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As eleições em uma cidade sertaneja com nome de mulher

Marco Zero Conteúdo / 02/11/2020

Espedita Quilombola tenta a reeleição: em 2016, ela foi uma das três mulheres eleitas na disputa municipal em Betânia, Sertão do Moxotó pernambucano. Crédito: Gessica Amorim

Géssica Amorim*

No próximo dia 15 de novembro, os eleitores e eleitoras do município de Betânia, no Sertão do Moxotó, poderão escolher entre os nomes e propostas de 14 candidatas: Aurela Clara (PT), Aurenice Medeiros (PSD), Eliane de Heron (Republicanos), Espedita Quilombola (PSD), Francisquinha (DEM), Gerlaine Santos (Republicanos), Grazi Silva (PSD), Jardênia Santos (DEM), Laryssa de Zé Pompilho (PSD), Lena Cazuza (DEM), Nega de Gonçalo (DEM), Núbia Aguiar (Republicanos), Rita Cabeleireira (DEM) e Silene de Artur Leite (Republicanos).

As 14 candidatas a uma vaga na Câmara Municipal de Betânia.

O número não é muito diferente de quatro anos atrás: nas eleições de 2016, 12 mulheres concorriam a vagas na Câmara — mas apenas três foram eleitas. O resultado deste ano vai nos dizer se, efetivamente, as tantas discussões sobre a assimetria entre mulheres e homens nos cargos políticos eletivos vai mais uma vez se traduzir numericamente.

Jardênia Santos, 34 anos, pedagoga, concorre pela primeira vez. Ela é filiada ao partido Democratas (DEM) e não tinha o desejo de entrar para a política, mas foi convidada a se candidatar este ano. “Entrei de última hora, mas não era minha pretensão. Fui convidada e aceitei, pensando no melhor para o meu município”.

Concorrendo pelo DEM pela primeira vez, Jardênia ainda não recebeu verba do partido

A candidata diz que ainda não tem projetos definidos para tentar colocar em prática caso seja eleita, mas acredita que é necessário que as mulheres conquistem cada vez mais espaço na política. “Acho que é importante a mulher estar inserida na política. Estar ali, para ajudar a criar mais projetos, mais leis e conquistar mais direitos também”.

No entanto, a poucos dias da eleição, ela ainda não teve acesso a nenhum valor do fundo partidário do DEM para usar na sua campanha. Conta que ainda está esperando por isso e que tem usado os seus próprios recursos. “Essa parte do fundo partidário é complicada. Estou aguardando e trabalhando com recursos próprios. É uma questão que está sendo bem difícil, estamos aguardando o repasse”.

O caso de Jardênia, que preenche a cota reservada às mulheres, mas, até o momento da publicação dessa matéria, não havia recebido verba do partido, pode nos servir de alerta para a necessidade de um acompanhamento efetivo da Justiça no tocante ao fundo eleitoral e a paridade de gênero nos partidos.

Até a última eleição de 2018, os partidos políticos que lançavam candidaturas em eleições proporcionais podiam se unir a outros partidos que tivessem os mesmos propósitos para terem mais chances de representação dos seus projetos nas câmaras. Eram as coligações proporcionais.

Isso mudou com a Emenda Constitucional nº 97/2017 que determinou a extinção das coligações desse tipo a partir das eleições municipais de 2020.

Quase toda população da cidade está apta a votar. Crédito: Igor Luigi/Divulgação

Agora, os candidatos mais votados de cada legenda são eleitos e as chances de participação feminina nas disputas e eleições aumentaram, já que, atualmente, cada partido precisa aderir à lei de cotas de gênero. Isso dá mais visibilidade a essas candidaturas, diminui o risco de “laranjas” e o desvio de fundos eleitorais que seriam destinados às candidaturas de mulheres para campanhas de homens candidatos das coligações. Atualmente, os partidos precisam apresentar um percentual de, no mínimo, 30% de candidatas.

Segundo estimativa do IBGE, Betânia tem população de 12.765 habitantes e, entre eles, 10.312 são eleitores e eleitoras. Karina Daylanne, 26, moradora do município, pretende votar numa mulher para lhe representar pelos próximos 4 anos e reconhece a importância de uma maior quantidade de candidatas no pleito. “Este ano, temos muitas mulheres candidatas e isso é bom. Acho importante que a gente tenha mais espaço, mais gente representando as mulheres. Gostaria que dessa vez entrassem mais do que as três que foram eleitas na eleição passada”, conta.

Ela é quilombola e vereadora

Candidata à reeleição, Espedita Quilombola espera que mais mulheres conscientes e empoderadas se elejam para enfrentar os desafios legislativos na Câmara Municipal de Betânia.

A vereadora Espedita Maria dos Santos Souza (PSD), conhecida como Espedita Quilombola, 48 anos, é professora e tem 4 filhos: Adilson Agenor de Souza, 31 anos, Adismerio Agenor de Souza, 25, Adriele Mayane de Souza, 28, e Ariel Milene de Souza, 23. Ela nasceu e se criou na comunidade Sítio da Baixa, uma das quatro comunidades quilombolas da zona rural do município de Betânia, Sertão do Moxotó — as outras três são Bredos, Teixeira e Sítio São Caetano.

Espedita está concorrendo pela segunda vez a uma vaga na Câmara do seu município. Em 2016, quando entrou pela primeira vez em uma disputa eleitoral, ainda filiada ao Partido Socialista Brasileiro (PSB), ela não acreditava que pudesse ser eleita. Seu nome foi escolhido pelas lideranças de cada comunidade quilombola de Betânia e 322 votos lhe garantiram uma vaga no legislativo.

Há quatro anos, Espedita Quilombola faz um trabalho cujo foco é voltado tanto para as comunidades que foi escolhida para representar, quanto para outras comunidades rurais do município e para a zona urbana de todo o território da cidade. Suas principais pautas são a agricultura familiar, a educação, a saúde e o resgate e valorização da cultura africana.

Sobre o trabalho na Câmara Municipal, Espedita Quilombola fala sobre as suas dificuldades, a necessidade de mais mulheres no legislativo e defende uma representatividade legítima. “Estar na Câmara é desafiador. Muitas vezes, a gente tem que trabalhar e defender uma pauta que muita gente não quer defender ou não tem coragem. Eu gostaria que entrassem mais mulheres. Mas fortalecidas, conscientes e empoderadas para enfrentar os nossos desafios antes e depois das campanhas. Muitas estão só pela questão das cotas de gênero, infelizmente”.

Este ano, com mais experiência, Espedita deseja seguir buscando atenção e aprovação para projetos ligados às suas pautas e ao que achar justo e necessário para o município que pretende continuar representando.

“Tem muita gente que ainda confunde as funções do legislativo e do executivo. A gente tem que fiscalizar, fazer indicações, apresentar projetos. Eu pretendo seguir na minha linha de trabalho, que tem sido aprovada, mas também quero seguir buscando o que acho que seja necessário tanto para as comunidades quilombolas, quanto para toda Betânia”.

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* Especial produzido pela equipe de reportagem do Observatório da Vida Agreste (OVA), parceiro da Marco Zero Conteúdo, conta histórias e propostas de candidaturas de mulheres no interior de Pernambuco.

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Marco Zero Conteúdo

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