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As desigualdades de gênero e de raça na educação brasileira estão expostas no novo boletim do Observatório da Branquitude, intitulado Desempenho escolar, raça e gênero: o que contam os dados do Saeb 2023. O estudo analisa as médias obtidas por estudantes do 9º ano nas provas de Língua Portuguesa e Matemática do Sistema de Avaliação da Educação Básica (Saeb) de 2023. Há disparidades significativas no desempenho escolar de alunos e alunas brancos e negros em todos os 26 estados brasileiros e no Distrito Federal.
A pesquisa cruzou as variáveis de raça/cor e gênero dos microdados disponibilizados publicamente pelo Ministério da Educação e pelo Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (INEP). O Saeb acontece a cada dois anos e serve como base para o monitoramento da qualidade da educação em escolas públicas e privadas, além de ser útil para a formulação de políticas públicas.
Os dados analisados no boletim revelam que meninas brancas são o grupo com o melhor desempenho no teste de Língua Portuguesa. As meninas negras obtiveram a segunda maior média na disciplina, exceto nos estados de Santa Catarina, Rio Grande do Sul, Espírito Santo, Mato Grosso do Sul e Rio de Janeiro, em que os meninos brancos obtiveram uma média maior do que as das meninas negras.
Ainda em Português, os meninos negros ficam com a pontuação mais baixa em relação aos demais grupos estudados em todas as regiões, acima apenas da média geral de cada estado. A exceção foi o Distrito Federal, onde meninos negros ficaram abaixo da média distrital.
Confira aqui todos os gráficos com os desempenhos por raça/cor e gênero por região
Já na Matemática, há uma mudança de gênero, mas não de raça/cor. Os meninos brancos assumem a dianteira com as melhores médias em quase todo o país – a única exceção é em Alagoas, onde meninos negros conseguiram a maior pontuação. No geral, meninos brancos se sobressaem aos meninos negros, às meninas brancas e às meninas negras, nesta sequência. Já o segundo melhor desempenho em Matemática é dos meninos negros, seguidos por meninas brancas e meninas negras. Somente em Roraima e Tocantins meninas brancas tiveram o segundo maior desempenho, seguidas de meninos negros e meninas negras.
O Observatório da Branquitude é uma iniciativa da sociedade civil criada em 2022 com o objetivo de produzir conhecimento e promover ações estratégicas com foco na branquitude e suas estruturas de poder. Com uma equipe composta integralmente por pessoas negras, a organização foi a primeira no Brasil a ter como tema central a análise da identidade racial branca e suas implicações na sociedade.
Pesquisadora do Observatório da Branquitude, Nayara Melo ressalta a importância de se considerar a interseccionalidade entre raça e gênero na análise dos resultados. “É importante observar que tanto o gênero quanto a raça configuram variáveis de peso na distribuição destas médias”, afirma. “Matemática, por exemplo, que se enquadra dentro das ciências duras, é uma disciplina que, historicamente, foi mais enfatizada para o sexo masculino. Percebemos pouco incentivo na inserção de mulheres dentro das ciências duras. Por outro lado, o português, por ter aspectos do que estaria mais associado a uma “sensibilidade”, é mais enfatizado para o sexo feminino”, acrescenta.
“Com esse estudo não estamos querendo avaliar a capacidade do estudante, mas observar que existem condicionantes externos e internos que podem atravessar a trajetória de aprendizagem dos estudantes. Observamos que estudantes negros terminam sendo mais afetados na sua trajetória educacional. É um processo e resultados que já são demonstrados em outras pesquisas, de outros níveis”, afirma Nayara.
Em matemática, meninos brancos tiveram as melhores médias no Nordeste, assim como no Brasil. Meninos negros ficaram na segunda posição em oito de seus nove estados. À exceção foi Alagoas, onde pela primeira e única vez nesta análise, meninos negros lideraram o ranking com uma pequena diferença para os brancos, de 251.5 sobre 250.2, respectivamente.
Em português, o Nordeste também segue o Brasil, com meninas brancas à frente, seguida de meninas negras, meninos brancos e meninos negros. Tanto em matemática como em língua portuguesa, Pernambuco segue a mesma ordem prevalente no Nordeste e no Brasil.
O boletim do Observatório da Branquitude não é o único a apontar desigualdades no ensino brasileiro. Análises do Saeb feitas por instituições como a Universidade Federal Rural de Pernambuco (UFRPE) e a Fundação Joaquim Nabuco (Fundaj) mostram que adistância no aprendizado entre negros e brancos se acentuou no período de 2007 a 2019. “Quando observamos que essas disparidades de notas são reiteradas em diferentes estudos em relação tanto ao gênero quanto à raça é porque temos grupos que precisam que o Estado esteja mais presente”, afirma Nayara. “Ao observar que temos grupos que são mais atingidos, que carecem de mais apoio institucional do que outros, é necessário que esses grupos também tenham acesso a políticas específicas para eles”.
A pesquisadora afirma que o Governo Federal está se movimentando para colocar em prática políticas públicas que diminuam essas desigualdades. Ela cita como bom exemplo a recriação pelo governo Lula da Secretaria de Educação Continuada, Alfabetização de Jovens e Adultos, Diversidade e Inclusão (Secadi), extinta no governo Bolsonaro.
Recentemente, o Ministério da Educação (MEC) lançou a Política Nacional de Equidade, Educação para as Relações Étnico-Raciais e Educação Escolar Quilombola (Pneerq), elogiada por especialistas, e que tem como objetivo implementar ações e programas educacionais voltados para a população quilombola.
Jornalista pela UFPE. Fez carreira no Diario de Pernambuco, onde foi de estagiária a editora do site, com passagem pelo caderno de cultura. Contribuiu para veículos como Correio Braziliense, O Globo e Revista Continente. Contato: carolsantos@marcozero.org