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Cinco recomendações da Repórteres Sem Fronteiras aos prefeitos eleitos para proteger a liberdade de imprensa

Marco Zero Conteúdo / 02/12/2020

Por Repórteres Sem Fronteiras

Com o fim da votação em segundo turno, as cidades brasileiras já sabem quem as governará nos próximos 4 anos. Os prefeitos assumem seu mandato com diversos desafios e num contexto especialmente complexo estabelecido pela pandemia da Covid-19. Além de dilemas na qualidade e na adequação dos serviços de educação e de saúde ofertados pelos municípios, o direito ao acesso à informação também vem sendo negado no cenário atual. Foi o caso no Rio de Janeiro, onde funcionários da atual gestão municipal, que passaram a ser conhecidos como “guardiões do Crivella”, organizavam plantões em frente a hospitais da cidade com o objetivo de evitar que jornalistas fizessem entrevistas e informassem sobre falhas no sistema.

Cabe lembrar que é dever dos prefeitos eleitos, chefes do poder executivo no nível municipal, administrar a cidade pela qual foram eleitos, cobrando impostos e taxas; custeando obras, serviços e políticas essenciais para a vida nesta cidade; e garantindo que chegue à população todo tipo de informação que seja de interesse público.

Considerando o papel dos prefeitos estabelecido pela constituição brasileira, trazemos 5 recomendações para que os candidatos eleitos cumpram com seus compromissos de campanha e garantam à população todos os seus direitos, dentre eles o acesso à informação, a liberdade de expressão e a liberdade de imprensa.

Assim como colocado aos vereadores eleitos, a RSF acompanhará seus mandatos, fiscalizará o cumprimento destas recomendações e se prontifica, sempre que possível, a acompanhar e a orientar a implantação das medidas em consonância com estas recomendações. 

Recomendação nº 1 – A garantia do direito à informação e o compromisso com a transparência

Decisões reiteradas do judiciário brasileiro denunciam a inconstitucionalidade de se impedir ou dificultar o acesso de jornalistas ou veículos de comunicação a documentos e informações de interesse público em posse dos órgãos de Estado, ou ainda de impedir ou dificultar o acesso do público a conteúdo jornalístico publicado ou a ser publicado. Conhecidas como “censura prévia” ou “chilling effect” (efeito inibidor), estas práticas são interpretadas pelo Supremo Tribunal Federal como inconstitucionais e devem ser coibidas.

A RSF recomenda aos prefeitos que combatam qualquer tipo de censura, que reforcem os valores constitucionais das liberdades de expressão e de imprensa e que garantam a transparência do dados acerca da sua gestão, tanto por meio de políticas públicas, quanto pelo instrumento do veto, sempre que alguma lei ameace atingir estes princípios direta ou indiretamente em seus municípios.

A RSF espera que os partidários de seus mandatos comunguem desses mesmos valores e práticas, e que sejam afastados das funções públicas caso assim não procedam.

Recomendação nº 2 – O combate à perseguição a jornalistas e o compromisso com a proteção e a segurança dos profissionais da mídia

Na posição 107 da lista de 180 países do ranking da Repórteres sem Fronteiras em 2020, o Brasil é um país sensível para o exercício da atividade jornalística, em que não são raros ataques a jornalistas no estrito cumprimento de suas funções, incluindo agressões verbais, físicas e até assassinatos. É importante ressaltar que a agressão contra um jornalista na sua missão de levar informações ao público configura uma agressão a toda a sociedade e, por isso, precisa ser combatida veementemente pelas políticas de Estado. A RSF recomenda que os prefeitos implantem ou mantenham atualizadas plataformas digitais com informações específicas de ameaças, perseguições e agressões a jornalistas nos seus respectivos municípios. 

A RSF recomenda ainda que os prefeitos promovam campanhas públicas e, em parceria com a iniciativa privada, congressos e simpósios para esclarecer a população sobre a relevância da atividade jornalística e da gravidade envolvida no crime de ameaçar ou agredir os profissionais que exercem essa atividade.

Recomendação nº 3 – O uso ético e transparente da verba publicitária 

Outra forma de promover censura indireta à imprensa é a destinação de verbas publicitárias por parte do poder público a veículos de comunicação. A ausência de proporcionalidade, de coerência ou ainda a inexistência de critérios sólidos na destinação dessas verbas pode tornar um veículo de comunicação totalmente dependente da esfera pública ou desidratá-lo financeiramente, comprometendo a independência editorial e a qualidade das informações publicadas.

Ao concentrar ações de publicidade em alguns poucos veículos, no lugar de pulverizar essas ações em canais diversificados, a administração pública pode acabar impedindo que informações confiáveis cheguem a um número maior de pessoas, cerceando o direito da população à informação. A RSF solicita ao prefeito que exponha de forma clara e objetiva em todos os canais de comunicação do governo a prestação de contas específica das verbas publicitárias destinada a veículos de mídia. Esta prestação deve detalhar quais os veículos de comunicação escolhidos, a quantidade de verba destinada a cada um, os critérios de escolha adotados, e, eventualmente, as autorizações de despesas extras para esse fim.

A RSF recomenda que haja proporcionalidade na utilização da verba publicitária, evitando destinações seletivas ou privilegiadas, em especial no tocante a sites, blogues e demais veículos de comunicação na internet.

A RSF destaca que verbas publicitárias não devem ser destinadas a veículos de comunicação cujos sócios ou jornalistas responsáveis possuam vínculo societário ou parentesco com o prefeito, seus parentes, dirigentes de seu partido, ou funcionários da sua administração.

Recomendação nº 4 – O relacionamento adequado e respeitoso com a imprensa

A defesa dos valores e princípios constitucionais relacionados às liberdades de expressão e de imprensa precisa ser uma prática diária de toda autoridade pública. E um primeiro passo nesta direção é o próprio trato do gestor público com os profissionais de imprensa.

A RSF recomenda que o prefeito e todos os servidores e funcionários de sua administração se valham de cordialidade e respeito no trato com o profissional de imprensa e com os veículos de comunicação, de forma geral e irrestrita. Espera-se, ainda, que nenhum representante direto ou indireto da gestão atue de forma seletiva: nem confira privilégios na concessão de entrevistas, nem bloqueie o acesso de jornalistas ou veículos de comunicação a locais públicos durante suas coberturas.

Recomendação nº 5 – O incentivo às produções locais e independentes, e à pluralidade no campo jornalístico

Estima-se que cerca de 2/3 dos municípios brasileiros não tenham qualquer produção jornalística autônoma, são os chamados desertos de notícias (ver a pesquisa completa: Atlas da Notícia do Instituto Projor). Na prática, esse fenômeno que isola os indivíduos e impede que possam se identificar com as informações que acessam, se dá por diversas razões, dentre elas a ausência de investimento na produção jornalística local e de incentivos a produções independentes. A RSF defende que a informação circule ampla e livremente também fora dos grandes centros urbanos, de modo a tornar mais democrático o exercício das liberdades de expressão e de imprensa no Brasil. 

A RSF recomenda que os prefeitos eleitos destinem verba publicitária específica a produções jornalísticas locais independentes e a programas televisivos, jornais, revistas e canais de internet que retratem a realidade sociocultural e política do município. A RSF espera também que os prefeitos promovam e incentivem campanhas, premiações e projetos que estimulem a visibilidade e a audiência das mídias locais, e das produções jornalísticas independentes existentes no município.

AUTOR
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Marco Zero Conteúdo

É um coletivo de jornalismo investigativo que aposta em matérias aprofundadas, independentes e de interesse público.