista em arborização urbana e professora de Recursos Florestais e Engenharia Florestal e Ciências Ambientais na Universidade Federal Rural de Pernambuco (UFRPE), Isabelle Jacqueline Meunier não acredita que as árvores tenham sido vítimas de pragas ou qualquer outro fenômeno natural:

“Isso não parece qualquer evento natural. Pela rapidez e extensão, foi um produto bastante tóxico. Talvez glifosato, mas querosene e gasolina são produtos usados por quem pretende erradicar uma árvore desse porte sem autorização. Seria interessante saber se há algum processo na prefeitura para abertura de entrada de veículos no local, ou mesmo um pedido de erradicação que possa ter sido negado”, comentou a professora.

Segundo ela, “o problema desse tipo de provável crime ambiental é a dificuldade do flagrante e de provas posteriores. O poder público também não se esforça para ter meios de investigação, nesse caso, procurar câmaras de segurança, por exemplo”. Para complicar ainda mais, não há laboratório público no Recife que faça análise química do solo e das folhas das plantas. Só assim seria possível ter certeza se algum desfoliante foi usado contra as duas árvores.

No Recife, quem tem pretende podar ou cortar uma árvore em calçada precisa dar entrada em um pedido à Autarquia de Manutenção e Limpeza Urbana (Emlurb). Lá, no entanto, ninguém pediu autorização para dar fim aos dois Ficus da avenida Norte. A secretaria municipal do Meio Ambiente também não recebeu nenhum pleito, mas repassou a informação que consta no primeiro parágrafo deste texto.

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De acordo com a Fiocruz, o glifosato foi criado nos anos 1950 pela indústria farmacêutica, mas o princípio ativo ficou conhecido nos anos 1970, quando a empresa Monsanto – hoje pertencente à Bayer – desenvolveu um poderoso herbicida. Suas vendas estouraram quando a companhia lançou sua linha de sementes transgênicas Roundup, resistentes ao glifosato, nos anos 1990. Há estudos que relacionam o o glifosato ao câncer e a outras doenças. A Bayer, inclusive, já foi condenada na justiça americana sob essa alegação.

Já os desfoliantes são substâncias químicas que induzem a queda prematura das folhas. Para além de usos agronômicos, também tem uso militar para desfoliar zonas florestais e aumentar a visibilidade para os exércitos. O exemplo clássico de desfoliante altamente tóxico é o “agente laranja”, ou ácido diclorofenoxiacético, usado pelas forças armadas dos Estados Unidos na guerra do Vietnã.

Final feliz (por enquanto)

Tudo indica, contudo, que as duas árvores continuarão com as sombras de suas copas sobre os carros, motos e ônibus que passam naquele trecho da avenida Norte. Nos primeiros dias de maio, as folhas passaram a cair em um ritmo mais lento.

É difícil matar um Ficus. Às vezes, nem com motosserra é possível, pois é comum a planta voltar a brotar mesmo com o caule serrado. Quando isso acontece, é preciso arrancar o que sobrou com ajuda de trator e correntes.

Uma coisa é certa: já não se considera uma boa ideia plantar Ficus em calçadas nem em quintais ou em jardins. Natural do sudeste asiático, o Ficus se tornou muito popular no Brasil – principalmente a espécie Ficus benjamina – por sua beleza, imponência – não é incomum alcançar 30 metros de altura (o equivalente a um prédio de 10 andares) e por suportar o clima tropical e temperaturas médias de 30 graus.

O problema está nas raízes que, bastantes agressivas, danificam estruturas, calçadas, muros, paredes, pavimentos e tubulações subterrâneas. Em várias cidades brasileiras seu plantio já foi proibido. No Recife, os técnicos da prefeitura recomendam não plantá-la.

AUTOR
Foto Inácio França
Inácio França

Jornalista e escritor. É o diretor de Conteúdo da MZ.