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Por Beatriz Santana*

Entre partituras, discos, livros e gravações raras, um tesouro do frevo pernambucano luta para não ser esquecido. Tudo começou, ainda no final da década de 1960, no Núcleo de Rádio e TV da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE), quando o radialista Hugo Martins passou a usar uma sala no andar da Rádio Universitária, para manter o acervo de seu programa O Tema é Frevo.
O espaço foi batizado de Museu do Frevo Levino Ferreira, em homenagem ao mestre compositor de clássicos como Diabinho de Saia e Lágrima de Folião. Em entrevista exclusiva, o psicólogo e arqueólogo de formação, radialista e vice-presidente do Centro de Música Carnavalesca de Pernambuco (CEMCAPE), Carlos Dantas, reflete sobre o cenário atual do museu e o que ele revela sobre a forma como o frevo é valorizado hoje.
Segundo Carlos, o museu deixou de receber apoio institucional devido ao que chamou de “digestão” da UFPE. Diante disso, Hugo Martins e outros amantes do frevo criaram uma associação para preservar o acervo — o CEMCAPE. Desde 1986, o grupo ocupa um espaço na Casa da Cultura, no Centro do Recife, e se dedica à salvaguarda do material histórico do museu.
A nova fase, marcada pela desvinculação da UFPE, inspirou também o novo nome, que homenageia Levino Ferreira, maestro responsável por clássicos como Último Dia (1951) e A Cobra Fumando (1945). A escolha reforça o objetivo de resgatar nomes fundamentais para a história do frevo. Bueno Ferreira, filho de Levino e parceiro musical de Hugo Martins, teve papel importante nessa homenagem.
Desde então, o CEMCAPE busca conciliar preservação e inovação. “A gente pega as músicas dos compositores antigos e faz todo um trabalho e regrava frevo de rua, frevo canção e de bloco também. Porque tem muita, mas muita coisa que foi feita e nunca foi gravada. E muita coisa que já foi gravada e merece ser regravada”, explica Carlos. Assim, o passado se mantém vivo, não como memória estática, mas como campo fértil para novas criações e releituras que mantêm o frevo em transformação constante.
A provocação feita por Carlos evidencia que admiração, sozinha, não sustenta um patrimônio. “O restante do pessoal do CEMCAPE, não é que não tenham interesse. Eles não têm a noção da importância ou da necessidade de fazer outro tipo de salvaguarda, outro tipo de cuidado daquele material”, afirma.
Apesar dos esforços, a jornada pela preservação está longe de acabar. Centenas de discos, LPs, entrevistas com grandes nomes do frevo, partituras e livros permanecem empilhados em caixas e prateleiras, à espera de catalogação e de uma atenção mais cuidadosa. “Eu preciso de recursos para fazer tudo isso”
Em busca de alternativas, o CEMCAPE organiza um relatório com a participação de mais de 100 agremiações carnavalescas. O documento reúne queixas históricas — como falta de segurança, atraso nos pagamentos e ausência de espaços para desfiles — e será entregue às autoridades.
“São as mesmas queixas que existiam na década de 50, 60, 70. Não muda”, observa Carlos.
A iniciativa reflete o compromisso do comitê não apenas com a preservação do frevo, mas também com as condições de quem o mantém vivo. “Algumas autoridades são sensíveis. Já outras, são refratárias. Aí a gente fica: ‘Ó, não deu’. Mas não é por conta disso que a gente vai parar”, reforça.
Com recursos adequados e profissionais capacitados para catalogar e preservar o acervo, o CEMCAPE pode ampliar sua atuação e fortalecer a memória da música carnavalesca pernambucana. “A gente luta para manter essa tradição, mesmo que ela seja atualizada”, diz Carlos.
O vice-presidente também lamenta o desconhecimento do público sobre o museu. “As pessoas não vão e não sabem que existe. A juventude tem que saber que o CEMCAPE existe, tem que se envolver, fazer frevo e participar.”
Ainda que não haja data definida para mudanças estruturais, a visibilidade crescente já aponta um caminho. O museu pode ser visitado mediante agendamento pelo site do CEMCAPE, na aba “Museu do Frevo Levino Ferreira”. Também é possível entrar em contato pelo e-mail coralcemcape@gmail.com ou pelo Instagram @cemcape_oficial para combinar dia e horário da visita.
SERVIÇO
Museu do Frevo Levino Ferreira
📍 Casa da Cultura de Pernambuco – Recife
📧 coralcemcape@gmail.com
📱 Instagram: @cemcape_oficial
🌐 Site: www.cemcape.org.br (aba “Museu do Frevo Levino Ferreira)
* Beatriz Santana é estudante de Jornalismo da UFPE.
As reportagens publicadas aqui fazem parte da parceria entre a Marco Zero Conteúdo e o projeto de extensão “Cartografias do Frevo”, desenvolvido por professores e alunos do Departamento de Comunicação da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE). A iniciativa busca mapear a contemporaneidade do frevo a partir de entrevistas com mestres, músicos, passistas e artistas que reinventam o ritmo.
É um coletivo de jornalismo investigativo que aposta em matérias aprofundadas, independentes e de interesse público.