O Governo Federal começou a rodar oito cidades do país, dos seis biomas brasileiros, para ouvir propostas da população sobre como combater as mudanças climáticas. As sugestões serão analisadas e, caso aprovadas, algumas delas podem compor o Plano Clima, o guia da política climática brasileira até 2035. A primeira plenária aconteceu na última quinta-feira (1º de agosto), no Recife, quando dez representantes da sociedade civil de Pernambuco subiram ao palco para apresentar oito propostas para o Sistema Costeiro-Marinho, que compreende as áreas de intersecção entre os oceanos e o continente.
A Marco Zero estava lá e detalha aqui as oito ideias apresentadas.
Até o dia 15 de agosto, qualquer pessoa com CPF pode apresentar três propostas e votar em dez outras registradas pelos demais participantes. Também há espaço para comentários. A elaboração do Plano Clima é conduzida pelo Comitê Interministerial sobre Mudança do Clima (CIM), integrado por representantes de 22 ministérios, pela Rede Clima e pelo Fórum Brasileiro de Mudança do Clima, e tem dois pilares principais: a redução das emissões de gases de efeito estufa e a adaptação de cidades e ambientes naturais às mudanças do clima.
O Sistema Costeiro-Marinho abrange toda a costa brasileira, desde a foz do rio Oiapoque (AP) até a foz do rio Chuí (RS), abrangendo o litoral de 17 estados. É um bioma predominantemente composto por sua parte marítima, sendo a porção continental equivalente a apenas 6,27% da sua área total.
Quais as propostas da sociedade civil pernambucana:
Defesa dos territórios tradicionais pesqueiros: “Construção e efetivação de políticas de regularização fundiária e proteção dos territórios de povos e comunidades tradicionais que têm um papel fundamental na manutenção do ecossistemas costeiro marinho bem como os demais biomas com garantia de recursos para efetivação dessas políticas e construção de protocolos de adaptação e contingência em relação a crise climática”, propôs Maria Aparecida de Santana, do Movimento de Pescadores e Pescadoras Artesanais e da Articulação das Pescadoras de Pernambuco.
Oceanos e zonas costeiras, comunidades ribeirinhas: “Precisamos estabelecer áreas protegidas e garantir a titularização fundiária das comunidades tradicionais pesqueiras, promovendo justiça climática e respeitando os direitos de quem vive e trabalha nesses ambientes. É crucial que utilizemos os recursos marinhos de forma sustentável, criando regras para evitar a poluição e a destruição de habitats. As mudanças climáticas exigem uma resposta urgente, é fundamental que adotemos implicações mais duras para os empreendimentos que violam as leis”. Esta foi proposta por Karla Avelino e Edson Fly, representando a Colônia de Pescadores e Núcleo de Comunicação Caranguejo Uçá.
Criação de Conselhos de Limpeza Urbana sensíveis ao bioma Costeiro-Marinho: “Esses conselhos seriam responsáveis por promover práticas de limpeza urbana que considerem a sustentabilidade e a proteção dos ecossistemas costeiros. Além disso, eles realizariam iniciativas de promoção de políticas públicas municipais, garantindo a inclusão e escuta da população local afetada”, propôs Anne Justino, do Laboratório Tapioca.
Defesa e valorização das comunidades tradicionais costeiras, especialmente as comunidades pesqueiras artesanais: “Provisão de recursos para povos e comunidades tradicionais costeiras para a preparação prévia e contextualizada para ações de emergência e proteção social; adaptação das moradias, estruturas de apoio ao trabalho e de acesso ao território; reconhecimento dos territórios; sistemas emergenciais comunitários de proteção à vida, como abrigos, centrais de donativos e cozinhas comunitárias; estabelece um fundo rotativo emergencial; geração de trabalho e renda na reconstrução; defesa de defensoras(es)”, apresentou Matthews Rocha, da organização Tecendo Redes na Pesca Artesanal.
Adaptação climática antirracista: “Adaptação climática antirracista é o enfrentamento às desigualdades raciais, de gênero, geracionais, sociais, regionais e territoriais, a partir de um conjunto de políticas públicas estruturantes, interseccionais e intersetoriais. Essas políticas devem ter como foco assegurar o bem viver, a proteção das vidas vulnerabilizadas e a conservação dos biomas, através de medidas estruturais e emergenciais que reduzam o impacto dos eventos climáticos extremos para as populações mais vulnerabilizadas”, defenderam José Victor e Joice Paixão, em nome da Articulação Negra de Pernambuco, Rede Adaptação Antirracista, Movimento Negro Evangélico do Brasil e Observatório Popular de Injustiças Climáticas.
Incentivo à tecnologia verde no redirecionamento dos resíduos sólidos: “Destinar recursos para municípios realizarem o cumprimento da lei de resíduos sólidos respeitando as particularidades dos que possuem biomas Costeiros-Marinhos, uma vez que a não destinação correta interfere na manutenção desses biomas. Estimular a criação de conselhos de limpeza urbana sensíveis ao bioma Costeiro-Marinho”, propõe o Movimento Saluz, representado no evento por Rebheka Nunes Quintão.
Financiamento para agentes populares ambientais: “Delimitar parte do recurso do Fundo Clima para financiar atores sociais que desenvolvam ações ambientais e climáticas nas comunidades tradicionais e periferias das cidades, valorizando a educação popular já construída na base”, defendeu Laís Araújo, do Xô Plástico.
Criação de áreas marinhas protegidas para recuperação dos recifes de coral e de recursos pesqueiros: “Os recifes de coral estão em declínio devido às mudanças climáticas e o uso desordenado das zonas costeiras. Criar áreas marinhas protegidas (AMPs) é crucial para preservar a biodiversidade e permitir a recuperação natural dos ecossistemas. Essas áreas aumentam a biomassa e sustentam recursos pesqueiros, beneficiando as comunidades locais. Além disso, as AMPs promovem uma gestão costeira integrada, destacando a necessidade de um oceano limpo e resiliente às mudanças climáticas”. Esta proposta foi registrada pelo Instituto Recifes Costeiros e defendida por Ana Lídia Gaspar.
Vencedora do Prêmio Cristina Tavares com a cobertura do vazamento do petróleo, é jornalista profissional há 12 anos, com foco nos temas de economia, direitos humanos e questões socioambientais. Formada pela UFPE, foi trainee no Estadão, repórter no Jornal do Commercio e editora do PorAqui (startup de jornalismo hiperlocal do Porto Digital). Também foi fellowship da Thomson Reuters Foundation e bolsista do Instituto ClimaInfo. Já colaborou com Agência Pública, Le Monde Diplomatique Brasil, Gênero e Número e Trovão Mídia (podcast). Vamos conversar? raissa.ebrahim@gmail.com