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Priscila usa dado inadequado para apontar desigualdade no Recife

Sérgio Miguel Buarque / 19/08/2016

02_perai_corSite“Se traçar um raio de 1,5 km a partir de qualquer ponto no mapa do Recife, você vai encontrar uma comunidade carente” – Priscila Krause (DEM), na sua página no Facebook, em 10 de agosto de 2016

A deputada estadual e candidata da coligação “O Recife Acredita (DEM/PMN)” postou a afirmação na suapágina oficial no Facebook para mostrar que a capital pernambucana é uma cidade “cheia de desigualdades” e que, por conta disso, precisaria “ser administrada para todos, com atenção prioritária paras as áreas mais carentes”.

Procurada pelo Truco Eleições 2016 – projeto de fact-checking da Agência Pública, no Recife feito em parceria com aMarco Zero Conteúdo–, a assessoria da candidata respondeu que Priscila baseou sua declaração noPlano Setorial de Uso e Ocupação do Solo do Recife, de 1995, citado no artigo“Modelos de estrutura socioespacial urbana e práticas estatais de intervenção em favelas no Recife”, de Mauro Normando de Macêdo Barros Filho. O dado, ainda segundo a assessoria da candidata, também foi citado na elaboração da política de segurança pública do governo estadual no biênio 2007/2008.

O Truco Eleições 2016 checou a declaração da candidata, as fontes citadas por sua assessoria, consultou especialistas e verificou que ela está correta, mas que falta contexto. Recebe, portanto, a carta “Tá certo, mas peraí”.

Realmente, nenhum ponto do Recife está distante mais de 1,5 km de uma comunidade carente, como afirmou Priscila Krause. Tomando por base o artigo citado pela assessoria da candidata, esse raio seria ainda menor, medindo 1,2 km. O autor do artigo, Mauro Normando de Macêdo Barros Filho, extraiu o número do Plano Setorial de Uso e Ocupação do Solo do Recife, um documento de 1995.

Para o arquiteto e urbanista Wherter Ferraz, consultor de projetos de urbanização de assentamentos precários e pesquisador doInciti (Pesquisa e Inovação para as Cidades da Universidade Federal de Pernambuco – UFPE), o estudo de Barros Filho ainda é válido, mesmo tendo sido feito há mais de 20 anos. Para ele, o problema na afirmação de Priscila Krause é usar o dado em um contexto para medir a desigualdade na cidade. Para isso, existem indicadores mais precisos, como oíndice de Giniou o percentual de população que mora em assentamento sub-normal, do IBGE.

Em ambos os critérios, por sinal, Recife aparece como uma cidade muito desigual. No índice de Gini [éum instrumento usado para mediro grau de concentração de renda e queaponta a diferença entre os rendimentos dos mais pobres e dos mais ricos. Ele é medido de 0 a 1. Quanto mais próximo de 1, maior a desigualdade]. Recife aparece com 0,6894 (censo de 2010), sendo a capital mais desigual do Brasil.

Segundo Wherther, o que o dado apresentado pela candidata do DEM expressa com precisão é o fato das “comunidades carentes” estarem pulverizadas no Recife e, consequentemente, próximas de áreas onde moram as pessoas de maior renda. Para o pesquisador, diferentemente do que dá a entender a afirmação de Priscila Krause, essa proximidade pode ser vista como algo positivo para a cidade. “Mostra que não houve ainda um processo completo de segregação. No fundo, trata-se de uma visão higienista”.

(Sérgio Miguel Buarque · Carol Seixas)

AUTOR
Foto Sérgio Miguel Buarque
Sérgio Miguel Buarque

Sérgio Miguel Buarque é Coordenador Executivo da Marco Zero Conteúdo. Formado em jornalismo pela Universidade Católica de Pernambuco, trabalhou no Diario de Pernambuco entre 1998 e 2014. Começou a carreira como repórter da editoria de Esportes onde, em 2002, passou a ser editor-assistente. Ocupou ainda os cargos de editor-executivo (2007 a 2014) e de editor de Política (2004 a 2007). Em 2011, concluiu o curso Master em Jornalismo Digital pelo Instituto Internacional de Ciências Sociais.