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Foto aérea colorida de uma estrada asfaltada que corta uma paisagem árida e erodida, com vegetação esparsa ao longo dos lados. A imagem destaca o contraste marcante entre a infraestrutura humana e o ambiente natural.

Crédito: Arnaldo Sete/MZ Conteúdo

Falta orçamento para conter a desertificação

Sem orçamento, Governo Federal prepara Plano Nacional, mas tribunais de contas confirmam omissão dos governos estaduais

Crédito: Arnaldo Sete/MZ Conteúdo

Até o final de 2022, Alexandre Pires era coordenador da Articulação do Semiárido (ASA), a rede de mais de três mil ONGs, associações e sindicatos que construíram mais de 1 milhão de cisternas em pequenas propriedades da agricultura familiar. Sua experiência na região levou a ministra Marina Silva a convidá-lo para dirigir o departamento de combate à desertificação do Ministério do Meio Ambiente (MMA).

No final de fevereiro ele concluiu uma das tarefas prioritárias de sua diretoria para o primeiro semestre de 2024: a redação do decreto que recriou a Comissão Nacional de Combate à Desertificação, que, até o início deste, só existia no papel, baseada em uma legislação de 2008, época em que as mudanças climáticas eram vistas como uma possibilidade no futuro.

Segundo Pires, a Comissão só funcionou até 2016, pois no ano anterior foi promulgada a lei que criou a política nacional de combate à desertificação. Após o impeachment da presidente Dilma Rousseff, os governos seguintes não adequaram a comissão à nova realidade.

“A comissão será paritária entre sociedade civil e governo, com representantes de ministérios, do Instituto Nacional do Semiárido, da Codesvasf, da Sudene [Superintendência do Desenvolvimento do Nordeste] e de organizações da sociedade civil que atuem nas regiões susceptíveis à desertificação”, explicou Pires. No final de fevereiro, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva assinou o decreto com a nova composição Comissão.

Foto de Alexandre Pires segurando um microfone e um papel com texto escrito, em frente a um grupo de pessoas sentadas. Ele é um homem branco, de barba bem cuidada e cabelos escuros curtos, usando óculos de aro preto. O ambiente parece ser uma sala de aula ou espaço de reunião com pôsteres nas paredes. As pessoas estão sentadas em cadeiras dispostas em filas, aparentemente ouvindo a fala de Pires. Há uma atmosfera de engajamento político ou educacional.

Alexandre Pires, do MMA, confirmou recriação da Comissão Nacional de Combate à Desertificação.

Crédito: Inês Campelo/MZ Conteúdo

De acordo com o decreto, a comissão continuará sendo presidida pelo Ministério do Meio Ambiente e Mudança do Clima e “terá a participação de outras 11 pastas do governo federal, além de instituições, agências, bancos de desenvolvimento e entidades civis dos estados com áreas susceptíveis à desertificação”. Ao todo, serão 42 membros, com respectivos suplentes.

Além da Comissão recriada, Alexandre Pires espera que até o dia 17 de junho, Dia Mundial do Combate à Seca e à Desertificação, o Ministério do Meio Ambiente apresente um novo Plano de Ação Nacional de Combate à Desertificação. “Estamos atrasados, admito, mas estou otimista. A última atualização desse plano ocorreu em 2004. Assim, será possível voltar a captar recursos no exterior”, acredita.

O maior desafio da diretoria conduzida por Pires não é, no entanto, de natureza jurídica ou burocrática. O problema é dinheiro.

Ele revela o exíguo orçamento sob sua responsabilidade: R$ 5 milhões (pouco mais de US$ 1 milhão) em 2023, valor que se repetirá para todo o ano de 2024. Para efeitos de comparação, cada deputado federal brasileiro tem direito a, sozinho, apresentar R$ 37,8 milhões (US$ 7,7 milhões) em emendas ao orçamento a ser executado pelo governo.

Sem orçamento, Pires busca alternativas. Ele contou que o Ministério do Meio Ambiente recebeu do governo Bolsonaro apenas R$ 7 milhões em dois fundos – o Fundo Nacional de Mudanças Climáticas e o Fundo Nacional de Meio Ambiente. Para otimizar os recursos, os técnicos do MMA lançaram um edital conjunto dos dois fundos. “Nós propusemos a criação de uma linha de atividades sobre desertificação, ou seja, para contemplar recursos para projetos focados na desertificação. Foram aprovados sete projetos, dos quais cinco são com essa temática”, explicou. As atividades desses projetos acontecerão no sertão do Pajeú, em Pernambuco, na região do São Francisco, na Bahia, e no Xingó, em Alagoas.

Tribunais de Contas confirmam omissão do poder público

Em fevereiro deste ano, os tribunais de contas (TCEs) de cinco estados nordestinos – Ceará, Paraíba, Pernambuco, Rio Grande do Norte e Sergipe – concluíram uma auditoria conjunta sobre as políticas de combate à desertificação desenvolvidas pelo poder público. A conclusão dos auditores coincide com a de ambientalistas e agricultores da região: a velocidade da degradação aumentou, mas as ações das prefeituras, governos estaduais e do Governo Federal são insuficientes.

Um dos resultados da auditoria foi a apresentação de uma série de recomendações aos gestores públicos de cada estado. Entre elas a inclusão do tema na agenda do Consórcio Nordeste e a implementação das políticas estaduais urgentes sobre o assunto.

O relatório aponta que, à exceção do estado do Ceará, nenhum outro governo estadual faz o monitoramento do avanço da desertificação em seus territórios. De acordo com o meteorologista Humberto Barbosa, do Laboratório de Análise e Processamento de Imagens de Satélites (Lapis), da Universidade Federal de Alagoas, isso acontece em razão da omissão da legislação brasileira.

A Constituição de 1988 protege a Amazônia, mas não ampliou essa proteção para outros biomas do país, como a caatinga, o pampa, a mata atlântica, ou o cerrado. A lei não exige que se faça esse monitoramento, a exemplo do Instituto de Pesquisas Espaciais (Inpe) realiza na floresta amazônica”, explicou Barbosa.

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Inácio França

Jornalista e escritor. É o diretor de Conteúdo da MZ.

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Giovanna Carneiro

Jornalista e mestranda no Programa de Pós-graduação em Comunicação da Universidade Federal de Pernambuco.