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Mesmo sem registro de ameaças, PM faz segurança permanente em Colégio Israelita no Recife

Giovanna Carneiro / 31/10/2023
Capô de viatura da PM parado em rua sem movimento, diante de escola de muros brancos e portões azuis/

Crédito: Arnaldo Sete / MZ Conteúdo

Há uma semana, no dia 24 de outubro, a reportagem da Marco Zero Conteúdo recebeu a informação de que uma viatura da Polícia Militar de Pernambuco fazia guarda em frente ao Colégio Israelita Moysés Chavarts, localizado no bairro da Torre, na zona oeste do Recife. Moradores do bairro notaram a vigilância constante da polícia e, desde então, ao passar pelo local, é possível, diariamente, encontrar a viatura de prontidão em frente à instituição de ensino particular.

Ainda de acordo com os moradores, a guarda da PMPE no colégio começou na segunda-feira, dia 9 de outubro, logo no primeiro dia útil após os ataques do Hamas, em 7 de outubro. Tentamos contato com a secretaria do Colégio Israelita, com a PMPE e com a Secretaria de Defesa Social para saber se houve registro de alguma ameaça à segurança da instituição que justifique a vigilância, mas até o fechamento desta matéria não obtivemos respostas.

De acordo com Rafael Baltar, professor de Direito Internacional Público na Universidade Católica de Pernambuco e membro do Grupo de Pesquisa Casa Comum – Filosofia e Teoria do Direito na Pós-Modernidade, não há nenhum registro de ataques contra israelenses ou semitas no Recife, fato que torna mais estranha a medida adotada pelas autoridades de segurança pública que continuam realizando a vigilância da instituição privada. Contudo, o professor afirma que, em momentos de conflito na Faixa de Gaza, é normal que a comunidade judaica se encontre em alerta e procure medidas protetivas: “essa insegurança possivelmente está relacionada com o receio e a sensação de vulnerabilidade da comunidade do Recife e é resultado do revide brutal de Israel, a própria população israelense sabe o tamanho da violência que está sendo praticada e todo mundo sabe que um ato de violência dessa proporção atiça o ódio, o ressentimento e a vontade de vingança”.

“Chama a atenção o tratamento especial dado pela PM para o Colégio Israelita porque vários outros perfis da população civil precisam e pedem proteção do estado diariamente e não conseguem ter acesso a essa mesma segurança com tanta facilidade”, concluiu Rafael Baltar.

Durante a nossa ida até o bairro da Torre, fomos alertados por mais de um morador a não utilizarmos o celular na rua devido ao risco de sermos assaltados, pois, de acordo com eles, roubos e arrombamentos de casas e estabelecimentos na área são frequentes.

Fomos até outros locais da capital pernambucana frequentado por pessoas dos povos ligados, direta ou indiretamente ao conflito em Gaza, o Centro Islâmico do Recife e a Sinagoga Israelita do Recife, ambos no bairro da Boa Vista, e em nenhum deles havia vigilância da Polícia Militar. Na tarde desta terça-feira, 31 de outubro, além da viatura PM, um carro da Polícia Civil de Pernambuco também estava parado na frente do Colégio Israelita Moysés Chvrats.

Antissemitismo causa violência e medo por todo o mundo

Com a guerra entre Israel e o Hamas, que teve início no dia 7 de outubro e já causou mais de 9 mil mortes de acordo com o canal de notícias Al Jazeera, o mundo inteiro está em alerta para possíveis ataques e atentados contra israelitas e palestinos imigrantes.

No dia 16 de outubro, um homem foi acusado de praticar um crime de ódio contra imigrantes palestinos nos Estados Unidos. Joseph Czuba, de 71 anos, esfaqueou uma mulher de 32 anos e uma criança de 6 anos na cidade de Plainfield, no Estado de Illinois e, de acordo com o Gabinete do Xerife do Condado de Will, a violência teve como mote o conflito na Faixa de Gaza. A criança não resistiu aos ferimentos e morreu.

O antissemitismo – preconceito e discriminação contra pessoas de origem semita, como árabes, judeus, assírios – é responsável por uma onda de violência que incide sobre a vida de milhares de israelenses-palestinos que vivem como imigrantes em diversos lugares do mundo, sobretudo nos EUA e na Europa.

Imigrante senegalês e muçulmano, Amadour Touré é diretor do Centro Islâmico do Recife. Crédito: Arnaldo Sete / MZ Conteúdo

“Essa retórica de que o terceiro mundo é terrorista só passa a ser especificamente direcionada aos povos árabes mulçumanos na virada do século 20 para o 21, após o ataque às Torres Gêmeas e a guerra dos EUA contra o Afeganistão. Foi a partir dai que se começou a estigmatizar os povos árabes mulçumanos como terroristas e, por isso, eles seguem sendo vítimas de discriminação em qualquer lugar do mundo”, explicou Rafael Baltar.

“Os riscos e as consequências dessa estigmatização acaba indo desde essas pessoas estarem sujeitas a tratamentos discriminatórios pela sociedade e por governos, com legislações que restringem acessos e direitos, até serem vítimas de violência e terem sua integridade física e vida postas em risco”, concluiu o professor.

Imigrante senegalês e mulçumano seguidor da religião islâmica – que surgiu na Península Arábica -, Amadour Touré vive no Recife há 22 anos e atualmente é membro da diretoria do Centro Islâmico do Recife, criado em 1997. De acordo com o muçulmano, Recife foi uma cidade que o acolheu e onde ele sempre se sentiu seguro. “As pessoas confundem muito as questões da guerra com a religião, confundem o terrorismo com o islamismo. Existem sim grupos radicais e extremistas que dizem representar o islã, mas vão de encontro com o significado daquilo que é o islamismo, que é a paz, nós pregamos a paz e não o terrorismo. As pessoas precisam estudar e conhecer a história da religião ao invés de se basear só pelo que veem nas mídias”, declarou Touré.

O diretor do Centro Islâmico afirmou ainda que não teme passar por nenhuma situação de violência no Recife devido ao atual conflito entre Israel e Hamas porque a sociedade civil se mostra solidária ao cessar fogo e ao fim da guerra.

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AUTOR
Foto Giovanna Carneiro
Giovanna Carneiro

Jornalista e mestranda no Programa de Pós-graduação em Comunicação da Universidade Federal de Pernambuco.