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Por Helena Dias e Raíssa Ebrahim
Diálogo, reconexão com as bases e garantia das instituições são alguns dos desafios da frente de oposição que começou a se desenhar ainda no segundo turno e, agora, precisará se fortalecer no Congresso e nas ruas. Eleito com 55% dos votos válidos neste domingo (28), Jair Bolsonaro (PSL), capitão da reserva, inaugura oficialmente em 1º de janeiro de 2019 uma era de extrema-direita no Brasil.
O sentimento anti-PT marcou uma campanha eleitoral dominada pelas fake news e colocou o Supremo Tribunal Federal (STF) e o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) à prova. Agora, o resultado das urnas ameaça as minorias, a liberdade e a manutenção do estado democrático de direito. O tom violento e ameaçador da campanha de Bolsonaro – que se voltou contra ele mesmo no episódio da facada – dá indicativos de como o seu governo será construído nos próximos quatro anos.
Em seu discurso pós-resultado, o candidato derrotado Fernando Haddad (PT) pediu respeito aos milhões de eleitores que votaram pela democracia. Exaltando a coragem e parafraseando o hino nacional, ele declarou: “Verás que um ‘professor’ não foge à luta”. O ex-ministro da Educação e ex-prefeito de São Paulo se posiciona, após as eleições, como uma das principais referências no campo da oposição ao futuro governo Bolsonaro. “Nós temos uma tarefa enorme no país que é, em nome da democracia, defender o pensamento e as liberdades desses 45 milhões de brasileiros que nos acompanharam até aqui”, disse o petista.
Bolsonaro, em sua primeira fala como presidente eleito, ao vivo nas redes sociais, agradeceu primeiramente a Deus, que “pelas mãos de médicos, enfermeiros e profissionais de saúde” o trataram operando “um verdadeiro milagre” para que ainda estivesse vivo. O ex-militar disse estar certo das condições de governabilidade e enfatizou que mudará o destino do Brasil tendo Deus de um lado e a Constituição do outro, inspirado “em grandes líderes mundiais”, juntamente com uma “boa assessoria técnica e profissional isenta de indicações políticas”.
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Bancadas na Câmara e no Senado
Nestas eleições, apesar de o PT ter diminuído sua bancada na Câmara dos Deputados, de 69, em 2014, para 56, em 2018, ainda é o partido com mais parlamentares. Depois vem o PSL, que saltou de um para 52 deputados federais – são os dois partidos com as maiores bancadas. Em seguida, vem o PP com 37 e o MDB, partido que mais encolheu, com 34 deputados (antes eram 66). O PSDB também saiu menor, perdeu 25 assentos (de 54 para 29). PDT tem 28, Psol 10, PCdoB 9, PROS 8 e Avante 7.
Já no Senado, MDB (12) , PSDB (9), PSD (7), DEM (6) e PT (6) serão, em janeiro, os partidos com mais representantes, considerando também os senadores que já tinham sido eleitos em 2014. PCdoB, Psol e Avante não terão nenhum representante no Senado. PDT terá 4 e PROS, 1.
* PMDB virou MDB, PEN virou PATRI, PTdoB virou AVANTE, PTN virou PODE, PSDC virou DC
Lideranças partidárias
A Marco Zero Conteúdo perguntou a algumas lideranças do PT, PCdoB, Psol, PSB e Avante quais são os desafios que estão postos para a construção de uma frente ampla de oposição e qual o peso que a mobilização das ruas terá a partir de agora.
Humberto Costa (PT)
Estávamos trabalhando com a perspectiva de ganhar as eleições. Tínhamos que tentar ganhar para poder conversar. Pode crer que vai ter uma oposição dura, uma oposição em defesa da democracia, das liberdades democráticas. Para isso, as ruas vão ser algo importante. Acho que as pessoas não vão aceitar de forma nenhuma que haja ataque aos seus direitos. E, assim, vamos construindo esse caminho, mas nós precisamos sentar com as outras forças para construir em conjunto. Nós vamos fazer uma avaliação deste processo eleitoral e deste resultado.
A nossa posição é muito cristalina: fazer oposição a esse governo fascista de Bolsonaro. Vamos continuar a defesa da democracia e da liberdade, dos direitos sociais. Precisamos entender melhor este processo, mas está tudo muito claro para a gente. Vamos avaliar como vai ser, conversar com diversos segmentos. A campanha no segundo turno foi muito além do PT, vamos seguir o diálogo e, naturalmente, o PT vai fazer uma defesa do que sempre defendeu. A eleição acabou agora, amanhã (segunda-feira 29) teremos reunião da executiva. Vamos depois reunir as frentes que nos apoiaram, Frente Brasil Popular e Frente Povo Sem Medo, fazer uma conversa que extrapola o PT.
Danielle Portela (Psol)
Na nossa bancada na Câmara dos Deputados, eu digo que nós tínhamos seis deputados federais que mais pareciam 60. Uma bancada muito combativa e nós conseguimos ampliar de seis para dez deputados. O Psol cresceu e o PT, apesar de toda perseguição, também cresceu. Então, temos partidos que saíram da vitória nas urnas em muitas frentes. A gente vai ter um Congresso muito difícil. Estamos entrando num período da história de tempos sombrios e nós queremos, enquanto partidos políticos, ser atores e autores das nossas próprias histórias.
Tiramos como lição a necessidade dos partidos voltarem para sua tarefa primordial, que é a volta às bases. Voltar para as cidades do interior de todo país. Olhar no olho das pessoas e resgatar não só a representatividade em uma pessoa ou em um político ou projeto, mas a representatividade na democracia. Principalmente, no poder popular. Precisamos resgatar a esperança. Os desafios destes partidos agora é se organizar. Resistir, trazer esperança e não desistir nunca.
Não é possível se acovardar. Nós somos um povo muito revolucionário. É hora de se aquilombar no sentido de se unir, se juntar e se fortalecer. Mas, quilombo enquanto espaço de resistência de todas as formas de organizações políticas, partidárias ou suprapartidárias. Resistência a toda forma de retirada dos nossos direitos. Diante desse ódio, diante do aumento da intolerância, a gente não tem que se esconder, temer ou recuar.
Sileno Guedes (PSB)
O primeiro passo internamente no PSB é se reunir. Fomos para o segundo turno com quatro candidatos a governador, não tivemos êxito. Vamos agora discutir como as bancadas irão se comportar e depois começar a pensar em táticas, planejamentos para o futuro, afinado e alinhado com o que a sociedade quis falar. Muita gente se posicionou, mas muita gente se absteve e votou branco e nulo. Com a situação e o tamanho do Brasil, esse quadro de afastamento é muito preocupante. Isso também é responsabilidade dos partidos, então algo precisa ser sintonizado.
O alinhamento, a formação de frente, de bloco, isso tudo vai acontecer naturalmente e de acordo com o que vai ser apresentado. A pauta eleitoral foi muito ruim, não se discutiu pilares da economia, educação, ciência, meio ambiente… Mas a eleição passou. Agora vem o debate da gestão. Acredito que essa eleição é mais um passo para consolidar a democracia.
Silvio Costa (Avante)
A primeira missão da oposição é respeitar o resultado das urnas. A segunda é fazer oposição com responsabilidade, pensando no país, e não nos partidos. O país, mais uma vez, saiu dividido das urnas. O Brasil não aguenta mais quatro anos de radicalização. Defendo que quem está na oposição faça uma oposição dentro da Constituição.
A função básica da oposição é fiscalizar. Temos que fiscalizar a democracia e as ações do governo Bolsonaro. Defendo que a oposição jogue a bandeira da pacificação nacional. Agora nasce um novo líder da oposição, Haddad. Mas temos que esperar decantar, vai haver uma disputa aí. Ciro Gomes (PDT), por exemplo, teve uma atitude que eu particularmente não gostei, acho que ele cometeu um erro histórico. Outra questão fundamental é a vitória de Dória em São Paulo, que vai ter efeitos colaterais no PSDB, e acho que vai nascer um novo centro democrático no Brasil, um novo debate, uma nova esquerda brasileira.
Bolsonaro vai assumir em janeiro, a oposição tem que esperar o tempo administrativo, os primeiros seis meses, para ver qual a agenda de país, os ministérios, as formas de diálogo com o Congresso.
Luciana Santos (PCdoB)
A presidenta do PCdoB e vice-governadora eleita de Pernambuco disse, em nota, que a chapa Haddad e Manuela “catalisou uma tomada de posição da consciência democrática da nação, lançando as bases de uma oposição vigorosa que começa agora”. Luciana lembrou a ameaça a instituições, garantias constitucionais, liberdade de imprensa, manifestações, organizações partidárias e autonomia das universidades, além da violência, do ódio e do financiamento às fake news. “Tais ilicitudes, entre outras, interferiram no resultado das urnas. Com toda razão, estão em processo de inquérito na Justiça Eleitoral, da qual se espera profunda e ágil instrução com decisões consoantes a gravidade do ocorrido”, escreveu.
“A resistência, a oposição vigorosa, deve ser organizada no âmbito de toda a vida política e social do país, a começar pelo Congresso Nacional e outras casas legislativas, se estendendo para os movimentos sociais, as organizações da classe trabalhadora, segmentos do empresariado, o universo acadêmico, a intelectualidade, os artistas, o mundo jurídico, setores religiosos e, inclusive, para os integrantes de instituições da República. Os governadores e os prefeitos do campo democrático terão importante papel nesta empreitada”, complementou.
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