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Uma decisão da Justiça pernambucana pode dificultar o projeto da Escola de Sargentos na Área de Proteção Ambiental (APA) Aldeia-Beberibe, na Região Metropolitana do Recife (RMR). A 1ª Vara Cível da Comarca de São Lourenço da Mata determinou, na semana passada, com tutela de urgência, que o Governo do Estado e a Agência Estadual do Meio Ambiente (CPRH) não autorizem a construção de qualquer empreendimento público ou privado e/ou intervenção humana na área que compõe o Corredor Ecológico da APA. Ao Estado, cabe recurso.
O Corredor Ecológico da APA Aldeia-Beberibe — o primeiro do tipo em Pernambuco — foi criado em 2019 por meio da publicação de um decreto estadual (nº 47.556) do então governador, Paulo Câmara. Porém, o mapa mostrando a área do corredor, que deveria constar no anexo III, até hoje não foi publicado. Esse fato acarretou, segundo a decisão, “insegurança jurídica e fragilização das medidas de preservação do local”.
A novidade tem tudo a ver com a Escola de Sargentos pois a mata do Campo de Instrução Marechal Newton Cavalcanti (Cimnc), que pertence ao Exército e é por ele preservada há décadas, está inserida no corredor da APA. A Lei da Mata Atlântica (Lei Federal 11428/2006), por sua vez, veda o desmatamento em algumas áreas de corredores ecológicos. Confira mais abaixo o que diz a lei.
A juíza Marinês Marques Viana, de São Lourenço, atendeu a um pedido do Ministério Público de Pernambuco, fruto de uma Ação Civil Pública após representação do Fórum Socioambiental de Aldeia, organização da sociedade civil que compõe o Conselho Gestor da APA. O Fórum pressiona o Exército e os governos federal e estadual pelo desmatamento zero no projeto de construção do megaempreendimento das Forças Armadas.
Segundo definição publicada pela CPRH, “os corredores ecológicos são áreas que unem os fragmentos florestais ou Unidades de Conservação separados por interferências humanas, a exemplo de estradas e atividades agrícolas. São criados a partir de estudos sobre deslocamento de espécies e as localizações populacionais e visam, sobretudo, minimizar os impactos ambientais das atividades humanas, promovendo a ligação entre diferentes áreas, de forma a garantir o aumento da cobertura vegetal, a dispersão de sementes e o deslocamento de animais”.
Segundo a decisão da juíza, “o perigo de dano resta caracterizado pela demonstração do prejuízo que pode vir a ser causado ao meio ambiente e moradores da localidade com a construção de empreendimentos públicos ou privados e/ou intervenção humana que possa provocar danos à referida área de preservação ambiental”.
Com uma área de 31 mil hectares, a APA Aldeia-Beberibe abrange terras de oito municípios: Recife, Camaragibe, Paulista, Abreu e Lima, Igarassu, Araçoiaba, São Lourenço da Mata e Paudalho. A Unidade de Conservação tem um importante papel para a preservação da Mata Atlântica.
A área é tratada como uma espécie de santuário, apelidada de “Amazônia da Região Metropolitana do Recife”. É a maior faixa contínua de mata atlântica acima do rio São Francisco e também abriga mananciais que abastecem barragens da RMR, com destaque para a de Botafogo, historicamente problemática e que supre de água potável Olinda e o litoral norte de Pernambuco.
Na avaliação do Fórum Socioambiental de Aldeia, “negar a existência da delimitação do Corredor Ecológico APA Aldeia-Beberibe para justificar a autorização do desmatamento de fragmentos na área prevista por decreto para o corredor beira o absurdo, o nonsense”. O presidente da organização, Herbet Tejo, lembra que já se passaram mais cinco anos da publicação do decreto estadual e o equívoco não foi corrigido.
Segundo ele, já houve por parte da CPRH autorização de supressão de vegetação enquadrada como remanescente em estágio médio de regeneração na área do corredor com base no argumento de que, em função do erro da não inserção do Anexo III, não há como atestar que os fragmentos de Mata Atlântica constam do corredor, sustentando, dessa forma, a permissão do desmatamento.
A Marco Zero procurou a Secretaria de Meio Ambiente e Sustentabilidade de Pernambuco e o Comando Militar do Nordeste, mas não obteve retorno até o fechamento desta matéria. A reportagem segue aberta aos posicionamentos.
Art. 11. O corte e a supressão de vegetação primária ou nos estágios avançado e médio de regeneração do Bioma Mata Atlântica ficam vedados quando:
I – a vegetação:
a) abrigar espécies da flora e da fauna silvestres ameaçadas de extinção, em território nacional ou em âmbito estadual, assim declaradas pela União ou pelos Estados, e a intervenção ou o parcelamento puserem em risco a sobrevivência dessas espécies;
b) exercer a função de proteção de mananciais ou de prevenção e controle de erosão;
c) formar corredores entre remanescentes de vegetação primária ou secundária em estágio avançado de regeneração;
d) proteger o entorno das unidades de conservação
Vencedora do Prêmio Cristina Tavares com a cobertura do vazamento do petróleo, é jornalista profissional há 12 anos, com foco nos temas de economia, direitos humanos e questões socioambientais. Formada pela UFPE, foi trainee no Estadão, repórter no Jornal do Commercio e editora do PorAqui (startup de jornalismo hiperlocal do Porto Digital). Também foi fellowship da Thomson Reuters Foundation e bolsista do Instituto ClimaInfo. Já colaborou com Agência Pública, Le Monde Diplomatique Brasil, Gênero e Número e Trovão Mídia (podcast). Vamos conversar? raissa.ebrahim@gmail.com