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Crédito: Reprodução Internet
Mesmo derrotados nas urnas, muitos ex-deputados estaduais continuam atuando na Assembleia Legislativa do Estado (Alepe). Isso acontece porque é comum que políticos sejam nomeados para cargos comissionados e passem a ocupar posições estratégicas na administração da Casa. Ao assumir uma atividade de gestão na Alepe ou em outro órgão do serviço público, o ex-parlamentar muitas vezes ganha autonomia para manejar contratos e orçamentos, distribuir cargos e expandir sua zona de influência. Em outras palavras, se manter dentro do jogo do poder.
Com base na Lei de Acesso à Informação (LAI), a reportagem da Marco Zero Conteúdo solicitou a relação dos ex-deputados estaduais nomeados para cargos no Governo do Estado de Pernambuco e na Assembleia Legislativa do Estado, entre 1º de janeiro de 2015 (início do governo Paulo Câmara e da legislatura anterior) a 1° de março de 2019. Os pedidos foram direcionados às ouvidorias do Governo do Estado e da Alepe no dia 6 de março.
A ouvidoria estadual não respondeu o pedido de informação, mas direcionou o registro à Alepe por entender que a questão seria da competência do Legislativo. Apesar da evasiva estadual, é fácil encontrar nomeações de ex-parlamentares da Alepe em cargos de gestão no governo. Apenas para citar exemplos, José Maurício Cavalcanti (PP), que cumpriu dois mandatos como o ex-deputado estadual, assumiu a secretaria executiva de relações institucionais do governo Paulo Câmara em fevereiro deste ano. Em maio, depois de 10 mandatos consecutivos como deputado estadual e uma derrota nas urnas, Henrique Queiroz (PR) foi nomeado para a gerência geral de articulação internacional no Governo do Estado.
O pedido de informação encaminhado pela reportagem à Assembleia Legislativa do Estado foi enviado no dia 6 de março, mas a resposta parcial só chegou de forma parcial mais de um mês depois, em 30 de abril, e após registro de recurso. Apenas os ex-deputados que ainda estão ativos em cargos comissionados na Alepe foram listados, caracterizando a resposta incompleta, pois, conforme dito acima, havíamos solicitado também os nomes daqueles que tinham ocupado cargos do início de 2015 ao final de 2018.
A lista enviada pela Alepe inclui: Júlio Freire Cavalcanti (PTB), Eduardo Porto de Barros (PSDB), José Humberto de Moura Cavalcanti Filho (PTB), Ricardo José de Oliveira Costa (PP), Sérgio José Leite de Melo (PSC) e Vinícius Labanca (PP).
Da lista, três nomes exercem cargos de superintendência. Neste patamar a remuneração é de R$ 15.210,93, mais auxílio-alimentação e auxílio-saúde. Mas o principal talvez seja o poder que a posição concede.
O ex-deputado estadual Ricardo Costa, exerceu dois mandatos. Ele é empresário de publicidade e assumiu a superintendência de Comunicação da Alepe. Costa é diretor da Stampa Mídia Exterior, que comercializa outdoors e espaços de anúncios em ônibus. A nomeação dele aconteceu em fevereiro deste ano. Sob sua batuta, pela primeira vez em 184 anos de existência, a Alepe estreou uma campanha massiva de divulgação institucional com anúncios na TV aberta, internet, rádios, veículos impressos e, óbvio, mídia exterior – com outdoors da Stampa. Em off, fontes da Assembleia Legislativa afirmaram que o custo total da campanha teria sido superior a R$ 5 milhões, ultrapassando o valor do orçamento previsto para publicidade.
Para este ano, as despesas na rubrica “Comunicação e Publicidade Institucional” da Assembleia (atividade 1021 no Portal da Transparência) atingiram quase que a totalidade do valor gasto no ano passado. Até maio deste ano tinham sido gastos R$ 1,18 milhões contra R$ 1,3 milhões em 2018, quando a Lei Orçamentária Anual previa uma dotação de R$ 2,2 milhões para essa atividade. Este ano está prevista uma dotação de R$ 2,5 milhões. Para ultrapassar esses valores, a Alepe teria lançado mão de rubricas para atividades semelhantes.
A Alepe não forneceu os valores gastos na campanha publicitária, limitando-se a negar o valor de R$ 5 milhões. A nota oficial enviada pode ser lida na íntegra mais abaixo.
Também sob a batuta de Costa, o fundador da TV Nova Nordeste, Pedro Paulo, foi nomeado chefe do Departamento de TV da Alepe. É uma nomeação curiosa, afinal a TV Nova Nordeste teve contrato com a Alepe para transmissões da TV Alepe até 2015. Desde então, a TV Alepe não tem produção própria. Este ano, o lançamento do edital de licitação da emissora deu início a um imbróglio que ainda não foi resolvido.
Poder e influência
Um ex-parlamentar que ocupa espaços nas máquinas públicas locais quer demarcar seu território político, explica o cientista político Alex Ribeiro. “Ocupar cargos estratégicos em Casas Legislativas, como na Alepe, é ter influência nas decisões centrais do partido e nas futuras alianças que até podem favorecer a retomada do seu protagonismo nas urnas, ocupando novamente uma das cadeiras no parlamento”, considera.
Nessas costuras políticas, o acesso a informações privilegiadas tem um peso incalculável. Por isso cargos como a superintendência parlamentar e a chefia do gabinete da presidência da Alepe são estratégicos, porque ambos estão ligados ao topo decisório da Casa. No primeiro posto está o ex-deputado Vinícius Labanca (PP), mesmo partido do atual presidente da Casa, Eriberto Medeiros (PP). É de responsabilidade da superintendência de Labanca, que vem de uma família que domina a política no município de São Lourenço da Mata, gerenciar as relações institucionais com poderes Executivo, Judiciário, Tribunal de Contas e Ministério Público.
Já Sérgio Leite (PSC), que já atuou como chefe de gabinete da presidência na gestão anterior da Alepe, com Guilherme Uchôa (PSC), foi mantido no posto pelo atual presidente. Antes, Leite já havia exercido quatro mandatos de deputado estadual.
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Assumir um cargo de influência também significa ter mais poder para nomear outros cargos, fechar apoios e coalizões. Pode valer a pena mesmo que o cargo não tenha tanta visibilidade. É o caso da Escola do Legislativo, que tem como superintendente o ex-deputado José Humberto de Moura Cavalcanti Filho (PTB).
Na superintendência da Inteligência Legislativa, por exemplo, está Eduardo Porto de Barros (PSDB), irmão do deputado estadual Álvaro Porto (PTB), ainda está com mandato ativo. A família, aliás, tem tradição na política pernambucana, sobretudo no município de Canhotinho, começando pelo pai de Álvaro e de Eduardo, Lourival Mendonça de Barros, que foi prefeito do município. Álvaro Porto, também é ex-prefeito de Canhotinho e atualmente o quarto-secretário da Mesa Diretora da Alepe, instância que comanda a atividade legislativa.
Eduardo Porto foi nomeado em janeiro de 2016. Abaixo da sua superintendência, estão as gerências de investigação; administração cartorial e a de segurança patrimonial. É interessante observar que Eduardo já foi delegado de polícia e é advogado sócio da Porto e Rodrigues Advocacia e Consultoria, que aparece na lista de fornecedores da Câmara Municipal de Abreu e Lima, mantendo contratos com, pelo menos, as prefeituras de Escada e de São João.
Apesar das vantagens evidentes, a ocupação de cargos gera uma dívida eleitoral futura. O ex-deputado que é premiado com uma vaga em órgãos públicos sabe que está vinculado a projetos futuros de seu padrinho político, seja ele da mesma legenda ou de partido aliado, analisa o cientista político Alex Ribeiro. E embora não exista impedimento legal para distribuição de cargos a ex-deputados, como observada na Alepe, a prática afeta a experiência governamental e se torna um ciclo vicioso. “Por mais que a sociedade repudie determinados atores da classe política, são quase sempre os mesmos que dominam as funções decisórias governativas na democracia brasileira”.
Resposta da Assembleia Legislativa de Pernambuco
As funções ocupadas pelos ex-deputados citados na reportagem são cargos de confiança e, portanto, prerrogativa do presidente da Assembleia Legislativa.
Com relação ao suposto conflito de interesse relacionado ao superintendente de comunicação, Ricardo Costa, o ex-deputado informa que não atua mais no ramo de comunicação, como empresário, há alguns anos, por se dedicar à vida pública com dois mandatos de deputado.
Porém, Ricardo Costa ressalta que detém experiência nas áreas de mídia, marketing e propaganda há mais de 50 anos, o que o credencia para ocupar a superintendência de comunicação da Alepe, atendendo convite do presidente da Casa.
Não procede a informação sobre os supostos valores de R$ 5 milhões atribuídos à propaganda institucional. A verba de publicidade da Alepe é muito menor em comparação com a dos demais poderes. Reportagem publicada em maio pelo próprio Marco Zero revela, por exemplo, que a Prefeitura do Recife gastou com publicidade, entre janeiro e março deste ano, R$ 10,7 milhões.Sobre o questionamento à existência de parentes de parlamentares em cargos de gestão da Assembleia, o primeiro-secretário Clodoaldo Magalhães esclarece que o ocupante da Superintendência Administrativa possui parentesco em 3º grau (primo), o que não se enquadra na Lei do Nepotismo, além de dispor de um currículo que atende às exigências do cargo.
Jornalista formada pela Universidade Católica de Pernambuco (Unicap) e pós-graduada pela Universidade Federal de Pernambuco (UFPE). Foi repórter de Economia do jornal Folha de Pernambuco e assinou matérias no The Intercept Brasil, na Agência Pública, em publicações da Editora Abril e em outros veículos. Contribuiu com o projeto de Fact-Checking "Truco nos Estados" durante as eleições de 2018. É pesquisadora Nordeste do Atlas da Notícia, uma iniciativa de mapeamento do jornalismo no Brasil. Tem curso de Jornalismo de Dados pela Associação Brasileira de Jornalismo Investigativo (Abraji) e de Mídias Digitais, na Kings (UK).