Apoie o jornalismo independente de Pernambuco

Ajude a MZ com um PIX de qualquer valor para a MZ: chave CNPJ 28.660.021/0001-52

Decisão sobre “zeppelin” será tomada em Brasília

Presidência do Iphan está avaliando projeto do restaurante e recurso de arquitetos e urbanistas

Arthur Maciel / 21/03/2024
Nesta imagem, vê-se um edifício moderno com janelas de vidro que refletem o céu e as nuvens. O nome “IPHAN INSTITUTO DO PATRIMÔNIO HISTÓRICO E ARTÍSTICO NACIONAL” está visível na frente do edifício. As grandes janelas de vidro capturam a luz do dia, criando um contraste interessante com o concreto do edifício. Além disso, algumas plantas e árvores são visíveis na parte inferior da imagem,

Crédito: Agência Brasil

O debate em torno da construção de um restaurante em forma de zeppelin sobre dois prédios do Recife Antigo chegou a Brasília e pode ter mais um capítulo nas próximas semanas. O presidente do Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan), Leandro Grass, está avaliando tanto a íntegra do projeto REC Cultural, incluindo a construção no teto dos edifícios, quanto o recurso apresentado por 21 organizações do Fórum de Entidades em Defesa do Patrimônio Cultural Brasileiro.

Mesmo após a empresa Ebrasil Energia, responsável pelo projeto, ter anunciado a suspensão do “zeppelin” e que “qualquer intervenção relativa à ocupação da cobertura ficará para depois e somente será realizada a partir de um processo de consulta pública”, o Fórum protocolou o recurso contra a decisão do superintendente do Instituto em Pernambuco, Jacques Ribemboim autorizando o projeto da forma como foi elaborado pela empresa.

Na argumentação do recurso assinado por Augusto Ferrer de Castro Melo, do Instituto de Arquitetos do Brasil (IAB/PE), e Natália Miranda Vieira de Araújo, do Programa de Pós-Graduação em Desenvolvimento Urbano da UFPE, os arquitetos e urbanistas questionam “não ser possível enquadrar uma obra arquitetônica dessa natureza como ‘instalação temporária’, também seria preciso considerar qual o reforço estrutural necessário para poder receber o peso desta estrutura”. Mais adiante acusam a empresa de tentar “burlar a legislação utilizando o insustentável argumento da ‘instalação artística provisória’.”

O documento do Fórum também levanta dúvidas sobre a segurança do projeto, que não teria incluído “laudo técnico que comprove que a demolição das alvenarias dobradas no imóvel não
trará dano estrutural ao mesmo”.

Os argumentos do superintendente

Mesmo diante da repercussão e do posicionamento contrários de entidades e até da Fundação do Patrimônio Histórico e Artístico de Pernambuco (Fundarpe), a autorização permanece sendo defendida pelo superintendente do Iphan em Pernambuco, Jacques Alberto Ribemboim.

“Primeiramente eu gostaria de esclarecer que a carta enviada ao proponente e que está incorporada ao processo do Pronac, de captação de recursos via Lei Rouanet, não significa uma posição técnica e sim manifesta conhecimento do projeto e concorda com a sua análise. Isso é uma praxe dos processos Pronac que incluem bens tombados pelo Iphan e não tem relação com os documentos do Sistema Eletrônico de Informações do instituto. Não há exigência nem necessidade de se incorporar esse tipo de documento ao sistema”, afirma Ribemboim.

Foto colorida de Jacques Ribemboim, homem branco de meia idade, cabelos curtos castanhos claros, usando óculos de aro retangular. ele está usando uma jaqueta cinza sobre uma camisa quadriculada azul e branca.

Jacques Ribemboim

Crédito: Divulgação

A questão foi levantada pela MZ, quando foi revelada a existência do documento, no qual o superintendente “declara que está ciente e de acordo com a apresentação do projeto em referência (…) para obter o benefício da Lei Federal de Incentivo à Cultura. No entendimento desta superintendência, o projeto deverá proporcionar impactos fortemente positivos no âmbito cultural e social”. O documento é datado de 22 de setembro de 2023, mais de 30 dias antes do parecer técnico 191/2023, emitido pela coordenação técnica do Iphan em 31 de outubro de 2023. Segundo Ribemboim, o documento não tem caráter de análise técnica do projeto, apenas expressa conhecimento de sua existência e sinaliza concordância com sua apreciação.

“O projeto é de um centro cultural que prevê a instalação de um museu de arte pernambucana, em dois edifícios históricos do Bairro do Recife que estão em elevado grau de degradação. Dentro desse projeto existe a instalação de um restaurante, lanchonete e loja, que dão uma característica de autossustentabilidade, uma forma de atenuar os elevados custos de manutenção de um equipamento que necessita de climatização adequada, controle de umidade, segurança, são muitos e elevados os custos de manutenção. Os técnicos entenderam que deveria haver uma negativa, principalmente pelo item que contempla a construção do restaurante em forma de zeppelin. Pela ótica deles haveria uma interferência paisagística considerada grave e eu entendo o posicionamento deles”, afirma.

E complementa dizendo que “a análise dos técnicos foi muito bem feita do ponto de vista arquitetônico, foi bem detalhada, eu sempre disso isso e incorporei exigências feitas por eles em meu parecer. Entretanto, analiso que diante dos benefícios gerados pela instalação do museu, pelo conteúdo cultural e informativo, pela integração com outros equipamentos existentes no lugar, pela necessidade de se criar ali um arranjo produtivo localizado, vocacionado para a cultura, o lazer e o turismo, a interferência paisagística gerada pela execução do projeto fica aquém de todo benefício que o museu trará para a cidade e o próprio Bairro do Recife. Estou absolutamente tranquilo quanto à minha decisão, que foi técnica e que tem embasamento em uma análise mais abrangente, além da órbita exclusiva da arquitetura”.

45 dias até a decisão

Segundo o texto do projeto apresentado pelo centro de Integração Social José Cantarelli, a instalação do REC Cultural prevê a exposição de um acervo que inclui obras de artistas como Cícero Dias, Abelardo da Hora, Francisco Brennand, Lula Cardoso Ayres, Reynaldo Fonseca, José Cláudio, Tereza Costa Rego e Maria Carmen. São bens adquiridos diretamente de familiares e que, apesar de retratarem boa parte da história cultural, política e social de Pernambuco ao longo do século XX, a maioria nunca foi exibida ou acessada pelo grande público local.

O recurso dirigido ao presidente do Iphan, Leandro Grass, deve ser apreciado e respondido num prazo de 45 dias contados a partir do recebimento.

Por enquanto, vigora a decisão do superintendente do Iphan em Pernambuco, que dá outorga para a implementação do REC Cultural da forma em que foi apresentado no recurso dirigido ao Instituto, com todos os equipamentos previstos e a construção do restaurante em forma de zepelim com caráter provisório, sendo possível a sua remoção, sem danos ao patrimônio, no prazo de 60 meses. É isso que está aprovado até o momento.

Caso a presidência do Iphan determine o veto ao projeto apresentado, um novo processo terá que ser iniciado, com a apresentação de um novo e diferente projeto, se for do interesse do proponente.