Ajude a MZ com um PIX de qualquer valor para a MZ: chave CNPJ 28.660.021/0001-52
“Eu não sei exatamente, porque isso sempre me acompanhou”, respondeu Júlio Gonçalves, o funcionário mais antigo da Companhia Editora de Pernambuco (Cepe) ao ser questionado quando começou a se interessar por arte. Aos 86 anos completados neste domingo, 27 de julho, o artista autodidata iniciou sua trajetória profissional como gráfico e, hoje, assumiu a missão de reduzir o impacto ambiental gerado pelos fragmentos de papel. Ele faz isso dando vida a obras de arte usando os resíduos gerado pelas máquinas encadernadoras da empresa gráfica do estado.
Ao longo de 50 anos de trabalho, foi responsável por desenvolver a capa de mais de 300 livros, a criação das páginas editoriais do Diário Oficial do Estado (DOE), do arquivo documental da empresa e do Calendário Cepe, entre outros projetos marcantes, mas quando assumiu a gerência do parque gráfico, Gonçalves enxergou o potencial para que os fragmentos tivessem um destino diferente. Em vez de ser jogado no lixo, ele percebeu que o material poderia render se fosse reaproveitado em um processo muito parecido com o papel machê.
“Eu já conhecia o processo do papel machê. Então, quando tomei contato com esses fragmentos de papel, percebi que tudo estava pronto aqui. Eu percebi que metade do caminho já estava feito. Era só hidratar um pouquinho aquele papel fragmentado e botar uma cola”, afirma Gonçalves. De fato, o fragmento de papel que já vem triturado, exigindo apenas que os artesãos hidratem e coloquem a cola para formar uma base. A partir daí, se abre um universo de possibilidades, desencadeado pela imaginação e criatividade do veterano.
Sua ideia deu início a um projeto de sustentabilidade e economia criativa chamado Galeria Reciclada. Criado em 2016, o projeto oferece uma reflexão sobre o descarte consciente de resíduos que impactam o meio ambiente e mostra como eles podem ser ressignificados. Além dos fragmentos de papel também são utilizadas embalagens plásticas e outros produtos nocivos à natureza.
Quem visita a Cepe para comprar livros ou por motivos profissionais, é impactado nos corredores por obras de arte ricas em detalhes, texturas, cores diversas. Há quem imagine se tratar de esculturas medievais feitas de ferro ou murais armoriais, por exemplo. Raros não se espantam quando são informados que é tudo feito com sobras de papel.
Seu Júlio explica que a inspiração está sempre presente, a todo momento, ela chega com força. Quando ele fala do assunto, parece estar se referindo a uma revelação espiritual que o leva a construir uma nova peça.
Seu Júlio explica que a inspiração está sempre presente, a todo momento, ela chega com força. Quando ele fala do assunto, parece estar se referindo a uma revelação espiritual que o leva a construir uma nova peça.
“A inspiração vem por vários caminhos. De repente, uma forma qualquer pode dar a partida e eu começo a desenhar, o primeiro desenho já inspira outros, até chegar o que eu quero. Pelo meu desejo, pelo meu estilo, ele sempre tem uma base geométrica muito forte”, afirma Júlio Gonçalves.
O projeto ganhou força e corpo com o passar dos anos e, em 2023, se tornou um setor dentro do organograma da Cepe. O ateliê da Galeria Reciclada fica ao lado do parque gráfico e conta com mais quatro funcionários que, no dia a dia, têm a tarefa de executar as obras concebidas por Júlio Gonçalves.
“A gente vê a transformação do papel em tantas coisas bacanas”, conta a historiadora Ana Guimarães que trabalhava no setor de digitalização da Cepe e foi transferida para a Galeria. Lá, ela se encantou com todas as possibilidades que o papel possibilita e se apaixonou pela nova função.
Jorge Felipe, passou pouco tempo como técnico gráfico. Logo foi convidado por seu Júlio para integrar a equipe. Júlio percebeu a delicadeza em que o rapaz trabalhava. Desde então, ele atua na maior parte do tempo montando os moldes das peças e na preparação das cores. “É muito importante estar aqui, porque nós trabalhamos e relaxamos, trabalhamos também nosso psicológico”, afirma.
A equipe também é integrada pela artista visual Ligia Régis e o técnico gráfico David Cardoso. Juntos, todos eles também ministram oficinas em eventos, projetos parceiros e órgãos públicos. Levando as diferentes possibilidades de criar e explorar todos os materiais à disposição da criatividade.
Jornalista formada pelo Centro Universitário Aeso Barros Melo – UNIAESO. Contato: jeniffer@marcozero.org.